Um dos maiores nomes da história do futebol argentino é o de Hernán Crespo, o ponta de lança que passou os melhores dos seus 19 anos de carreira a marcar golos em Itália, ao serviço de várias equipas diferentes. Pela seleção argentina participou em três Campeonatos do Mundo, nos quais marcou quatro dos seus 35 tentos pela seleção das, que o colocam em quarto lugar atrás de Messi, Batistuta e Agüero (à data desta publicação, em 2020).
Crespo era, na soma de todas as suas capacidades, um dos avançados mais completos no mundo. Rápido e poderoso, mas com boa técnica. Era forte e agressivo sem bola, mas com ela aos pés era capaz de momentos mágicos, tal era a sua tendência para belos golos acrobáticos, fosse com a cabeça ou qualquer pé, era indiferente, desde que a bola entrasse. A qualidade enquanto jogador aliada à inteligência tática tornaram Crespo indispensável para qualquer treinador com que se cruzou, perdendo espaço apenas devido a algumas lesões que foram surgindo. Esta é a história de um avançado que, por todos estes motivos, foi considerado um dos melhores da sua geração.
Apesar do amor de infância pelo San Lorenzo, foi no River Plate que Hernán Crespo começou a brilhar, em 1993/94. Rapidamente ganhou a alcunha de Valdanito, devido às semelhanças com o antigo avançado compatriota Jorge Valdano, com quem partilhava não só o longo cabelo e outras parecenças físicas, mas também um estilo de jogo semelhante. No primeiro ano foram logo 13 golos pela equipa de Buenos Aires, pela qual conquistou a Liga Argentina Apertura, mas o verdadeiro sucesso chegaria mais tarde.
Se nesse momento já todos os clubes europeus sabiam o nome de Crespo, o interesse só seria maior no verão. O jovem argentino já se tinha estreado pela seleção principal da Argentina em 1995, aos 19 anos, mas foi no ano seguinte que representou o seu país nos Jogos Olímpicos de Atlanta. Ainda marcou o golo que colocou a Argentina na frente do marcador no dia da final no Sanford Stadium, mas a Nigéria deu a volta ao resultado e ficou com o ouro. Crespo, por outro lado, contentou-se com o prémio de melhor marcador da prova e uma medalha de prata.
Logo após o torneio, viajou para Itália, onde iria ficar durante muito tempo. Assinou pelo Parma a troco de pouco mais de quatro milhões de euros e começou a escrever a sua história logo na primeira época, sob o comando de Carlo Ancelotti. O início foi difícil, diga-se, durante a primeira metade da temporada Crespo marcou apenas um golo, o que levou à impaciência, e consequentes assobios, de alguns adeptos. Quem não perdeu a fé foi o treinador, que continuou a colocar o jovem argentino em campo semana após semana, até que, à 22ª jornada, frente ao Cagliari, Crespo quebrou o enguiço com dois golos, um deles um belíssimo remate em tesoura.
«Não acredito que fui aplaudido fora do campo», disse o argentino em relação ao apreço dos adeptos depois da sua substituição a dez minutos do fim. «O público assobiou-me porque eu não marcava e vaiaram o Ancelotti porque ele continuava a escolher-me. Foi difícil para nós os dois, mas acabamos por convencer toda a gente».
E de que maneira. Apesar do início tardio, o Valdanito ainda conseguiu marcar 12 golos em 27 jogos, bem como o segundo lugar da Serie A, apenas atrás da Juventus. Mas o maior sucesso gialloblu ainda estava por vir.
Foi na terceira época de Crespo em Parma que história seria feita. Na Serie A, ficariam pelo quarto lugar, mas as restantes competições caíram todas no bolso de uma das equipas mais extraordinárias da história do futebol italiano. Na época de 98/99, o Parma contava nas suas fileiras com nada mais nada menos do que Gianluigi Buffon, Fabio Cannavaro, Lilian Thuram, Juan Sebastián Verón e Enrico Chiesa, um verdadeiro plantel de sonho.
A carreira de Crespo na Europa viu-o a marcar golos por seis equipas diferentes, sendo que apenas uma delas não era italiana, tal foi o conforto que o argentino encontrou em terras transalpinas. A segunda equipa que contou com os serviços do avançado foi a Lazio, que não hesitou em desembolsar valores recorde em Itália para contar com Crespo, num negócio que viu Sérgio Conceição seguir na direção contrária.
Assim que chegou a Roma, Crespo ajudou a sua nova equipa e venceu mais uma Supercoppa Italiana, mas a passagem do goleador pela capital, apesar de ter sido numa equipa recheada de grandes nomes, seria marcada por mais sucessos individuais do que coletivos.
No seguimento da segunda temporada de Crespo no clube, a Lazio viu os seus problemas financeiros intensificarem-se cada vez mais, o que se traduziu numa necessidade de vender. Quem surgiu foi o Inter, que decidiu comprar Crespo por um valor a rondar os 36 milhões de euros, dando o pontapé de saída nos anos mais instáveis da carreira do avançado argentino.
Em Londres fez uma época de bom nível, mas o início da temporada de 2004/05 viu chegar José Mourinho, que, depois de ver os seus desejos de contar com Didier Drogba satisfeitos, não encontrou espaço para Crespo, decidindo-se por um empréstimo. Quem ganhou a corrida pela oportunidade de contar com o argentino foi Carlo Ancelotti, que nessa altura comandava o AC Milan.
«Ainda penso nesse jogo e é difícil encontrar uma resposta para o que aconteceu. O meu bis na final foi esquecido», recordou o argentino. «O Ancelotti permitiu-me ser um jogador em Parma, depois quis-me de novo e teríamos ganho a Liga dos Campeões juntos se não houvesse a reviravolta».
No verão de 2005, o Chelsea procurava um ponta de lança de qualidade para competir com Drogba, pela falta de outras opções, Mourinho acabou por querer contar com Crespo, que ainda teve bastantes minutos. Durante a nova época em Inglaterra, marcou 13 golos, mas o mais importante foi o facto de ter conseguido, pela primeira vez na Europa, conquistar um campeonato nacional. Para além de lhe ter valido o passaporte para o Mundial da Alemanha, onde foi habitual titular, no seu terceiro e mais frutífero Campeonato do Mundo no currículo.
Quando o Inter contratou Diego Milito ao Genoa, em 2009/10, Hernán Crespo seguiu o caminho inverso, citando como motivo para a troca a busca por tempo de jogo de maneira a conseguir a convocatória para o seu quarto Campeonato do Mundo consecutivo. Com a competição de Agüero, Tévez, Higuaín e o próprio Milito, o avançado veterano acabou por não ser chamado a África do Sul.
Logo em janeiro, encontrou a saída do Genoa para o sítio em que realmente queria estar: Parma. Pois, por mais sítios que tivesse passado em Itália, a casa de Crespo era mesmo no Tardini.
Na segunda passagem pelos gialloblu, Hernán Crespo não foi tão impressionante, mas não deixou de ter utilidade ao clube. Na segunda metade da temporada, marcou apenas um golo, acrescentado aos seis que marcara pelo Genoa, mas em 2010/11 fez sua a missão de garantir uma classificação do clube na metade superior da tabela.
«O meu objetivo é deixar o Parma no lado bom da mesa», disse Crespo, enquanto o clube temia a despromoção à Serie B, «foi nesse lado que os encontrei quando cheguei em 1996 e é aí que os quero deixar», garantiu.
«Estou triste, mas é algo que tinha de fazer pelos adeptos do Parma», disse Crespo no dia em que anunciou a sua reforma. «Vou embora calmo, sabendo que o clube está em águas tranquilas e sobreviverá sem mim, como provaram nos últimos seis meses. O Parma está de boa saúde.»
E assim deixou Itália, com a promessa de voltar um dia à cidade que o apaixonou. Crespo levou com ele o registo de maior goleador do clube que fez casa, bem como o legado de um dos melhores marcadores na história da Serie A, com 153 golos.