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    O meu mundo aos quadrados
    José Pedro Pais
    2020/01/09
    E1
    "O meu mundo aos quadrados” é uma coluna de opinião que pretende fugir ao império comunicacional dos três grandes, sob a perspetiva de um adepto do futebol pela positiva, profissional e transparente, que por acaso é boavisteiro.

    Terminou o ano e, como sempre, é altura de fazer uma reflexão sobre o ano (civil) axadrezado.

    O Boavista entrou em 2019 na 13ª posição do campeonato, após uma derrota em Moreira de Cónegos por 2x1. Começou por hospedar o Vitória de Setúbal (treinado na altura por Lito Vidigal), jogo que acabaria por vencer. Poucas jornadas depois, acabaria ainda assim por cair o chicote sobre Jorge Simão, provocando a sua substituição por Lito Vidigal. Este foi um episódio recorrente e que acabou por voltar a acontecer com Daniel Ramos no final do ano.

    O Boavista não tem sido capaz de manter a sua equipa técnica por mais que uma época/época e meia, e este é um tema que merece, na minha opinião, uma profunda reflexão.

    Na minha opinião, embora os motivos que tenham levado ao despedimento dos treinadores tenham sido diversos e circunstanciais, os mesmos só acabaram por acontecer fruto da ausência de um projeto desportivo profissional e sustentado, que tende a manter a equipa técnica no tempo, e a racionalizar – ou retirar o efeito impulsivo – a avaliação do trabalho desenvolvido, independentemente da natural pressão exercida pelos adeptos.

    Isto não é a defesa do treinador A, B ou C, até porque concordei várias vezes com o timing e o motivo dos despedimentos, mas sim a defesa acérrima de um modelo de gestão que não existe na gigantesca maioria dos clubes portugueses. Sobre isto, escreverei novamente mais tarde, de forma muito mais aprofundada e com recurso a exemplos.

    Regressando “à bola”, no global, e desportivamente, parece consensual que o Boavista teve um bom ano. Sob o comando de Lito Vidigal, o Boavista angariou pontos suficientes para catapultar o clube para um simpático 8º lugar, mas com uma performance (desde que assumiu o comando da equipa) equivalente a um 5º ou 6º posto. Assinalável.

    Quanto à época corrente, inicialmente correu bem quanto a pontos conquistados (ainda que as exibições deixassem muito a desejar), mas culminou no despedimento do treinador quando os resultados e as exibições convergiram. Deixou, ainda assim, o clube com um pecúlio de pontos suficiente para que o seu substituto possa realizar o seu trabalho sem ter que arrancar “sobre brasas”, à semelhança do que aconteceu com alguns treinadores no passado.

    Mas como o nosso universo não se resume ao futebol jogado e aos pontos conquistados, faço aqui um apanhado de alguns pontos positivos referentes ao ano de 2019, altura coincidente com o início de funções da nova direção do clube, à qual deverá ser atribuída parte significativa dos méritos.

    PONTOS POSITIVOS

    1. Estabilização e reforço da qualidade do plantel

    Este Verão existiu um claro esforço de manutenção/reforço da qualidade média do plantel, por posição e por sector. Ainda que o clube tenha sido “obrigado” a vender, houve a preocupação de garantir que a qualidade média do plantel subisse e, dessa forma, reforçar a base de trabalho da equipa técnica. Embora todos possamos gostar mais ou menos de alguns jogadores, a verdade é que o plantel atual é o plantel com mais qualidade desde o regresso à primeira divisão. O que também parece evidente é que existem vários jogadores que se encontram em sub-rendimento, e que caberá a Daniel Ramos dar-lhes a confiança necessária para aproximarem as suas exibições às suas reais capacidades. O único fator negativo relacionado com este tema tem a ver com tamanho do atual plantel, que é claramente excessivo, e que nem no caso de termos vindo a progredir nas taças justificaria. A corrigir já em janeiro.

    2. Perfil vendedor do clube

    A necessidade dos clubes portugueses venderem jogadores, à falta de capacidade de conceção de receitas, é uma evidência comum a todos, mas especialmente relevante naqueles casos em que o Boavista se insere, onde existe um legado financeiro pesado por regularizar, e que por via das meras receitas ordinárias, não se consegue vislumbrar a sua resolução.

    Ou seja, o Boavista precisa de vender como do pão para a boca, mas para que o possa fazer de forma sustentável, tem que assegurar a contratação  – com todas as limitações que o clube atravessa – de ativos potencialmente valorizáveis e com valor desportivo imediato, e conseguir resistir ao “assédio dos tostões”, cenário habitual em que os clubes compradores oferecem verbas significativamente abaixo do valor justo, apenas pelo conhecimento da debilidade económica e financeira do vendedor.

    Este ano o Boavista parece ter sido capaz de reverter esta política, através da venda de Gonçalo Cardoso e da resistência às propostas – previsivelmente insuficientes – sobre os jogadores mais valorizados. Vender sim, mas não a qualquer preço.

    3. Promoção de jogos e assistências

    Este é um grande ponto positivo de 2019. Através de uma política combinada de bilhética, protocolos e melhoria na promoção dos jogos, o Boavista conseguiu subir consideravelmente os números das suas assistências, provando que a massa adepta e simpatizante do Boavista na cidade é bem superior à que se encontrava mobilizada no passado. Embora não se consiga precisar em rigor a percentagem de crescimento da assistência no Bessa durante o ano passado, não tenho grandes dúvidas que será caso único no futebol português, fator que nos deverá encher de orgulho.

    O caminho terá sempre que ser este, o de aproximar o clube aos portuenses e promover o espetáculo do futebol.

    Uma ligeira nota: desconheço qual o critério utilizado para quantificação das assistências oficiais (talvez via número de bilhetes emitidos + protocolos), mas considero que o critério deve ser revisto porque existe um claro desfasamento entre o número de espectadores reais e a assistência, o que acaba por amortizar o impacto do meritório crescimento orgânico do clube.

    4. Melhoria do marketing do clube

    Desde o princípio do ano de 2019 assistimos a uma melhoria do marketing do clube, com principal destaque para a produção de conteúdos vídeo.

    5. Aproximação do clube à cidade

    O Boavista Futebol Clube é o clube mais antigo da cidade do Porto e a sua História está profundamente enraizada na Invicta. Assim sendo, não se justificava a manutenção do distanciamento que existia entre o clube e a cidade - desde o tempo do injustíssimo tratamento dado ao clube por parte da autarquia no Euro 2004 – pelo que, a reaproximação do clube à autarquia (Rui Moreira) e às instituições da cidade (via protocolos ou visitas) é de salutar e só poderá trazer no futuro benefícios para todos. O Boavista deverá trabalhar para ser “o clube da cidade” (posteriormente escreverei também sobre isto)

    6. Visibilidade das modalidades

    O Boavista trata-se do 2º clube mais eclético do país, apenas ultrapassado pelo Sporting, embora não exista essa perceção. Apesar de existirem vários clubes mais titulados em modalidades, o facto do Boavista manter – com tanto esforço – uma aposta plural em tantas modalidades e em tantos escalões é, por si só, um enorme motivo de orgulho para todos os Boavisteiros. O facto de ter sido dado mais ênfase aos resultados das modalidades durante o ano de 2019 é claramente um ponto positivo.

    7. Iniciativas simbólicas

    Durante o ano de 2019 assistimos também a um conjunto de iniciativas simbólicas importantes, uma vez que contribuíram para o reforço da comunidade e do espírito de pertença do mundo axadrezado, tais como as visitas sociais ou a Diáspora do Boavista (já realizadas no passado também), a corrida da Pantera e a Vila de Natal, entre outras.

    8. “BOAVISTA RESISTE”

    O melhor para o final: o ponto positivo do ano.

    No final do ano de 2018, início do ano de 2019, foi criado um movimento chamado de “Boavista Resiste”. Este movimento foi criado por alguns adeptos do Boavista, de forma absolutamente independente, e teve/tem como principal objetivo a promoção dos valores e da História do clube junto dos adeptos e dos portuenses, sob a forma de resistência. Este projeto representa na perfeição o melhor do clube: os adeptos.

    Eu defendo convictamente que os adeptos do Boavista se diferenciam dos restantes pela sua capacidade criativa e mobilizadora tendo em vista o encontro de soluções válidas para o clube, ou seja, os adeptos frequentemente, de forma orgânica, mobilizam-se para arranjarem soluções para os problemas que o clube atravessa. E isso não tem preço.

    Parabéns a todos os envolvidos pelo extraordinário trabalho.

    O Boavista resistirá sempre com adeptos destes.

    LISTA DE DESEJOS PARA 2020

    Para terminar esta crónica de transição de ano, e tendo a perfeita noção que “Roma e Pavia não se fizeram num dia”, não quero deixar de apontar alguns desejos meus para o ano de 2020:

    1. Estabilização económica e financeira definitiva do clube e da SAD (mais difícil) por via de um acordo com os principais credores.

    Bem sei que insisto bastante nesta tecla, e entendo que a maioria dos adeptos não se mobilizem por esta causa, mas não tenho qualquer dúvida que esta deverá ser a prioridade absoluta de qualquer direção do clube e SAD.

    2. Profissionalização da estrutura

    A profissionalização da gestão desportiva é o único caminho a seguir numa indústria altamente desenvolvida como é a do futebol. Os tempos mudaram e requerem outro tipo de competências. O Boavista, como a maioria dos outros clubes, deve procurar o melhor caminho para profissionalizar a sua estrutura global.

    3. Transparência económica e financeira

    A transparência económica e financeira num clube é imprescindível para o dever de informação dos associados, e não deve ser de todo menosprezada. A transparência, para além do fim do dever de informação dos associados, serve também para proteger a credibilidade da instituição perante potenciais ataques externos.

    Em abono da verdade, este está longe de ser um problema referente apenas a 2019, é já bastante antigo diga-se, mas desejo que em 2020 se comecem a dar passos firmes tendo em vista a sua reformulação.

    4. Filiais e relações internacionais

    Este talvez seja o desejo mais simples de conceder. Para 2020 gostaria de ver o meu clube a apostar seriamente nas relações internacionais, dando prioridade às filiais do clube, mas sem descorar a aposta em novas parcerias e protocolos.

    O Boavista deve esforçar-se por trabalhar a sua imagem também além-fronteiras.



    Comentários

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    motivo:
    IS
    Crescimento sustentado
    2020-01-09 14h07m por Isentoqb
    Duas palavras tão referidas no passado numa altura sem significado e que agora fazem mais sentido. Com esta nova direcção tem-se visto várias melhorias, mas muito mais há a fazer. A aproximação do clube à cidade e aos simpatizantes, chamando-os cada vez mais ao Bessa deverá ser uma das principais apostas. Não se entende como com centenas de atletas em várias modalidade amadoras não chamar os pais e encarregados de educação ao Bessa, com pouco poderia fazer-se muito.

    OPINIÕES DO MESMO AUTOR

    O mundo dá muitas voltas.    A forma das equipas varia significativamente ao longo da temporada, de mês para mês ou até mesmo de semana para semana....
    14-06-2020 15:17E6
    Lito Vidigal foi despedido do Boavista sem grandes surpresas após quatro derrotas nos últimos cinco jogos. No futebol, como na vida, o que hoje é verdade, amanhã ...
    17-12-2019 22:02E8
    Não vou fazer qualquer análise subjetiva ao jogo de ontem. Sobre isso já foram escritos centenas de artigos e estão a ser televisionadas centenas de horas de debates....
    07-12-2019 17:45E15
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