Passou por Alvalade e é adorado em Dortmund: Tinga, agora convertido em homem de negócios

Juntando o passado de Borussia Dortmund e Sporting, só três jogadores envergaram a camisola de ambos os clubes nas suas carreiras futebolísticas: Paulo Sousa (campeão europeu nos alemães), o menos conhecido Jovan Kirovski e, mais recentemente, o carismático Tinga.

Com o aproximar do duelo entre as equipas a contar para a Liga dos Campeões, o zerozero falou com o brasileiro para recordar a seu percurso nestes emblemas e a sua nova vida fora dos relvados.

O antigo médio começou por recordar a sua passagem por Alvalade - a sua primeira pela Europa - , a ligação que ainda mantém com o Borussia Dortmund e o impacto da cultura alemã no desenvolvimento da sua personalidade. Para além disso, há uma atualidade recheada de projetos e vontade de inspirar outros.

Tinga realizou 24 jogos com a camisola do Sporting ©Getty / Mike Egerton - EMPICS

«O Fernando Santos era duro nas palavras, mas uma pessoa bastante leal»

Zerozero: Após anos a ser referência no Brasil, o Sporting abriu-te as portas da Europa. Apesar da passagem curta, guardas boas memórias dos tempos que passaste no clube?

Tinga: «A minha passagem foi curta e de apenas um ano, dividida por duas temporadas. Cheguei quando o Fernando Santos era o treinador e já no decorrer da época, mas aprendi muito, pois também era a minha primeira experiência no futebol europeu. As diferenças táticas e de treino eram enormes comparadas ao que estava habituado. Com o José Peseiro comecei bastante bem e a jogar no 11, só que depois surgiu um desentendimento por um assunto relativamente normal e a confiança dos dois lados caiu. São coisas normais no futebol e sei que muitos adeptos do Sporting não entenderam na altura. Tenho pena de não ter sido campeão, algo que consegui em grande parte dos clubes por onde passei. Guardo no coração esta experiência que me ajudou muito, depois, quando fui para a Alemanha.»

Tinga 14 títulos oficiais

1	Recopa Sudamericana
	2011
2	Copa Libertadores
	2006, 2010
2	Campeonato Brasileiro
	2013, 2014
2	Copa do Brasil
	1997, 2001
1	2ª Divisão Japão
	1999
1	Campeonato Mineiro
	2014
5	Campeonato Gaúcho
	1999, 2001, 2005, 2011, 2012

ZZ: Falaste das aprendizagens com o Fernando Santos, um treinador marcante no futebol português pela conquista do Euro 2016. Nessa altura, ele já tinha aquela personalidade forte que é uma das suas imagens de marca?

Tinga: «Já era assim.. [risos]. Ele foi muito importante pois foi o meu primeiro contacto com um treinador europeu. Por vezes era duro nas palavras, mas sempre foi uma pessoa verdadeira e bastante leal. Muitas vezes é isso que faz a diferença num treinador, ainda para mais numa fase que o conhecimento tático já está tão espalhado. Sabemos que o Fernando passa uma imagem muitas vezes sisuda, mas tem um grande coração.»

ZZ: A última época foi especial para a Sporting, com a conquista do campeonato que fugia desde 2002. Acompanhaste a época do clube?

Tinga: «Acompanhei e fiquei bastante contente. Atualmente o futebol português está bem vivo aqui no Brasil depois da passagem do Jorge Jesus por cá. O fator Cristiano Ronaldo também aumenta os olhares e Portugal está muito no radar. O êxito dos treinadores no mundo todo, especialmente em Inglaterra, também é um sinal desta afirmação. Eu apanhei um pouco do início deste crescimento, por altura do Euro 2004 e da passagem do Felipão [Luiz Felipe Scolari], além das grandes campanhas do FC Porto com o José Mourinho no comando. Sinto que foi aí que Portugal percebeu a capacidade que tinha para lutar contra qualquer país.»

Legado no Borussia Dortmund e diferenças para um profissional no futebol alemão

ZZ: Em 2006, após a saída do Sporting e uma curta passagem pelo Internacional, rumas ao Borussia Dortmund onde viveste anos muito felizes na tua carreira. Como foi esta passagem pelo clube e por um país com uma cultura bastante diferente da que estavas habituado?

Tinga: «Após a experiência no Sporting estava mais preparado para aceitar um desafio como esse. Encontrei uma cultura de grande responsabilização do jogador, algo que infelizmente ainda não acontece no Brasil, onde muitos atletas são demasiado mimados e acham que podem fazer tudo. Na Alemanha és apenas um profissional e tens as cobranças iguais a outro ser humano. Foi um dos clubes onde tive uma passagem consecutiva maior, eu que sempre fui um jogador de muitas mudanças, logo no país onde em teoria seria mais difícil. Tenho uma gratidão enorme pelo clube e a cultura alemã ajudou-me muito na minha vida e em focar-me na minha evolução como cidadão.»

ZZ: Prova do impacto da tua passagem pelos alemães, atualmente ainda és várias vezes referenciado em publicações nas páginas oficiais do clube e também em grupos de adeptos. Qual é o sentimento de perceberes que continua a existir um grande carinho por ti na cidade de Dortmund?

Tinga: «Para tu veres, eu ainda tenho ligações com o Borussia Dortmund que não tenho, por exemplo, com clubes onde fui campeão no Brasil. Todos os anos recebo uma carta deles no meu aniversário e já fizemos vários eventos em conjunto. Em breve, no dia da criança [celebrado a 12 de outubro no Brasil] , vou fazer na zona onde eu nasci um evento onde vamos servir comida e bebida. No final vou dar duzentas camisolas oficiais do Borussia Dortmund aos miúdos. Não há muitos clubes com este tipo de comportamentos.»

ZZ: No Borussia Dortmund tiveste a oportunidade de jogar com um jovem Mats Hummels, que faz parte do atual plantel. Na altura ele já revelava capacidade para atingir o sucesso que conseguiu ao longo da sua carreira?

©Getty / Christof Koepsel

Tinga: «É curioso que, quando ele chegou ao Borussia Dortmund ainda muito novo, jogava como médio-defensivo. Passou depois para defesa-central e aí a sua capacidade de passe fez muita diferença. Ele sempre foi corajoso e com uma personalidade diferenciada, com grande foco em corrigir os seus erros. Era claro que ia ter uma excelente carreira e era apenas tempo até atingir um alto nível no futebol mundial.»

ZZ: Voltando a ti, terminaste a tua carreira futebolística em 2014, mas basta ver as tuas redes sociais para perceber que tens atualmente um dia-a-dia tão ou mais ativo que naquele tempo. A que projetos estás dedicado nesta fase da tua vida?

Tinga Borussia Dortmund Total

113 Jogos  9055 Minutos

12

23

0

0

2x

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«Eu divido o meu tempo entre muita coisa. Tenho uma agência de turismo, onde me conecto de volta com o futebol, pois cuido das viagens de mais de 150 atletas no mundo todo. Quando eles vão de férias, a minha empresa fica responsável por toda a organização. Trabalho com jogadores que atuam em Espanha, Itália, China, Portugal e de quase todos os clubes do Brasil. Também tenho uma marca de roupa chamada Território Sagrado e faço palestras pelo meu país, numa iniciativa chamada Gestão Além da Planilha, onde falo da minha mudança do futebol para o empreendedorismo. Além disso, ainda há uns investimentos turísticos na Serra Gaúcha e escrevo uma coluna semanal no portal UOL.»

ZZ: Sei também que tens um podcast de sucesso, chamado TINGAcast. O que partilhas com os teus seguidores neste formato?

Tinga: «As pessoas tinham curiosidade sobre o que estava a fazer. Após terminar a carreira de futebolista tive vários convites para abraçar cargos em clubes, mas não optei muito por esse caminho e decidi contar esta transformação que eu tive na minha vida.  Eu já vivo há algum tempo dos meus negócios e converso sobre isso no podcast. O maior medo de um futebolista é o seu final de carreira. Temos de ter capacidade de nos reinventarmos!»

©Arquivo Pessoal de Tinga