Em 1945 tentou saber-se quem seria o melhor jogador português de todos os tempos. Pouco mais de cinquenta anos depois do futebol ter chegado ao nosso país, os especialistas não tinham grandes dúvidas sobre quem seria o «craque dos craques».
Pinga podia ser genial, mas nenhum jogador lusitano tinha tido a regularidade e a classe de Artur José Pereira, AJP, como também era conhecido. O Mestre Artur, símbolo do futebol lisboeta, herói em Benfica, em Alvalade e em Belém, onde defendeu as cores do seu Belenenses.
Foi Cândido Oliveira, que respondendo a essa mesma pergunta, afirmou que no futebol nacional «houve dois jogadores de grande classe, verdadeiramente excepcionais, de raro talento para o jogo, com uma concepção pessoal brilhantíssima, com uma execução verdadeiramente notável, e com um lugar à parte entre todos os jogadores da sua época» (Sic).
Mas se Pinga era «verdadeiramente genial. Talvez o maior talento de jogador», pois «tudo nele era prodígio», para Cândido Oliveira o maior jogador português de todos os tempos só podia ser Artur José Pereira pois «possuía qualidades em que nenhum outro jogador o igualou, a maior de todas definida pela atitude artística. Era completíssimo, perfeitamente ambidextro e com potente remate com os dois pés; jogava primorosamente de cabeça; era um driblador estupendo e tudo isto valorizado por uma combatividade e uma coragem sem limites».
Mais importante de tudo, para Cândido, AJP «estava sempre bem, não tinha fracassos. Era de uma regularidade espantosa, assegurando sempre à equipa um contributo que podia definir-se antes do jogo (...)».
Belém no coração
Nascido e criado em Belém, com o Tejo a dois passos, Artur foi sempre um homem fiel às suas origens. Começou no União Belenense e depois mudou-se para o Sport Lisboa, que também nascera ali bem no centro da pacata Belém.
Quando o Sport Lisboa se fundiu com o
Benfica para dar lugar ao Sport Lisboa e
Benfica, AJP "avisou" os colegas que o Sport Lisboa iria acabar por desaparecer e deixar de ser um clube de Belém, para se tornar num emblema de
Benfica. O ano era 1908 e o Sport Lisboa vivia na ressaca da célebre debandada dos seus melhores jogadores para o
Sporting.
Com o clube a mudar-se para o Campo da Feiteira, Belém ficava para trás, mas todos os dias os jogadores treinavam e voltavam para Belém, onde a esmagadora maioria dos jogadores do clube viviam. Esses seriam os anos fundamentais para a sobrivência do
Benfica. Ao lado de Félix Bermudes e
Cosme Damião, AJP terá de ter um lugar no coração dos benfiquistas, pela qualidade que emprestou à principal equipa do clube, num período em que o
Benfica esteve muito perto de acabar.
Os anos iam passando e AJP tornava-se numa das referências do clube, mas uma polémica com os dirigentes levou a que José ##Alvalade tentasse a sua contratação. Contra todas as expectativas, acabou por trocar o vermelho pelo verde e deixou
Benfica para trás.
De leão ao peito
De
Rampante ao peito, Artur José Pereira que já ganhara quatro Campeonatos de Lisboa com o
Benfica, conduziu os leões ao seu primeiro título de Campeão de Lisboa.
Contudo, o sucesso não lhe escondia a mágoa de não poder jogar num clube da "sua" Belém. Quando liderou o
Sporting ao seu segundo título regional em 1919, tentou finalmente a sua sorte e falou com Jorge Vieira, um dos grandes símbolos leoninos, para este tentar junto de
Francisco Stromp, liberta-lo para ir fundar um novo clube em Belém.
O que o histórico capitão leonino respondeu ficou para os anais da história futebolística nacional: «Olha Jorge, diz a esse gajo que vá à merda e que funde o tal clube de Belém.»
O regresso a casa
A 23 de Setembro de 1919 nascia o Clube de Futebol «os
Belenenses», um sonho que Artur José Pereira partilhava com muitos belenenses que nunca se tinham conformado com a fuga do Sport Lisboa para
Benfica e o vazio desportivo a que o seu bairro se encontrava vetado.
De azul e Cruz de Cristo ao peito, AJP continuou a fazer história. Como jogador, mas também como treinador e dirigente, o Mestre Artur seria campeão de Lisboa por quatro vezes (1925/26, 1928/29, 1929/30 e 1931/32) e conquistaria o Campeonato de
Portugal em três ocasiões (1926/27, 1928/29 e 1932/33), tornando-se num dos treinadores mais bem sucedidos do clube.
Faria ainda parceria com Cândido de Oliveira no comando técnico da Seleção Nacional e como era costume nessa época, também pegava no apito mantendo uma carreira na arbitragem.
Faleceria vítima de tuberculose, a 6 de Setembro de 1943, contava então 53 anos de idade. O seu corpo jaz no mausoléu do
Belenenses, no Cemitério da Ajuda, lado a lado com dois símbolos imortais do clube do Restelo:
Matateu e
Pepe.