Está dado o pontapé de saída na Liga Portugal Bwin 2022/2023. Na 1.ª jornada do campeonato passaram pelas bancadas dos nove estádios que acolheram os jogos 138.923 adeptos. Os encontros caseiros de Benfica e FC Porto foram, naturalmente, impulsionadores máximos deste número, mas há um dado que me saltou à vista: dos nove jogos, seis tiveram uma taxa de ocupação superior a 50 por cento. Dos três que ficaram abaixo desse valor, Estoril e Santa Clara apresentam-se como casos “crónicos” de afluências baixas, sendo que no outro encontro, em Barcelos, entre Gil Vicente e Paços de Ferreira, estiveram quase 5 mil pessoas; um número agradável, apesar de não ter chegado à “meia casa”.
Posto isto, creio ser relevante e, sobretudo, proativo tentar conjeturar medidas e trabalhos que permitam à Liga portuguesa manter as taxas de ocupação dos estádios em valores interessantes, mesmo quando o verão e os emigrantes se despedirem e as tardes e noites se tornarem menos chamativas para uma experiência futebolística “in loco”. É, como disse, um exercício de conjetura e, em última instância, de brainstorming. Reconheço a limitação populacional e a divisão clubística tradicional de Portugal; reconheço também as fragilidades de várias estruturas de clubes para lidarem profissionalmente com este problema. Mas tentemos, pelo menos.
Listei alguns tópicos, de onde florescem vários subtópicos, que considero de relevância primordial tratar e discutir por forma a manter os que vieram este fim de semana e chamar os que podem não sentir essa tentação. É, por enquanto, uma análise superficial, entendendo eu que, para cada um dos casos, há complexidades e vicissitudes nem sempre fáceis de resolver ou, sequer, debater. Vamos a isso.
1. Condições dos estádios
É indispensável melhorar as condições de vários dos estádios que recebem jogos da 1.ª Liga. O mais premente, na minha opinião, prende-se com a cobertura. No verão, com temperaturas altas e o sol a escaldar, o conforto do adepto estaria bem mais valorizado se houvesse lugares à sombra e com algum resguardo. Com o frio e com a chuva, é ainda mais imperial garantir o máximo conforto possível com bancadas cobertas e resguardadas. Portanto, obras. Se queremos um produto mais apelativo e mais vendável não há desvio a esta condição. Com melhores estádios e mais gente nas bancadas até a televisão ficaria a ganhar.
Iniciativas para chamar o público perante estas condições atmosféricas: no verão, distribuição gratuita de água antes e durante os jogos, fora e dentro do estádio. É um gesto simples mas que pode melhorar a perceção da experiência, sobretudo junto dos mais novos e dos mais idosos. No inverno, oferta de mantas e bebidas quentes nos mesmos moldes. Poder-se-á, ainda, montar uma ou várias tendas no exterior do estádio para acolher os adeptos antes do jogo.
2. Atividades "Experiência do Adepto"
Já há quem o faça, mas é preciso mais. “Mini” concertos no pré-jogo, uma tour pelo museu do clube (quando os há), interação digital e vários passatempos ajudam a entreter o público e mostram, sobretudo, cuidado e respeito para com quem decidiu ir ao estádio. O futebol há muito que deixou de ser um jogo com 90 minutos e nada mais.
3. Preço "modesto" dos bilhetes
O tema dos temas para muitos cidadãos. Dinheiro. É lógico que o clube precisa de pagar as despesas inerentes à organização de um jogo e a bilheteira é um (de muitos) fatores que contribuem para isso. Mas Portugal não é um país onde a grande fatia da população está em condições de conciliar a ida ao futebol de 15 em dias com as restantes responsabilidades financeiras. Não é. Os preços dos ingressos têm, necessariamente, de serem praticamente “simbólicos”. É importante para quem é adepto do clube, mas ainda mais para quem é apenas simpatizante ou simplesmente adepto de futebol e tenha vontade de ir a um estádio.
Preços modestos permitiriam a mais do que um elemento do agregado familiar ir ao estádio sem comprometer o orçamento familiar (há gente com pouquíssimas posses que adorariam ir ao estádio. Mas 5€, por vezes, já é impeditivo).
Bilhetes a preços simbólicos levariam mais gente, mais gente levaria a maior consumo de bebidas, alimentos e de merchandising a favor do clube e mais gente levaria a um crescimento da marca junto de potenciais patrocinadores.
4. Horários "Family-Friendly"
Outro dos temas mais “quentes”. E é importante porquê? Coloco esta questão: Preferimos ter apenas o pai/mãe no estádio ou os dois juntamente com os filhos? Jogos com horário de início tardio (a partir das 20h) ao domingo e/ou à segunda-feira reduzem significativamente essa possibilidade.
Num país com poucas pessoas e, consequentemente, poucos adeptos, os visitantes importam (veja-se o caso do Boavista em Portimão e do Vitória SC em Chaves, nesta ronda). Quem viaja de fora para ver o seu clube é parte essencial para haver boas assistências em Portugal.
Posto isto, e sabendo das obrigações televisivas, fiz um esboço daquilo que podiam ser os horários dos jogos em Portugal, com sensibilidade para um fator relevante no nosso país: que o adepto do clube local e, simultaneamente, de um dos três “grandes” consiga ir ao estádio na sua terra e ver na televisão o outro jogo.
Sugestão de horários: 1 jogo na sexta-feira (20 ou 20h30), 4 jogos no sábado (14h, 16h, 18h e 20h) e 4 jogos no domingo (mesmos horários).
Estes horários evitariam a sobreposição de jogos, permitiriam, como já referido, a quem é adepto do clube local e de um dos "grandes" ir ao estádio e, a seguir, ver outro jogo na televisão, evitariam ainda jogos à segunda-feira e apenas três dos nove jogos teriam início às ou depois das 20h.
5. Descomplicação das leis e “tento na língua”
O caso do "cartão do adepto" criou confusão e afastou pessoas, voluntaria e involuntariamente. Não desconfio das boas intenções, mas é preciso sensibilidade e muito rigor quando se adotam medidas deste tipo, algo que não me pareceu haver nesta situação.
A linguagem em torno do futebol português tem de mudar drasticamente. É preciso dar mais "palco" a quem potencia o produto pela positiva e menos a quem fomenta um clima de guerrilha e controvérsia a cada semana. Apliquem-se as leis e as multas, sem hesitações nem contemplações, independentemente dos intervenientes.
Nota final: sublinho a premissa deste artigo, que passa por abrir a discussão e promover de forma ativa o florescimento de ideias e de medidas que possam resultar para o objetivo final: mais gente nos estádios portugueses. Aquilo que referi aqui é apenas o colocar na mesa de algumas sugestões que podem ou não ser exequíveis. Têm a palavra os clubes e a Liga.