*Com Miguel Freitas
A 28 de maio de 2017, o Besiktas sagrava-se bicampeão na Turquia, acabando com as esperanças do Basaksehir, segundo classificado. No plantel constavam nomes como Ricardo Quaresma, Anderson Talisca, Cenk Tosun e Ryan Babel. Mas a águia negra ficou sem asas e caiu para uma ravina na qual demorou anos a sair. Depois de uma situação menos favorável no país turco (que afetou todos os clubes sem exceção), o Besiktas está, agora, prestes a levantar o troféu (bastam quatro pontos), contrariando todas as previsões no início da temporada.
Para tentar perceber a caminhada do Besiktas, o zerozero falou com o jornalista Kadir Onur Dinçer, do jornal turco Milliyet. Mas antes é necessário entender como é que os turcos chegaram a uma posição debilitada.
As águias negras estão habituadas a ganhar. Apesar de não serem a equipa mais titulada em Istambul, dividem a maioria dos títulos de campeão com Galatasaray e Fenerbahçe. Mas se vencer é um hábito, passar por uma crise que obriga a prescindir dos melhores jogadores já não é.
Com internacionais como Pepe, Quaresma, Álvaro Negredo e Vágner Love, o clube viu-se obrigado a diminuir a folha salarial, e os resultados refletiram isso mesmo. Na época posterior da glória, acabaram em 4º lugar, através dos eternos rivais e do Basaksehir.
Além do defesa-central, também Senol Günes, técnico que conquistou dois títulos de campeão (2015/16 e 2016/2017), não aguentou a má sequência de jogos e decidiu rumar à seleção turca. E como não há duas sem três, Ricardo Quaresma também saiu, devido à maneira como Fikret Orman (presidente na altura) lidou com a crise.
Com o Besiktas emergido num grave problema, Ahmet Nur Çebi ganhou as eleições em 2019, com mais de metade dos votos. Depois de Fikret Orman ter saído do cargo por causa dos maus resultados e afirmar que era «preciso sangue novo no clube», o turco assumiu o gigante de Istambul com o objetivo de voltar ao trilho das conquistas.
E ter um novo capitão ao leme surtiu logo efeito pois, segundo Kadir Onur Dinçer «o novo presidente organizou uma noite de doações no início da época, onde os adeptos ajudaram monetariamente para resolver os problemas financeiros».
A situação internamente não era favorável (terceiro lugar em 2018/19 e 2019/20), e as competições europeias continuavam a estar muito aquém. Com apenas 1 vitória em seis jogos, acabaram no último lugar, com o pior ataque e defesa do grupo que também incluiu o SC Braga. Três treinadores tentaram reverter o mau momento, mas foi Sergen Yalçin a conseguir fazer omoletes sem ovos.
Para a maioria dos adeptos portugueses, o nome do técnico é desconhecido, mas para o Besiktas não: Sergen Yalçin é uma antiga glória do gigante turco e essa é umas das razões para o sucesso, tal como nos disse Kadir Onur Dinçer: «A paciência da estrutura é maior, devido aos laços emocionais que foram desenvolvendo no passado». Mas esta não é a primeira aventura de Yalçin.
Com experiências em diversas equipas da primeira divisão, o treinador entrou a meio de 2019/20 e teve impacto imediato: 10 vitórias em 15 jogos, conseguindo ascender a um lugar europeu (de sétimo para terceiro classificado).
Raio X [Jogador] | ||
na/o | ||
Vincent Aboubakar | Besiktas |
67 | Jogos |
35 | Golos Marcados |
40 | Vitórias |
18 | Empates |
9 | Derrotas |
Apesar de alguns problemas físicos que assombraram o camaronês, Aboubakar reencontrou o seu melhor futebol em Istambul. Com 15 golos em 26 encontros, o avançado parece ter deixado para trás as mazelas e deixa a impressão que podia ter saído pela porta grande da cidade Invicta. O jornalista do Millyet ficou surpreendido como os azuis e brancos «o decidiram largar assim tão facilmente para o Besiktas, sem qualquer compensação financeira».
Em Portugal, nas últimas épocas de azul e branco, teve muitas dificuldades em afirmar-se novamente, mas, na Turquia, o camaronês não teve nenhuma lesão grave, assim como «qualquer outro tipo de problema [psicológico]».
Além de Aboubakar, também Cyle Larin voltou às águias negras, depois de uma experiência no Zulte Waregem. Findado um ano de empréstimo, está a fazer a melhor época da carreira com 19 golos em 35 partidas. Destacou-se no último encontro contra o Hatayspor com um póquer e é o segundo melhor marcador da prova, atrás de Aaron Boupendza, ponta-de-lança que esteve emprestado ao Feirense em 2019/20.
A juntar à eficácia atacante, o conjunto turco conta com Rachid Ghezzal (melhor assistente da prova), Domagoj Vida e Georges N´Koudou, jogadores com rodagem nos principais campeonatos europeus, para contrastar com a juventude que consta em muitas das convocatórias.
Sem espaço nas respetivas equipas, foi em Istambul que puderam voltar a sorrir, como Valentin Rosier, jogador emprestado pelo Sporting CP. O francês não foi feliz em Alvalade, mas o Besiktas «quer contratá-lo em definitivo», explicou Kadir Onur Dinçer. «Ambos os jogadores [Rosier e Aboubakar], encontraram uma forma mais adequada de mostrar o seu futebol na Super League, ao invés da Liga NOS».
O trajeto até não começou da melhor maneira (afastado das provas europeias no início da época), mas Sergen Yalçin teve tempo para implementar as suas ideias: «Nem o PAOK nem o Rio Ave, conseguiam ganhar se jogassem outra vez», afirmou Kadir Onur Dinçer. E se calhar até tem razão...
Até à data, o Besiktas é a equipa com mais goleadas e vitórias na Liga Turca. A juntar a isso, está na final da Taça da Turquia contra o Antalyaspor. A exclusão prematura das competições europeias, ajudou a não ter sobrecarga de jogos e a concentrar-se no objetivo principal: o 14º troféu de campeão para o palmarés.
Além disso, o Basaksehir (primeiro classificado no campeonato passado) está a fazer uma temporada muito abaixo das expectativas e encontra-se na 14ª posição. Fenerbahçe e Galatasaray, por outro lado, nunca conseguiram impor-se e a prova disso é que os rivais não ganharam ao primeiro classificado durante a presente época.
Diz-se que a fibra de campeão se mostra nos «jogos grandes» e o jornalista turco aponta isso como uma das chaves para o sucesso: «O Besiktas mostrou muita qualidade nesses jogos [grandes] este ano. Essa foi uma das principais razões para estar numa posição favorável». Por outro lado, também se diz que se perdem os campeonatos nos jogos de menor dificuldade, mas as águias negras tiveram «estabilidade, especialmente na segunda parte da época, tornando-se numa peça fulcral para ter um desfecho positivo».
Todos estes ingredientes permitem formar um bolo perfeito: Besiktas (quase) campeão, de volta à Liga dos Campeões e com a estabilidade que tanto deseja.