Quem aqui vos escreve não é de apostas, mas abriria uma exceção para apostar que por muitos e muitos anos a frase do título surgirá em conversas nos cafés de Vila do Conde, do Forte até às Caxinas, da José Régio ao Parque, onde os ares do rio que dá nome ao clube se sentirem.
Uma noite de Europa nos Arcos já não é coisa assim tão rara, foram sete desde a estreia em 2014, mas nenhuma dessas sete equipas que viajaram até à foz do Ave chegava sequer aos pés do estatuto do clube que já foi de Maldini, de Baresi, de Van Basten e de tantas outras estrelas que vestiram a célebre camisola rossonera.
Esses nomes saudosos já vão longe, mas ter as visitas de Donnarumma, Leão, Çalhanoglu e outros que tais (Zlatan será o ilustre ausente) é mais do que razão para que o Rio Ave vista o seu melhor fato de gala. E porque não acreditar - pelo menos, acreditar - que na resposta à tal primeira pergunta venha um «e foi de vela para Milão»?
Foi na Turquia que o Rio Ave foi muito além da sua obrigação neste trajeto europeu, a culminar uma semana com uma odisseia por três países (Portugal pelo meio) que tinha começado com o triunfo em Banja Luka. A cabeça de Bruno Moreira e o último penálti de Matheus Reis (ele que é agora uma questão delicada...) permitiram chegar a um play-off que muitos diziam ser impossível quando o adversário derrubado em Istambul foi sorteado.
Seguiu-se o segundo de dois empates no campeonato (receção ao Vitória SC) para uma equipa com pernas tão cansadas como seria de imaginar neste frenético início de temporada. Quatro jogos de exigência máxima em dez dias criam inevitáveis problemas e, por exemplo, fazem com que Aderllan Santos e Carlos Mané sejam dúvidas por motivos físicos. Júnio Rocha e Ronan parecem descartados logo à partida, Gelson Dala ainda não jogou desde a luxação do ombro em Tondela. Pelé é reforço de peso e foi inscrito na UEFA para quinta-feira, mas não compete desde julho.
Na lateral-esquerda está um problema interno, já que Matheus Reis se terá recusado a jogar contra o Vitória SC (garantiu o presidente) no meio da especulação em torno do futuro e foi alvo de suspensão. Pedro Amaral é a solução natural e terá em vista a sua primeira participação de sempre em competições europeias no escalão sénior. Também com uma grande dúvida no centro (Aderllan), a defesa do Rio Ave pode ainda assim vangloriar-se de apenas dois golos sofridos em quatro jogos oficiais, mesmo com mudanças frequentes no setor.
Lá para a frente tem faltado algum poder de fogo, foram quatro golos nesses quatro jogos, mas com coesão e concentração do primeiro ao último apito - e boa execução do futebol de posse que é imagem de marca da equipa - até meio golo pode bastar para tornar realidade o sonho de repetir 2014 e chegar a uma fase de grupos da Liga Europa. Assim Kieszek e companhia consigam suster as inevitáveis investidas dos poderosos rossoneri.
Logo na defesa há baixas de vulto na comitiva de Stefano Pioli: não há Musacchio, Léo Duarte, Romagnoli e Conti, quatro de uma vez, prevendo-se nova aposta numa dupla de centrais que alia a experiência de um dinamarquês (Kjaer) à juventude de um italiano (Gabbia).
Do lado oposto do campo, falta o mais mediático de todos, Zlatan Ibrahimovic, que a Covid-19 teve a insolência de desafiar. Ante Rebic, simultaneamente lesionado e ainda a cumprir uma longa suspensão europeia, reduz também as opções para o ataque. O lugar ao centro deverá ser disputado entre dois homens: Lorenzo Colombo, com os seus tenros 18 anos, e o nosso Rafael Leão, ainda em busca do melhor ritmo depois de uma quarentena relacionada com o infame vírus.
Mesmo com tantas baixas, todo o favoritismo cai para o lado do Milan, vencedor em todos os quatro jogos oficiais que disputou nesta ainda curta temporada. Ainda assim, e é o próprio Pioli quem o diz, este será o dia do maior desafio para os rossoneri na caminhada até à fase de grupos da Liga Europa, que é uma obrigação para os italianos. Até agora ficaram para trás Shamrock Rovers e uns valentes noruegueses Bodo/Glimt, os homens de Mário Silva (que voltarão a ser de Augusto Gama) tentarão fazer melhor.
Diga o que disser o marcador no final, sopre o vento de Vila do Conde como soprar, será uma noite para recordar. E mais uma daquelas em que a falta de adeptos nas bancadas mais dói, porque não é todos os dias que se recebe uma equipa sete vezes campeã da Europa.
Matheus Reis (castigo interno)
Ante Rebic
Júnio Rocha e Ronan David
Musacchio, Léo Duarte, Romagnoli, Conti e Ibrahimovic
Será importante mais do que nunca, mas as indicações neste setor têm sido positivas neste início de temporada. Tondela e Besiktas marcaram uma vez cada um, Borac e Vitória SC não festejaram contra os vila-condenses. O grande teste está agora à vista, contra criativos como Çalhanoglu e matadores como Rafael Leão.
Foram já nove golos em quatro jogos oficiais, mais do dobro daqueles que o Rio Ave marcou. Mesmo sem Ibrahimovic e Rebic, a equipa de Pioli tem talento de sobra para causar problemas constantes à defesa rio-avista, com Çalhanoglu como cérebro ofensivo e outros como Brahim Díaz, Saelemaekers ou Castillejo nos desequilíbrios.
Rio Ave | Milan | |||
8 | 3 | Golos marcados | 5 | 7 |
7 | 1 | Golos sofridos | 2 | 8 |
2 | Jogos | 2 | ||
8 | 1 | Golos Marcados | 3 | 7 |