Largos dias têm (mais de) vinte anos… Vinte anos do feito que provocou o caos na cidade de Aveiro. Vinte anos da maior conquista de um histórico que continua a lamber as feridas de um coma profundo motivado pelas modernices do futebol. Já lá vão duas décadas da edição 1998/99 da famosa «Taça dos mais pequenos» onde a magia do desporto conseguiu centrar as atenções de um país inteiro e suscitar (ou alimentar) a chama das gentes aveirenses e alentejanas. Perpetuado na memória ficou aquele momento em que Ricardo Sousa, filho do sr. António, sacou um coelho da cartola e fez explodir de alegria os milhares vestidos de amarelo. Contra todas as probabilidades e mais algumas. 19 de junho de 1999, o dia em que nove fizeram de 11 com a descida de divisão sentenciada.
No próximo domingo, o Beira-Mar, comandado pelo herói do Jamor, defronta o Marítimo na 3ª pré-eliminatória da Taça de Portugal. O zerozero deslocou-se ao velhinho e já incompleto Mário Duarte e falou com alguns protagonistas. O maior deles, claro, é o mister. E não há forma de fugir ao passado.
«Um jogo da Taça de Portugal com o Beira-Mar tem sempre outro significado por aquilo que aconteceu no passado. Há 20 anos viveu-se a história mais bonita deste clube, é normal termos os nossos sonhos e um dia querermos voltar onde já fomos felizes ainda para mais com este emblema ao peito. Sabemos das dificuldades que temos, mas nós vivemos porque temos sonhos, queremos concretizá-los e trabalho diariamente para poder concretizar o sonho de um dia voltar ao Estádio Nacional com o Beira-Mar», reforçou o herói e agora treinador do emblema aveirense.
«Deus quer, o homem sonha e a obra nasce». Fernando Pessoa eternizou-o no papel com Infante, o Beira-Mar trabalha dentro e fora de campo para voltar a viver os tempos mais felizes da sua história.
Tranquilidade, foco máximo e descrição são três adjetivos que mais se adequam ao estado de espírito aurinegro. Porque a história a muitos pertence e nem a todos a atenção é a devida. Mas Ricardo Sousa prefere olhar para a outra face da moeda.
«Nós queremos que as atenções estejam viradas para o outro lado. Desde o início da época que a nossa maneira de falar é sempre a mesma. É uma época de reorganização. O Beira-Mar está a passar do amadorismo para o profissional, estão a ser cometidos muitos erros, mas os erros têm de ser cometidos nas alturas certas e este é o ano onde os erros podem ser cometidos. No próximo ano, sim, queremos afirmar-nos naquilo que vai ser a nossa ascensão. Independentemente disso, estão a ser dados os passos corretos e estamos a realizar uma bela época. Ainda não temos derrotas, vamos jogar contra o Marítimo e não nos vamos encolher mesmo que a superioridade e o favoritismo estejam sempre do lado deles. Vamos jogar o jogo pelo jogo. Tenho dito que esta equipa tem cinco, seis, sete jogadores que facilmente, com um bocadinho de sorte, conseguem chegar a uma primeira divisão», apontou.
Alguns deles, trintões, com passado pela elite do futebol português. Artur, filho da casa, hoje com 35 anos, é um desses exemplos. E há 20 anos atrás foi para a festa com os mais graúdos.
«O Beira-Mar tem história na competição. Conquistou a Taça de Portugal por uma ocasião e na altura até foi o Ricardo [Sousa] que fez o golo e agora é o treinador. Lembro-me perfeitamente desse dia, também fui à festa apesar de só fazer parte das camadas jovens...», começou por dizer.
O embate frente ao Marítimo ganha um gosto especial pela conquista, mas o percurso da formação aveirense está a ser extremamente positivo. Pampilhosense (6x0) e Bustelo (2x0) já fazem parte do passado e embora o novo rival seja Golias, David não se vai esconder. Pelo contrário, aliás.
«Não iria de acordo com a minha forma de ser e de estar ter esta qualidade na equipa e alterar o modelo de jogo e a maneira como jogamos desde o início do ano. Vamos ser uma equipa igual a nós próprios, uma equipa que vai gostar de ter bola, vai querer ter bola, vai jogar para o ataque e olhos nos olhos com o adversário. Esperamos no final do jogo sermos uma boa surpresa independentemente do resultado que puder surgir. A única certeza é que os nossos sócios e adeptos vão ficar orgulhosos daquilo que nós vamos fazer», atirou um Ricardo Sousa a transpirar confiança.
Do madeirense, o início de época não está a ser nada famoso. Longe do Marítimo com selo de Europa, o conjunto comandado por Nuno Manta Santos tem apresentado dificuldades para subir na tabela classificativa do campeonato e perdeu a oportunidade de seguir em frente na Taça da Liga. Agora há que agarrar o que estiver à mão.
Ora, e quando se tem um velho pesadelo dos maritimista no plantel, a surpresa está sempre mais perto de acontecer.
«Já pensei no jogo e claro que me recordo dos golo que já marquei ao Marítimo. Espero marcar outra vez e festejar, claro... », disse o sorridente avançado Cícero, de 33 anos, que descarta o rótulo de «presa favorita». Ele que procura viver uma espécie de segunda vida no futebol nacional.
«Tive alguns problemas físicos há dois anos e necessitei de recomeçar tudo. Surgiu esta oportunidade para voltar a jogar e o Beira-Mar deu-me a oportunidade de estar aqui, de me sentir feliz e de jogar outra vez. É bom para mim, para o clube e espero continuar a ajudar», afirmou.E se Cícero não estiver com a pontaria afinada há sempre uma estrelinha na bancada...
«Está sempre [referindo-se a António Sousa] na bancada. Desde que eu sou treinador, à exceção do ano em que estive no Algarve porque as deslocações eram demasiado longas, no Anadia, no Felgueiras, na Sanjoanense, no Beira-Mar... Acompanha-me para todo o lado. O bichinho vive dentro dele independentemente dele estar afastado do futebol há uns anos por opção própria, porque tem recebido vários convites, mas já não se identifica com algumas coisas no futebol. Quer estar na sua paz, no seu sossego, mas vai acompanhando sempre as equipas por onde eu passo. Nesta altura ele acaba por sofrer um bocadinho mais do que eu. É praticamente o mesmo aquilo que eu sofri no passado quando ele estava no banco e eu a ver os jogos... Agora sofre ele. Mas está comigo e com o clube porque o coração dele é 80 ou 90 por cento do Beira-Mar», finalizou o filho babado.
2-2 (5-4 g.p.) | ||
João Nogueira 15' Isaac Cissé 90' | Daizen Maeda 69' Zainadine Júnior 83' |