A final da Champions de 1990, que colocou a frente AC Milan e Benfica, aconteceu há 30 anos. A noite de 23 de maio marcou o fim de uma era para os encarnados, que nunca mais desde então chegaram ao jogo mais importante de todos a nível europeu. Isto depois de em três décadas terem chegado a sete...
Ao longo das próximas linhas tentaremos revisitar aquilo que o Benfica, o primeiro campeão europeu português, fez desde essa ocasião especial. Muitos anos sem chegar às grandes decisões que acabaram ser a consequência de uma gestão irregular e recheada de equívocos, com o decorrer do novo século a aparecer como um laivo de esperança para o futuro.
A década de 90, logo depois dessa final perdida para o Milan, foi absolutamente decisiva na história do Benfica. Mas pelos maus motivos. Antes da decadência, do caos, dos resultados humilhantes, os encarnados viveram anos relativamente positivos. Títulos nacionais, boa rivalidade com o FC Porto, que começava a tentar ganhar a dianteira do futebol português e campanhas europeias positivas. É certo que os problemas já eram conhecidos, complicados, ainda por cima, mas o clube mantinha-se são.
Na Europa, mais propriamente, a equipa encarnada acabou por deixar uma boa imagem na primeira metada da década. Em 1993, o talento de Paulo Sousa, Rui Costa e João Vieira Pinto não foi suficiente para superar a Juventus, na Taça UEFA; em 1994, depois do lendário 4x4 em Leverkusen, o Parma eliminou os portugueses na meia-final da Taça das Taças; em 1995, na Taça dos Campeões, o Milan voltou a transformar-se numa malapata. A partir daqui, tudo mudou...
Os encarnados ainda chegaram a uns quartos de uma Taça das Taças, dois anos depois, mas a falta de competitividade e os problemas internos começaram a aparecer de uma forma preocupante. Já tinham saído Paulo Sousa e Pacheco, em 1993, João Pinto manteve-se por pouco e essa decisão acabou por ser decisiva para adiar o inevitável, a queda abrupta do clube mais titulado em Portugal, mas nos anos seguintes a razia foi ainda maior. Em qualidade, ou não tivessem abandonado o Estádio da Luz nomes como Schwarz, Mozer, Rui Costa, Mostovoi, Neno, Vítor Paneia, Isaías, William, Paulo Bento, Dimas, e em quantidade. É que as saídas e as entradas começaram a ser às dezenas, com os erros de casting e os flops a serem uns atrás dos outros. Pouco restava daquele Benfica ainda muito forte do início da década.
João Pinto transformou-se num autêntico salvador, impedindo, em diversas ocasiões, que o fosso para o FC Porto ficasse ainda maior. O Benfica faz três terceiros lugares em quatro anos, naquele que foi o pior período do clube desde os anos 40, vai às competições europeias, mas falha redondamente e continuamente. Ainda assim, apesar de toda a instabilidade, de toda a falta de qualidade individual, do caos diretivo, poucos podiam projetar aquilo que viria a acontecer a 25 de novembro de 1999. Em Vigo, diante de um Celta forte, os encarnados viveram a pior noite da sua história, ao perder por 7x0 na terceira ronda da Taça UEFA. A águia batia no fundo.
Em Portugal, o cenário foi tão grave ou pior, uma vez que, uma época depois, o Benfica atingiu um impensável sexto lugar na tabela classificativa. Demasiado mau para quem só tinha sido quarto duas vezes na sua história, no final da década de 30. Pela primeira vez na era moderna, os encarnados falhavam as competições europeias. E o pior é que aconteceu o mesmo no ano seguinte. As águias fizeram um pouco melhor, acabaram em quarto, mas voltaram a falhar um acesso que era visto como natural. Tudo isto quando, uma década antes, o Benfica era a segunda equipa do continente com mais finais de Taça dos Campeões Europeus.
Com o bom desempenho sob o comando de Camacho, o Benfica não só conseguiu regressar ao pódio, como ficou mesmo com o segundo lugar, assegurando dessa forma a presença numa pré-eliminatória da Liga dos Campeões. A Lazio apresentou-se como um adversário demasiado forte, tal como o Anderlecht na época seguinte. Na verdade, só em 2005 é que o Benfica regressou à Champions propriamente dita, depois de sete anos de ausência. As vitórias épicas perante Manchester United e Liverpool foram um bom tónico para uma equipa que se tentava reerguer e que tombou apenas contra o futuro campeão Barcelona.
Infelizmente, para o clube encarnado, a presença nos quartos da Champions em 2006 acabou por ser a exceção à regra. Nos anos seguintes, o Benfica continuou instável a nível doméstico e pouco capaz fora de portas. Apenas os quartos de final da Taça UEFA, um ano depois, foram capazes de limpar uma certa má imagem que não desapareceu com a grande campanha de Koeman.
O momento da grande viragem, nacional e internacional, do Benfica deu-se no verão de 2009. Já aí o clube mostrava que estava disposto a investir muito e esse virar de página ficou ainda mais evidente no momento da contratação de Jorge Jesus. Para jogar o dobro era preciso gastar muitos milhões e ao Estádio da Luz chegaram nomes como Ramires, Saviola, Javi García para fazer companhia a David Luiz, Fábio Coentrão, Luisão, Pablo Aimar, Di María e Óscar Cardozo. Finalmente estavam reunidas as condições para os encarnados terem força na Europa.
Com Jesus o leme, o Benfica foi uma equipa pujante, entusiasmante, ofensiva, dinâmica. Um autêntico rolo compressor. Uma ideia que abalou o futebol português, um plantel que deu muitas alegrias no Estádio da Luz, mas que não conseguiu conquistar a Europa na primeira época. Ficaram na retina algumas exibições marcantes, como a dupla vitória frente ao Everton e o triunfo épico em Marselha, com Alan Kardec a vestir a pele de herói, mas o Liverpool de Gerrard e Torres foi demasiado forte. Claro sabor amargo no fim, pois aquele conjunto tinha condições para chegar mais longe, mas uma sensação positiva a pairar no ar: o Benfica voltava a ter condições de ser, pelo menos, competitivo de uma forma contínua no Velho Continente.
Contudo, no ano seguinte, um pequeno revés. Porque aquele Benfica estava cheio de esperanças em regressar à grande Liga dos Campeões. As saídas de Ramires e de Di María causaram muita mossa, a aposta em Roberto saiu completamente ao lado e, também por causa disso, a participação encarnada na Champions foi relativamente fraca. Apenas uma vitória marcante, por 4x3, diante do Lyon, na Luz, com Fábio Coentrão a encantar tudo e todos, e quatro derrotas, com destaque para a goleada sofrida aos pés do Hapoel, por 3x0. As águias acabaram em terceiro e seguiram para a Liga Europa, ficando às portas de uma final possivelmente apaixonante com o FC Porto. O culpado? O Sporting de Braga de Domingos Paciência.
Aparecem, então, de forma seguida, as duas temporadas europeias mais importantes da história recente do Benfica, pelo menos as duas mais importantes desde a final de 1990. Duas temporadas que têm semelhanças e diferenças importantes. Em 2012/2013, os encarnados venderam Javi García e Witsel na reta final de mercado e o desinvestimento acabou por ser fatal na Champions, com a equipa de Jesus a descer, outra vez, à Liga Europa. Um ano depois, mais contratações, um plantel melhor preparado, mas o mesmo resultado. E que duas despromoções à Liga Europa! É certo que as aspirações e as expetativas estavam apontadas para um patamar superior, mas, em dois anos seguidos, as águias chegaram a duas finais da segunda competição mais importante de clubes europeus. As derrotas contra Chelsea e Sevilha foram um castigo demasiado pesado para quem tanta competência demonstrou em ambos os percursos. Ainda assim, não havia dúvidas: um grande Benfica estava de volta!
Jorge Jesus, na sua última época ao serviço das águias, voltou a falhar na Champions e, nessa ocasião, nem conseguiu acabar em terceiro. Depois de um verão quente, chegava Rui Vitória ao Estádio da Luz, um treinador que não tinha qualquer expressão nos jogos internacionais. O início não foi nada fácil, mas, no que toca às provas europeias, o ribatejano fez tão bem ou melhor do que o seu antecessor tinha feito na estreia.
Porque o ano de 2015/2016 volta a ser bem positivo para os encarnados na Champions. Pela terceira vez no século XXI, o Benfica alcançou a antepenúltima fase da maior competição europeia, num culminar de uma primeira metade de década bem positiva, onde os bons resultados europeus foram mais regra do que exceção. Só o Bayern de Guardiola fez tombar aquele conjunto encarnado, que acabou de pé e de consciência plenamente tranquila. Tinha feito tudo ou quase tudo o que estava ao seu alcance.
A partir daí, o cenário mudou e algo aconteceu que não estava nos planos e que não parecia possível tendo em conta o crescimento do clube entre 2009 e 2015. Em 2017/2018, num grupo onde só o Manchester United parecia verdadeiramente assustar, o Benfica acabou com zero pontos. Assim mesmo, nem um empate para amostra. Seis jogos, seis derrotas, dois autogolos do jovem guardião Svilar e uma goleada por 5x0 diante do Basileia absolutamente humilhante como poucas foram em toda a história encarnada.
Na mudança para Bruno Lage, os encarnados voltaram à segunda divisão europeia, mas, ao contrário dos tempos de Jorge Jesus, mostraram pouca qualidade para quem tinha como objetivo chegar, outra vez, à reta final. E, por isso, parece que já passaram bem mais do que 30 anos desde aquela final de 1990.
1-0 | ||
Frank Rijkaard 68' |