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Suíça 1954

Suíça 1954

Texto por João Pedro Silveira
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Nada melhor que a neutral Suíça pra receber um mundo dividido

Um ano antes, em 1953 com o fim da Guerra da Coreia e a morte Josef Stalin e a ascensão ao poder de Nikita Khrushchev mundo parecia viver uma fase de desanuviamento, que as futuras crises do Suez e a revolta húngara iriam confirmar tratar-se de um optimismo prematuro.

Mas em 1954 já a sensação de tensão que caracterizou toda a Guerra Fria já se fazia sentir especialmente na Europa e Extremo Oriente. A neutral Suíça recebia a competição, onde competiram dezasseis equipas que foram dividas em quatro grupos.

As estreias e as ausências do costume

A fase de qualificação foi um desastre para Portugal, que viu a sua selecção ser esmagada em Viena por uma fortíssima selecção austríaca (1-9), de nada adiantando o 0-0 da segunda mão em Lisboa.

A Espanha por sua vez, foi eliminada pelos turcos pela decisão de “moeda ao ar” após o empate no jogo de desempate com os turcos.

Turquia, Escócia e a Coreia do Sul estreavam-se em fases finais, por outro lado entre as principais ausências contava-se a Argentina, a Suécia e a Espanha.

A Alemanha voltava a competição - agora na versão República Federal da Alemanha (R.F.A.), amputada que estava da parte Leste – República Democrática Alemã (R.D.A.), consequências da Guerra Fria que dividia o mundo em dois blocos respectivamente alinhados atrás dos E.U.A e da União Soviética.

Curiosamente a selecção alemã defrontou na fase de qualificação o seleccionado do Sarre - uma região alemã junto à fronteira com a França - que era e é uma parte integrante do território alemão, mas que na época encontrava-se sobre protectorado francês, fruto da partilha do território alemão no Pós Guerra.

A «Mágica Hungria»

À partida destacavam-se três candidatos naturais: o Uruguai, campeão mundial em título, que tinha vencido todos os mundiais em que tinha participado (1930 e 1950) e que pela primeira vez participava num mundial disputado na Europa; o Brasil que tentava recuperar do falhanço de 1950; e a “mágica” Hungria de Puskas, Kocsis e Czibor, que tinha sido campeã olímpica em 1952, e maravilhado o mundo em 1953 ao ser a primeira equipa não britânica a vencer em Wembley por 6-3, e que semanas antes do mundial tinha desta vez mais do que vencido, humilhado a todo-poderosa Inglaterra com um extraordinário resultado de 7-1.

E a bola começa a rolar...

No Grupo A, o Brasil e a Jugoslávia, que empataram (1-1) no jogo em que se defrontaram, qualificaram-se deixando pelo caminho tanto franceses como mexicanos.

Já no grupo B o público suíço assistiu maravilhado às duas esmagadoras vitórias da Hungria. Primeiro, um esclarecedor 9-0 sobre os sul-coreanos. Dias depois, eram as ambições da Mannschaft a cair por terra no dia 20 de Junho, em Berna. Quem viu não esquece e a Hungria humilhou os alemães por 8-3.

Apesar da derrota, a Alemanha levantou a cabeça e conseguiu vencer os turcos no jogo de desempate por 7-2 e qualificar-se também para os quartos de final.

No grupo dos campeões mundiais, o Uruguai venceu checos (2-0) e escoceses (7-0), garantindo juntamente com austríacos a qualificação para a ronda seguinte.

Por último o Grupo D onde a Inglaterra tentava lavar a imagem da humilhação do mundial de 50, a estreia foi contra a Bélgica, um jogo épico onde empatou (4-4). Na segunda partida venceu os anfitriões por 2-0 e venceu o grupo. Já a Itália desiludiu ao perder com os helvéticos por 1-4 e ao ficar pelo caminho.

Quartos-de-final: magiares embalam para o título

Nos quartos de final o Uruguai venceu a Inglaterra num jogo espectacular por 4-2. Outra partida que encantou os espectadores foi o Hungria vs Brasil onde a superior classe dos magiares deixou pelo caminho os vice campeões mundiais (4-2).

Os alemães por sua vez levaram de vencida os Jugoslavos. Enquanto a equipa da casa ficou pelo caminho, ao perder com a vizinha Áustria, no jogo (7-5) com mais golos de sempre de um mundial, um verdadeiro deleite para os amantes do futebol espectáculo.

Nas meias-finais um clássico entre alemães e austríacos que os germânicos levaram de vencida por 6-1. Mas os olhos do mundo viravam-se para o embate entre os campeões mundiais e a equipa que todos consideravam ser a melhor equipa do Mundo.

Num jogo emocionante a Hungria bateu a celeste olímpica por 4-2 e afastou o Uruguai do “tri”.

Abram alas para a .... RFA?!

Chegou finalmente o aguardado dia 4 de Julho. No Estádio Wankdorf em Berna, onde anos mais tarde o Benfica se sagraria pela primeira vez campeão europeu, era o local onde os olhos do mundo se centravam.

De um lado a Hungria, campeã olímpica em título, imbatível desde 1951, a única que podia gabar-se de ter vencido os ingleses em sua casa e que para cúmulo era a mesma equipa que catorze dias antes tinha humilhado o outro finalista.

Do outro lado estava a Alemanha do capitão Fritz Walter, que desde a humilhação sofrida às mãos dos magiares, tinha levantado a cabeça, lambido as feridas e vencido os adversários que lhe tinham aparecido pela frente.

A Hungria era claramente favorita mas a Alemanha apenas tinha sido ferida, não estava morta, e entrava em campo a olhar o adversário “olhos nos olhos”.

Mas parecia que aos 8’ já ninguém tinha dúvidas: graças aos golos “madrugadores” de Puskas (6’) e Czibor (8’a Hungria caminhava para o seu primeiro título mundial. Só faltava saber por quantos golos iria vencer…

Mas 2 minutos depois, numa jogada de ressalto Morlock reduziu. A Alemanha ainda esperneava…

Os húngaros não acusaram o toque e como uma fera lançaram-se sobre a sua vítima, e quando esta já começava a dar sinal de que a qualquer momento iria ceder, numa bela jogada (18’) os alemães logravam empatar a partida. Em menos de 10’ a Alemanha empatava o jogo e nem 20’ de jogo se haviam jogado. Até ao intervalo a Hungria não conseguiu mais dominar, e sucederam-se as oportunidades, numa e noutra baliza.

Rahn "mata" os cavaleiros do Apocalipse

O intervalo trouxe nova vida aos húngaros. Com um 4-2-4 bem estruturado no relvado, onde quatro setas apontavam directamente a baliza do guardião Turek. Os ataques magiares fizeram o barco alemão tremer, mas nunca, em momento algum afundar.

Os quatro cavaleiros do Apocalipse (Puskas, Czibor, Kocsis e Hidegkuti) foram incapazes de furar a “muralha” germânica e os húngaros acabaram por ser derrotados, pelo 3º golo alemão, apontado por Rahn aos 84’.

Quando o inglês William Ling apitou para o final os alemães envolveram-se em festejos no meio do relvado, enquanto os húngaros não acreditavam no que lhes tinha acontecido.

Apenas uma derrota em seis anos

Entre 1950 e 1956 a Hungria ganhou quarenta e seis jogos, empatou seis e perdeu apenas um… Esteve trinta e um jogos consecutivos sem perder, num recorde que seria superado pela Espanha que entre 2006 e 2009 disputou 35 jogos sem conhecer o amargo sabor da derrota.

A Hungria deixava a promessa que em 1958 voltaria a carga, mas a Revolução Húngara de 1956 e a imediata invasão soviética pôs termo a maravilhosa equipa da Hungria que viu as suas principais figuras procurarem refúgio no estrangeiro.

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