Ao meio-dia, Sérgio Conceição fazia a sua antevisão do encontro frente ao Moreirense. No fim da mesma, voltou atrás e retratou-se por causa do que tinha dito sobre Rui Vitória. Isto depois de pronunciar: «Até estou admirado, não me perguntaram nada sobre a polémica...».
À noite, Jorge Jesus fazia o rescaldo do jogo contra o Cova da Piedade. A certa altura, depois de ser questionado sobre o desentendimento entre Ristovski e Bas Dost, soltou um: «Perguntas da treta... Façam perguntas sobre futebol, mas é...».
No mesmo dia, duas observações que se contradizem. Afinal, querem perguntas sobre futebol ou perguntas sobre polémicas que estão instauradas? Uma das funções de um jornalista é a de procurar respostas às questões do público. E a pergunta é da responsabilidade do próprio. Se quem é questionado pretende responder ou não, isso já é outra questão. Mais concretamente, em relação a Jorge Jesus a questão colocada fez sentido. Se procurou polémica ou não, isso só a resposta do técnico pode elucidar. No caso, não houve qualquer polémica e a resposta de Jesus foi esclarecedora... tendo levantado outra.
Voltando a Sérgio Conceição, foi uma conferência de imprensa onde se falou de futebol. Várias perguntas sobre o jogo, as condicionantes do jogo, o desempenho recente contra o Moreirense, as comparações em relação ao jogo entre as duas equipas no início de época, o regresso de Herrera... Mas também o mercado de transferências, o calendário apertado, o plantel curto, ou a situação de Felipe, depois das expulsões. Falou-se de futebol. E há essa procura por parte dos jornalistas. Tal como há a procura de abordar temas atuais e polémicos, se for caso disso.
Tem-se falado, sobretudo depois de um programa televisivo na CMTV em que se levantaram suspeitas sobre eventuais pressões sobre os jornalistas, de que teria existido «medo» de se perguntar a Sérgio Conceição sobre o assunto. E, como participante nessa (e em muitas outras) conferência, asseguro que não tem qualquer fundamento. Mais: não acredito em dedos que tenham ficado pendurados no ar, neste caso (por vezes ficam, é verdade).
A questão que aqui se coloca é: o que seria pertinente perguntar a Sérgio Conceição? Depois da famosa comparação que o técnico do FC Porto fez em relação a Rui Vitória, de exclusiva autoria do mesmo, qual o passo seguinte do jornalismo? Ouvir o contraditório. Ou, no caso, a resposta do treinador do Benfica. E, como os treinos são fechados e os clubes se blindam pelos seus canais próprios, apenas esta sexta-feira será possível ouvir o que Rui Vitória terá a dizer sobre o assunto. Portanto, a lógica é aguardar por esse momento.
Então, o que faria sentido perguntar a Sérgio Conceição, que foi o último a falar? Perguntar se continuava a achar o mesmo? Perguntar se quer dar o dito por não dito? Perguntar se quer comentar a tal polémica (que ainda não teve o contraditório)? Qualquer uma dessas daria, mas qualquer uma dessas seria uma procura exclusiva por fraturar ainda mais o assunto.
Solução? A ideal seria Sérgio Conceição, pretendendo fazer o esclarecimento/retratamento, começar a conferência com isso mesmo, tal como fez na véspera do jogo contra o Mónaco, imediatamente a seguir à mediática flash interview na Sport TV após o jogo contra o Benfica, na qual teve uma postura com o jornalista a quem depois pediu desculpa. Não tendo começado assim desta vez, fê-lo no fim. E fez bem.
Tudo o que depois se vê, seja em comentários, redes sociais ou páginas que destilam ódio, mais não é do que uma triste consequência de uma sociedade mesquinha, que gosta de se dizer diferente mas que adora novelinhas. Uma sociedade mergulhada num mundo virtual em que todos são experts nos mais diversos temas, que conhecem há 10 minutos e que esquecem passados outros 10. Onde todos sabem mais de economia do que os economistas. Mais de segurança que os agentes. Mais de justiça que os juristas. Mais de arbitragens que os árbitros... Mais de jornalismo que os jornalistas.