Tripeiros e alfacinhas
A rivalidade entre lisboetas e portuenses é muito anterior a existência do beautiful game entre nós, antes de o futebol chegar a Portugal já existia uma rivalidade histórica entre as cidades de Lisboa e do Porto, entre as suas gentes e os seus modos de vida. Enquanto a luminosa Lisboa era a cidade onde vivia o Rei, a capital de um Império que se estendia por vários continentes, centro de governo e das cortes, residência de eleição da nobreza nacional, cidade das artes e cultura, aberta ao mar e outras gentes; por outro lado o Porto, com uma burguesia pujante muito ciosa da sua liberdade, era uma cidade onde coabitavam o progresso e a tradição, a cidade foi origem dos principais movimentos artísticos e políticos do país no século XIX, cabeça de revoluções, mas ao mesmo tempo uma cidade moralmente conservadora, por oposição à hedonista e mais libertina Lisboa.
Foi no seio dessa mesma burguesia ligada ao comércio do Vinho do Porto, arreigada aos valores da família e do trabalho, mas contudo aberta às influências que chegavam da industriosa Inglaterra, que foi fundado em 1893 o FC Porto.
Origens e crescimento
Em Lisboa, os encarnados viviam um pouco à sombra dos seus rivais verde-e-brancos e só em 1931 venceriam o Campeonato de Portugal, ao baterem por 3-0 os portistas, naquele que foi o primeiro jogo oficial entre os dois clubes. Para a história fica o dia 28 de Junho de 1931 e, o Campo do Arnado em Coimbra, o local onde se realizou o primeiro embate oficial entre águias e dragões do futebol nacional.
À sombra de leões
Mais uma vez, a vitória sorriu ao FC Porto quando se disputou a 1ª edição da Liga em 1934, e, apesar de portistas e benfiquistas conquistarem alguns títulos neste período, coube ao Sporting a primazia do futebol nacional até meados dos anos 50.
Depois de conquistarem a primeira edição do Campeonato da 1ª Divisão em 1938/39 e o bicampeonato na época seguinte, os azuis e brancos foram perdendo influência no futebol nacional, assistindo de longe à luta entre os "três" grandes de Lisboa. Sem vitórias no futebol, mas crónicos campeões de andebol de onze, os portistas eram jocosamente conhecidos em Lisboa por Andebol Clube do Porto...
Era benfiquista
Em 1950, o Benfica conquistou a Taça Latina e, onze anos depois, conquistou a Taça dos Campeões Europeus, meses depois chegava Eusébio a Lisboa para vestir a camisola encarnada e o Benfica iniciava o período de maior pujança da sua história, conquistando troféus dentro e fora de portas, superiorizando-se claramente a leões e dragões.
O FC Porto, que conquistara dois campeonatos (1955/56 e 1958/59), voltou a entrar num periodo de hibernação, enquanto o Benfica se tornava o clube mais conquistador de Portugal, ganhando duas Taças dos Campeões e jogando ainda mais três finais. Com Eusébio de Silva Ferreira, Coluna, Simões, José Augusto e companhia, o Benfica ultrapassou claramente o Sporting, assumindo-se como o maior clube português.
Revolução dos cravos e o renascimento portista
Sem tirar considerações políticas ou desportivas, olhando apenas os resultados, torna-se claro que, com o advento da liberdade, se inverte a história do futebol em Portugal, e em 45 anos de democracia o FC Porto conquista 23, contra 17 do Benfica e apenas cinco do Sporting (contabilidade atualizada em maio de 2020).
Com o declínio leonino, o Benfica x Porto tornou-se o grande clássico nacional, tendo ambos os clubes dividido entre si 22 das últimas 25 edições do Campeonato, o que é por demais ilustrativo.
Em quatro décadas, águias e dragões monopolizaram não só as glórias como as atenções do país e do mundo, provocando amores e ódios vários. Pinto da Costa centrou o discurso na retórica "norte vs Sul", enquanto na Luz, um pouco à sombra do recente passado, o Benfica demorou um pouco a reagir ao desafio portista.
Rivalidade até na Europa
Só na segunda década do século XXI, altura em que o Benfica conseguiu duas finais (perdidas) da Liga Europa, as forças se equilibraram novamente em termos de títulos, com os encarnados a reclamarem novamente a hegemonia nacional, embora sem que os portistas alguma vez se afastassem do grande rival em termos competitivos.