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    1. FC Union Berlin

    Texto por Ricardo Miguel Gonçalves
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    Há clubes que são, simplesmente, diferentes. Clubes que, pela força dos seus ideais e cultura, conseguem atrair adeptos com enorme facilidade. Quando chegar ao final deste texto, completamente convertido a simpatizante do Union Berlin, o leitor perceberá...

    Embora tenha nascido em 1966, a história do Union começa várias décadas antes. E embora tenha sido fundado na magnífica cidade de Berlim, nunca houve facilidades na hora de se impor entre os maiores, num país cujas grandes equipas existem bem longe da capital.

    Durante muito tempo a cidade foi representada no principal escalão pelo Hertha BSC, uma equipa com mais adeptos e recursos, mas agora tem a competição de uma força do lado oriental do antigo muro. Uma união que, mesmo sem títulos, instalações de última geração ou jogadores de classe mundial, tem muito a oferecer. Paixão, por exemplo.

    As primeiras versões 

    Bem antes do Union Berlin ser o nome de um clube fundado em 1966, já a alcunha die eisernen, usada até aos dias de hoje, existia. Essa expressão significa «os de ferro», e recua à primeira versão do clube, que nasceu em 1906 com o nome FC Olympia Oberschöneweide, que quatro anos mais tarde seria SC Union 06 Oberschöneweide..

    Durante o período que separou as duas guerras mundiais, o Iron Union emergiu como um dos melhores clubes da cidade e chegou até a competir a nível nacional, chegando à final da edição de 2022/23 do Deutsche Fußballmeisterschaft, competição que decidia o campeão alemão, onde perdeu por 3-0 com o Hambuerger SV.

    A equipa atuava com um equipamento completamente azul, para emular os trajes dos operários das fábricas, e assim ganhou o seu estatuto de clube do povo. Atuou dessa forma durante muitos anos, até ser travado pela II Guerra Mundial.

    Após 1945, as autoridades aliadas ordenaram a dissolução de todas as organizações na Alemanha, incluindo associações desportivas e de futebol. Nasceu, assim, uma nova versão, chamada SG Oberschöneweide.

    A equipa competiu e mostrou qualidade nas divisões de Berlim, mas foi impedida de viajar para as rondas nacionais devido ao escalar da Guerra Fria, o que levou a que vários jogadores e treinadores viajassem para o lado ocidental da cidade, onde fundaram o Sport-Club Union 06 Berlin. Essa versão cresceu e tornou-se forte, mas apenas até ao infame Muro de Berlim ter sido construído, em 1961.

    Na sombra do muro, e contra o sistema

    No ano de 1966, já com a Alemanha partida em duas, começou a versão do clube que dura até aos dias de hoje: o 1. FC Union Berlin.

    A Taça da RDA @Union Berlin
    Já com o famoso equipamento vermelho e branco, que constava também no novo escudo do clube, o Union Berlin atingiu rapidamente um dos maiores êxitos da sua história. Foi em 1968, quando superou a concorrência de todos os clubes do lado oriental e levantou a Taça da RDA (República Democrática Alemã), ao bater o Carl Zeiss Jena na final (2-1).

    Eram dias felizes no clube, mas não foram particularmente duradouros. O elemento perturbador foi não só um novo rival, mas a forma como este se agigantou de um dia para o outro.

    O BFC Dynamo era um pequeno clube de Berlim, constituído principalmente por polícias, mas a República Democrática Alemã estava a ficar para trás a nível desportivo e precisava de um bom clube na sua capital. Como tal, numa altura em que o Dynamo Dresden se destacava como a melhor equipa do lado oriental, conquistando todos os títulos entre 1971 e 1978, todo o plantel desse clube foi forçado a jogar no BFC Dynamo.

    Essa equipa, publicamente apoiada por oficiais do governo, cresceu numa liga em que tinha carta branca para manipulação. Por medo de represálias, árbitros facilitavam e adversários também. Os melhores jogadores em prova iam lá parar, com ou sem vontade.

    Numa altura em que o Dynamo somava 10 títulos consecutivos com máxima facilidade, o Union Berlin saltava entre Oberliga (Primeira) e o segundo escalão da RDA. Mas o Union tomava uma postura antissistema cada vez mais firme, atraindo semanalmente 20 mil adeptos que se identificavam com esses valores, e assim cresceu a rivalidade com o Dynamo, que se notou frequentemente em violentos confrontos com os adeptos dessa equipa.

    Union na Bundesliga @Getty /

    Grão a grão, divisão a divisão...

    79 dias depois da queda do Muro de Berlim, em janeiro de 1990, o Union e o Hertha jogaram a primeira edição daquele que é hoje o maior dérbi de Berlim. Foi um amigável, que teve 51 mil adeptos no Olympiastadion e terminou numa vitória dos da casa (2-1).

    Começava uma nova era na Alemanha, mas as coisas nem sempre aconteciam da forma que o Union procurava. Prova disso foram os anos de 1993 e 1994, em que terminou por duas vezes no primeiro lugar da sua divisão regional, mas os problemas financeiros impediram a equipa de saltar para a 2.Bundesliga, segundo escalão do futebol alemão. 

    Uma história semelhante repetiu-se em 1997, e em 1999 e 2000 a equipa esteve muito perto dos lugares de subida novamente. Foi só em 2000/01 que tiveram finalmente sucesso, numa temporada em que também chegaram à final da Taça da Alemanha. Perderam com o Schalke 04 (2-0) mas conseguiram um lugar na Taça UEFA e chegaram até à 2ª Ronda, onde caíram perante os búlgaros do Litex Lovech.

    A passagem pela 2.Bundesliga não se prolongou demasiado, com a despromoção de volta à Regionalliga Nord a chegar em 2004/05, e para o quarto escalão no ano a seguir, antes do regresso à terceira.

    Em 2008/09 o Union Berlin foi não só um dos clubes fundadores da nova 3.Liga, um terceiro escalão nacional na Alemanha, como foi também o seu campeão inaugural. Conquistou assim o regresso à 2.Bundesliga, mas havia objetivos maiores. 

    Mão de obra adepta, Bundesliga e por fim a Europa!

    É no Stadion An der Alten Försterei, um estádio no meio da floresta e que hoje tem capacidade para mais de 22 mil que a equipa do Union Berlin joga. Um estádio que permitiu à equipa crescer a passos largos, mas só depois de uma intervenção muito especial dos adeptos.

    Sofás na Alten Försterei @Union Berlin
    Ora, em 2008, o clube tinha intenções de modernizar um estádio que já existia desde 1920, mas não tinha os recursos para tal. Sem dinheiro, chegaram-se à frente os adeptos - mais de dois mil adeptos dedicaram um total de 140 mil horas de trabalho para transformar o recinto naquilo que ele é hoje, antes da reabertura em 2013. Um ano depois, uma iniciativa do clube permitiu aos adeptos levar os seus próprios sofás para o relvado, de forma a assistir ao Mundial de 2014 num ecrã gigante.

    Foi nessa nova versão da «velha casa do silvicultor» (sim, é isso que significa o nome do estádio) que viveu a mais espetacular transição da história do clube: a promoção, pela primeira vez na sua história, à Bundesliga.

    No final da temporada de 2018/19 a equipa da capital bateu o Stuttgart no play-off e foi promovida, tornando-se no primeiro clube de Berlim oriental a disputar a Bundesliga, bem como apenas o quinto da antiga RDA (Dynamo Dresden, Hansa Rostock, VfB Leipzig e Energie Cottbus foram os anteriores).

    Desde a subida, os de ferro têm se mostrado em grande nível. Um 3-1 frente ao histórico Borussia Dortmund foi a primeira vitória na Bundesliga e, não muito depois, jogaram um dérbi de Berlim, algo que já não ocorria no principal escalão desde 1977. Em novembro de 2019, ano em que se celebraram três décadas da queda do muro, o Union recebeu e venceu o Hertha por 1-0. História.

    Union na Bundesliga @Getty / borisstreubel
    E se as vitórias chegaram rápido, então o que dizer do futebol europeu... Nessa primeira temporada, wue foi interrompida pela pandemia, a equipa de Urs Fischer terminou no 11º posto, graças aos golos de Andersson e as assistências de Trimmel, mas no segundo ano o técnico suíço conseguiu um brilhante sétimo lugar, que significou qualificação para a primeira edição de sempre da UEFA Conference League.

    O conto de fadas já parecia não ter limites, mas mesmo assim o Union Berlin fez a proeza de voltar a surpreender. Em 2021/22 caiu da Conference League logo na fase de grupos, mas isso permitiu à equipa focar-se na Liga, onde garantiu um impressionante quinto posto. 

    A Liga dos Campeões ficou a apenas um ponto, mas estava garantida a subida de mais um degrau europeu, com a qualificação para a Liga Europa, onde o emblema germânico conseguiu ficar à frente dos portugueses SC Braga, qualificando-se para a fase a eliminar.

    Superou o histórico Ajax a duas mãos, mas caiu perante o Union St. Gilloise nos oitavos de final. Enquanto isso acontecia, a equipa continuava a brilhar a nível interno e acabou por fazer o impensável, voltando a melhorar os já impressionantes registos do ano anterior para terminar em quarto lugar na Bundesliga. Estava dado mais um passo na meteórica subida, uma vez que esse posto na tabela significou uma inédita qualificação para a Liga dos Campeões.

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