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    Dinamarca no Euro 1992

    Euro 92: As épicas férias da Dinamarca

    Texto por Luís Rocha Rodrigues
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    Está a ver aqueles filmes em que tudo parece imensamente desalinhado e altamente improvável de ter um final feliz? Pois bem, o que aconteceu à Dinamarca no Europeu de 1992 foi muito mais do que isso. É uma daquelas epopeias que surgem num incrível alinhamento de astros. E aconteceu!

    Falar do Europeu de 1992 é recuar a 1990 e ir à fase de qualificação. A Dinamarca, de Schmeichel e dos Laudrup, tinha estado no Europeu anterior, com o pleno desastre: três jogos, três derrotas. Para Itália, ao Mundial, nem se tinha conseguido apurar. E, por entre avanços e recuos, Richard Møller Nielsen passou de adjunto a selecionador principal. Um técnico pragmático, que rompia com o futebol bonito e rendilhado dos anos anteriores, daquela que foi chamada Dinamáquina, muito pela fase de grupos pujante no Mundial de 1986, que não teve sequência.

    @Getty / Ben Radford
    O objetivo passou a ser fazer desta uma Dinapragmática, o que não foi bem acolhido pelo grupo. Vitória, empate e derrota a abrir a qualificação e os irmãos Laudrup a renunciarem à seleção, o que foi visto como uma enorme afronta a um selecionador progressivamente mais só e sem qualquer carisma entre os adeptos.

    Seguiram-se cinco vitórias nos jogos que faltavam, incluindo em casa da própria Jugoslávia, mas insuficientes. Seria a seleção dos Balcãs a apurar-se, numa altura em que só o primeiro passava à fase final. A desilusão por não se marcar presença na vizinha Suécia tomou conta dos escandinavos. Só que... por decisão administrativa, já em cima da competição, pela guerra na ex-Jugoslávia, essa seleção ficou de fora e os dinamarqueses foram chamados à última da hora para ocupar a vaga (leia a história da repescagem aqui).

    Michael Laudrup abdicou da seleção @Getty / David Cannon
    Portugal, como era tradição, não se conseguiu apurar. O grupo de qualificação trouxe como tubarão a campeã em título Holanda e, mesmo com uma vitória nas Antas (1x0), o arranque tremido da equipa de Artur Jorge foi fatal. Carlos Queiroz entrou para a reta final do apuramento, em 1991, no sentido de aproveitar a boa fornada de jovens jogadores que tinham ganho os dois Mundiais de sub-20, mas seria preciso ter ganho na Holanda, onde Witschge fez a diferença (1x0). Uma vez mais, seria pela televisão...

    Uma prova à medida de tantos...

    Vários jogadores em plenas férias foram interrompidos pela convocatória e mais não se esperava, por todas as circunstâncias, uma Dinamarca a bater-se com valia... e a sair cedo de cena. O selecionador ainda conseguiu convencer um dos irmãos, Brian, a voltar para participar na prova, mas Michael Laudrup, acabado de se sagrar campeão espanhol e europeu no Barcelona, a fazer a melhor época da sua carreira, continuou irredutível: com Nielsen, não voltava à seleção.

    Alemanha era campeã do Mundo @Getty / David Cannon
    O torneio, ainda com apenas oito participantes, tinha uma Suécia, com Brolin, Thern e Andersson, repleta de entusiasmo por jogar em casa e pelos bons indicadores dados no Mundial dois anos antes, uma Alemanha que era campeã mundial, uma Holanda que era campeã da Europa, uma Inglaterra de Platt e Lineker e uma França pujante, com Cantona e Papin. Os candidatos estavam apresentados. Obviamente, a Dinamarca era o maior outsider.

    Não estavam a Espanha, a Checoslováquia e sobretudo a Itália, a grande ausente da competição, depois de ter sido suplantada pela União Soviétiva.

    Sempre no descrédito

    Num torneio tão curto e rápido, tudo se torna mais possível. Mas não é por isso que se deve pensar que a Dinamarca surpreendeu logo a abrir. Empatou a zero contra a Inglaterra, num jogo muito pobre, e perdeu 1x0 contra a Suécia, num grupo de empates, o que dava aos anfitriões todas as hipóteses de passar.

    Brian Laudrup voltou @Getty / Marcus Brandt
    Na última jornada, os suecos defrontavam a Inglaterra e ganhariam também esse desafio. A França só precisava de empatar contra uma Dinamarca desacreditada, mas eis que Elstrup se tornou no primeiro herói improvável, ao entrar para o lugar do cansado Brian Laudrup e marcando o golo da vitória por 2x1.

    De repente, a seleção em quem ninguém apostava estava nas meias-finais. Um feito notável e que teria o seu fim a seguir, já que do outro grupo passaram Holanda e Alemanha, que adivinhavam uma final entre si e que definiram o grupo na última jornada, com motivadora vitória holandesa por 3x1 - um jogo onde não fizeram qualquer poupança, sobretudo por saberem que o primeiro lugar dava um cruzamento muito benéfico nas meias-finais... na teoria.

    Hora do conto de fadas

    Se, fruto de uma postura desconfiada, pouco dada a brilhantismos e bastante focada no pragmatismo, a seleção dinamarquesa ali tinha chegado, porque não tentar algo mais? Obviamente que sim. De repente, era um grupo em êxtase e com a plena noção de que nada tinha a perder.

    Schmeichel foi a estrela @Getty / Stuart Franklin
    Primeiro, em Estocolmo, a Alemanha tinha a dureza de um dia a menos de descanso e o facto de defrontar um estádio quase todo amarelo, mas foi competente e não deu muitas hipóteses aos suecos. Riedle fez dois golos, já depois de Hassler ter inaugurado o marcador, e a equipa esteve sempre na frente de um jogo que ganharia por 2x3. Não havia o líder natural Lothar Matthäus (lesionou-se dois meses antes), mas parecia chegar com Illgner, Brehme e Klinsmann.

    Depois, em Gotemburgo, os holandeses carregavam todo o favoritismo, só que Henrik Larsen, mesmo com Bergkamp a marcar pelo meio, bisou na primeira parte e deu uma vantagem à qual a Dinamarca se agarrou com tudo. Henrik Andersen, patrão de uma defesa sempre desenhada com três homens, lesionou-se a meio da segunda parte e os últimos minutos foram de total invasão da Holanda, que somou oportunidades até Frank Rijkaard conseguir finalmente o empate. No prolongamento, o desgaste foi evidente de parte a parte e os penáltis chegaram, altura em que emergiu definitivamente aquele que já era o homem do jogo: Peter Schmeichel. Só defendeu um penálti, já que todos os outros foram convertidos. Mas foi «o» penálti! A Marco van Basten!

    @Getty / Shaun Botterill
    E a epopeia estava quase completa. Na final, com dificuldades para ter um onze em plenas condições, Richard Nielsen sabia que já só bastava o aspeto mental para levar aquela equipa a um feito digno de figurar nos livros das mais épicas histórias do futebol. E assim foi.

    Faxe Jensen colocou a Dinamarca na frente aos 19 minutos, houve depois um longo período de contenção e, perto do fim, Kim Vilfort completou o filme com o final feliz.

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