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    História da edição

    Champions 10/11: O segundo ato de Guardiola

    Texto por Jorge Ferreira Fernandes
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    O que pode ser tão bom ou melhor do que construir uma equipa vencedora, capaz de conquistar seis títulos num único ano civil (2009) e capaz de entrar no coração de muitos apaixonados pelo desporto rei? A resposta chegou em 2010/2011, sob o dedo de Pep Guardiola. Para o Barcelona, a melhor forma de respeitar tal legado era repetir alguns dos feitos e ser tão dominador, brilhante e arrasador. O desafio foi passado com distinção. 

    Sim, porque se, em 2009, diante do mesmo Manchester United, na cidade eterna Roma, o Barça tinha dado sequência a um percurso praticamente irrepreensível, em Londres, dois anos depois, os catalães foram mais longe. E o resultado de 3x1 pecou mesmo por escasso, pois, nesta final, atingiu-se um patamar muito alto, numa mistura perfeita de talento, entendimento coletivo, consistência e inspiração. Quem apoiava ficou com uma história para contar, quem não morria de amores não pôde deixar de admirar, até porque mesmo ao poderoso adversário faltaram os elogios e as palavras. 

    Uma época depois de terem protagonizado dois dos principais duelos da sua rivalidade, Pep Guardiola e José Mourinho voltariam a ver os seus caminhos cruzados nesta Liga dos Campeões, ainda que o português já estivesse a comandar o principal rival Real Madrid, que deu mostras, desde muito cedo, que estava pronto para atacar os grandes objetivos com uma outra força. Não houve preocupação por bater recordes de transferência, o ataque ao mercado foi cirúrgico e acertado - Ozil, Khedira, Di María e Ricardo Carvalho eram mais-valias evidentes - e o bom rendimento doméstico teve acompanhamento na fase de grupos, onde só o Milan, e numa única ocasião, conseguiu retirar pontos aos merengues. 

    Nessa mesma primeira fase, o SC Braga acabou por fazer companhia ao Benfica como única equipa portuguesa, depois de duas eliminatórias de acesso épicas, especialmente aquela que acabou em Sevilha, com a materialização de um trabalho de autor por parte de Domingos Paciência e de um plantel que entrou para a história do emblema arsenalista com um inesquecível 3x4 em pleno Ramón Sánchez Pizjuán. O Arsenal foi um desafio bem mais exigente e os Guerreiros do Minho não conseguiram impedir uma goleada de 6x0, antes de se despedirem em grande, na segunda volta, com um triunfo sobre um dos maiores clubes de Inglaterra, por 2x0. Era o ponto alto de um projeto curto, mas de muito sucesso, que acabaria uns meses mais tarde na final da Liga Europa, em Dublin

    Também para a segunda prova mais importante de clubes europeus caiu o campeão nacional Benfica, que nem sequer se pode queixar da dificuldade do grupo em ano de regresso à Champions. A verdade é que, até dezembro, esta equipa de Jorge Jesus viveu períodos de muita instabilidade e a campanha na Liga Milionária foi apenas a consequência de uma época não muito bem preparada, a começar logo pela escolha duvidosa de guarda redes, com o espanhol Roberto a assumir a pasta de Quim. Se as derrotas contra Lyon e Schalke não foram uma surpresa total, apesar das exibições medíocres, a goleada sofrida aos pés do Hapoel resultou mesmo num ponto demasiado baixo na participação encarnada. E, na última jornada, só um golo de Lacazette, no outro jogo do grupo, impediu um humilhante quarto lugar.  

    Sem que as equipas portuguesas conseguissem surpreender, coube ao Tottenham o papel de revelação da prova. Na sua segunda participação em absoluto na Taça/Liga dos Campeões, os Spurs acabaram mesmo em primeiro um grupo que tinha o Inter, campeão europeu em título. Dezoito golos marcados em meia dúzia de partidas, três deles no Giuseppe Meazza e todos eles da autoria de um jovem craque que começava a dar os primeiros passos, o galês Gareth Bale. No mesmo estádio, mas contra o Milan, nos oitavos, os comandados de Redknapp voltaram a surpreender e só mesmo o Real Madrid, nos quartos de final, impediu que a campanha já de si brilhante se transformasse num feito único. Estavam criadas, ainda assim, as bases em White Hart Lane e um craque era apresentado ao planeta do futebol. 

    Mourinho ficou a um passo da final na temporada de estreia no Real @Carlos Alberto Costa

    Depois de não ter conseguido feito melhor do que acabar em segundo no seu grupo, o campeão Inter seguiu para os oitavos e encontrou o finalista vencido da última edição. Na reedição da final de Madrid, não faltou equilíbrio, ainda que o Inter tenha conseguido garantir a passagem para a próxima fase. A época, contudo, foi muito irregular e as dificuldades para encontrar uma base no pós-Mourinho ficaram bem à vista na eliminatória com o Schalke, que foi capaz de ganhar por 2x5 na casa onde, meses antes antes, Chelsea e Barcelona tinham derrapado. Uma péssima imagem deixada por um clube que não conseguiu gerir da melhor forma todo o sucesso vivido na época anterior, onde os três títulos principais foram conquistados (Campeonato, Taça e Champions). 

    Antes de se cruzarem novamente na última etapa antes da final, Pep e Mou iam, com maior ou menor dificuldade, ultrapassando os obstáculos. Estávamos perante dois fortíssimos candidatos que poderiam muito bem ter jogado a final, se os seus caminhos não se tivessem intercetado numa fase anterior. Os merengues resolveram os obstáculos Lyon e Tottenham com duas goleadas, enquanto que o Barça passou por mais dificuldades na eliminatória contra o Arsenal, depois de uma derrota na primeira mão que materializou uma das grandes exibições da equipa de Wenger no pós-Invincibles (2x1). Na segunda-mão, novamente contra uma equipa inglesa, como já tinha acontecido com o Chelsea, em 2009, não faltou polémica, ainda que numa dimensão menor. Van Persie recebeu ordem de expulsão numa altura em que o resultado estava empatado por ter rematado à baliza ligeiramente depois do apito do árbitro. O holandês bem avisou Massimo Busacca que não ouviu, mas tal explicação valeu de pouco aos Gunners

    No lado aparentemente menos forte da competição, avançava o Manchester United rumo à terceira final em quatro anos. Os red devils eram, por esta altura, uma equipa feroz nas eliminatórias de Champions, capaz de lidar com o poder de qualquer adversário. O Chelsea, campeão inglês em título, não conseguiu evitar duas derrotas, em Stamford Bridge e em Old Trafford, e também não ia ser o Schalke a travar o favoritismo natural de Ferguson e companhia. Essa dupla vitória face aos alemães foi tão evidente que ainda hoje pelo Youtube circulam as imagens da exibição de Neuer, o único capaz de impedir números mais humilhantes do que 1x6 (no agregado). Era mais um feito para o antigo campeão europeu, que contou com um grande Chicharito a fazer companhia a Rooney e a Berbatov. 

    Chegamos, então, à grande meia-final entre Barcelona e Real Madrid. Numa altura em que os catalães começavam a preparar-se para garantir mais um título de campeão espanhol, esta eliminatória tinha um sabor ainda mais especial para os merengues, que não conseguiram ser mais fortes na maratona mas que haviam deixado uma imagem de competência no último frente a frente decisivo entre ambos os clubes, com Cristiano Ronaldo a voar no Mestalla para a conquista da Taça do Rei. No Bernabéu, na primeira-mão, o jogo não foi tão interessante e só ficou desbloqueado depois da expulsão muito polémica de Pepe, que levou Mourinho a protestar e, também ele, a receber ordem de retirada do banco. Messi, com espaço, fez um dos grandes golos da edição 10/11 da Champions e a eliminatória ficou praticamente decidida, tendo os blaugrana confirmado o acesso para a segunda final em três anos uma semana depois, em Camp Nou. Mourinho questionava os jornalistas e o mundo do futebol: Porquê?

    Já sem Cristiano Ronaldo, Alex Ferguson jogava as fichas da final de Wembley em Rooney e numa organização defensiva competente. Só um Manchester United muito bem oleado podia parar aquele Barcelona, que era dominador como o primeiro, mas que tinha ainda uma outra gama de recursos, pelo conhecimento de quase todos os jogadores, pelo fortalecimento da forma de jogar e por um Messi que partia ainda mais de terrenos centrais e que entendia cada vez melhor o jogo, os colegas, os momentos para acelerar, os momentos para pausar, as movimentações. 

    Desde muito cedo se percebeu que os catalães estavam na catedral do futebol inglês para passar uma mensagem muito forte, a de que a melhor equipa europeia do ano morava mesmo em Camp Nou. Oportunidades não faltaram, mas o que verdadeiramente impressionou foi a confiança no estilo, a inspiração em jogar sempre bem, a criatividade em todas as zonas do campo, mesmo mais atrás, onde Mascherano, Piqué e Busquets formavam um trio de muita classe, a qualidade individual. Pedro marcou primeiro e nem o golo de Rooney perto do intervalo esmoreceu o campeão espanhol, que marcou a dobrar nos segundos 45 minutos, pela grande figura Messi e pelo outro intérprete do trio da frente, David Villa, num remate que foi parar onde só a coruja dorme. 

    No final, Ferguson estava conformado: «Eles impressionaram-nos com o seu toque de bola. Nunca conseguimos controlar Messi, mas muitas equipas nas últimas temporadas também não. O Barcelona é a melhor equipa que já defrontei e agora o nosso desafio é melhorar mais e mais. Eu estava à espera que nós fôssemos um pouco melhores, mas no final do dia tive a certeza de que fomos batidos por uma equipa melhor. Não existe vergonha em perder com o Barcelona». Quando uma lenda e máquina vencedora como Ferguson se rende desta maneira...então é porque o futebol mudou com esta equipa e com esta final. Fez-se mesmo história!

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    jogos históricos
    U Sábado, 28 Maio 2011 - 19:45
    Wembley Stadium
    Viktor Kassai
    3-1
    Pedro Rodríguez 27'
    Lionel Messi 54'
    David Villa 69'
    Wayne Rooney 34'