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    José Mourinho: o Special One

    Texto por Duarte Monteiro e Ricardo Miguel Gonçalves
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    José Mário dos Santos Mourinho Félix, nasceu em Setúbal. Uma vida de vitórias, de história, feitos e que levou a marca «Mou» aos quatro cantos do planeta.

    Este é o longo caminho que o Zé Mário - como os amigos o tratam -, percorreu desde os juniores do Estrela de Portalegre, onde deu os primeiros pontapés, até ao Real Madrid, onde protagonizou os mais intensos encontros com o Barcelona de Guardiola.

    Mourinho é um ícone do futebol, carismático, polémico, frontal, as suas equipas são mais que uma equipa de futebol. Mourinho, que no Porto prometera que seria campeão no ano seguinte, em Londres espantou tudo e todos, assumindo-se como o Special One.

    Uma trajetória que começou quando orientou as camadas jovens do seu Vitória, ganhou o impulso quando Manuel Fernandes o levou para o Sporting para ser tradutor de Bobby Robson.

    Com o inglês mudou-se para o Porto e depois para Barcelona, onde Robson lhe deu a carta de alforria e passou a ser adjunto do holandês van Gaal.

    Voltaria a Portugal, chamado por Vale e Azevedo para comandar o Benfica... começava então a fantástica história de sucesso que lhe apresentamos hoje...

    De tradutor à Luz da ribalta 

    Acalmem-se os mais precipitados com o entretítulo desta peça. Foi escolhido assim porque Mourinho se estreou como técnico principal no comando do Benfica; aconteceu no dia 23 de setembro de 2000, curiosamente com uma daquelas coisas que o próprio José considerou mais tarde não constar no seu dicionário: uma derrota. Foi por 1-0, no Estádio do Bessa, frente a um Boavista que à data era grande entre os grandes. 

    A história de Mourinho no Estádio da Luz escreve-se depois em poucas linhas. Começou assim, seguiu com dois empates até ao desfecho «perfeito» frente ao Sporting: 3-0 e o adeus à Mourinho, que não queria ser segunda escolha do novo presidente Manuel Vilarinho. No total, foram 11 jogos no banco encarnado, com seis vitórias, três empates e apenas duas derrotas. Seja como for, estava lançada a carreira ao mais alto do nível do futuro Special One. Lá chegaremos. 

    Antes e a velocidade de TGV, recordar que Mourinho foi adjunto no Estrela da Amadora, passou a “Tradutor” em Alvalade pela mão de Sir Bobby Robson que não hesitou em levá-lo para o FC Porto e mais tarde para o FC Barcelona; dois destinos em meados dos anos 90 que se cruzariam mais tarde na carreira do treinador português: o Porto como palco das primeiras conquistas, o Barça como «inimigo público» número um. 

    Crescimento em Leiria, Champions no FC Porto

    Com a passagem –relâmpago pelo Benfica digerida, José Mourinho «usou» a União de Leiria para prosseguir a aplicação do conhecimento futebolístico adquirido em Alvalade, nas Antas e na Catalunha, ao lado de Robson e Van Gaal. Na cidade do Liz, Mourinho ergueu uma equipa onde pontificavam nomes como Nuno Valente, Tiago e Derlei, mais tarde partes integrantes do «Super» FC Porto que deliciou – e conquistou – a Europa. Em 20 jogos na União, Mourinho ganhou nove, empatou sete e perdeu quatro. O bilhete seguinte tinha como destino a Invicta.

    O desembarque no Porto dá-se ainda antes do encerramento da temporada de 2001/2002. Mourinho esteia-se nas Antas a 26 de janeiro de 2002 com uma vitória por 2x1 sobre o Marítimo; pela primeira vez ganhava um jogo de estreia, depois da derrota no Benfica e de um empate sem golos na União de Leiria, em casa do SC Braga.

    Como sucessor de Octávio Machado, Mourinho ainda levou o FC Porto ao 3º lugar, antes de começar a moldar o «seu» dragão para a época seguinte.

    Em 2002/2003, o FC Porto sagra-se campeão nacional com 11 pontos de vantagem sobre o Benfica, conquista a Taça de Portugal com um triunfo por 1x0 sobre a… União de Leiria, com um golo de… Derlei, mas foi na Europa que José Mourinho viveu o primeiro grande capítulo de glória; uma página dourada escrita em Sevilha, num jogo épico frente ao Celtic de Glasgow, a 21 de maio de 2003. O triunfo por 3x2, após prolongamento, deu ao treinador o primeiro título europeu; mas vinha aí mais.

    @Getty / Alex Livesey
    A nível interno, os dragões voltaram a conquistar o título na época seguinte, mas acabaram por ver o Benfica erguer a Taça de Portugal (2x1). No entanto, o clímax de 2003/2004 estava reservado para Gelsenkirchen, nome complicado, mas «casa» de uma noite épica para o FC Porto de José Mourinho, que na final da Liga dos Campeões dizimou o AS Monaco com um 3x0; Carlos Alberto, Deco e Alenitchev inscreveram para sempre os seus nomes na história dos dragões, assim como José Mourinho, que vencia a primeira de duas Champions antes do adeus ao futebol português. O Chelsea foi o desafio seguinte.

    Quando saiu de Portugal, em 2004, José Mourinho tinha os objetivos de carreira bem delineados: completar o grand slam de títulos, ou seja, ser campeão nas três ligas mais importantes da Europa: Inglaterra, Espanha e Itália. Para além disto, já de si uma tarefa hercúlea – não para Mourinho, como se provou -, o técnico português perseguia mais Champions.

    Em Stamford Bridge nasce o «Special One»

    Foi em Inglaterra, segundo o próprio, que José Mourinho mais apreciou e amou o futebol. Chegou ao milionário Chelsea de Abramovich em 2004/2005 e terminou de imediato com um jejum blue que levava 50 anos. Venceu a Premier League no ano de estreia, juntando-lhe ainda a Taça da Liga inglesa, com um triunfo, por 3x2, sobre o Liverpool. Foram os primeiros títulos do «Special One» em Inglaterra.

    No ano seguinte, a mesma receita na Premier LeagueChelsea campeão e vencedor da Supertaça inglesa, com um triunfo por 2x1 sobre o Arsenal. Mourinho ficava a um troféu de conquistar tudo – a prestigiante Taça de Inglaterra -, que chegaria na última época completa do português em Stamford Bridge, em 2006/2007; o Chelsea batia na final o Manchester United por 1x0, no último troféu de Mou em Inglaterra. Nessa época perdeu o título para os red devils e com a época seguinte em curso chegava o adeus aos blues.

    @Getty /

     

    «Il Speciale» conduz o Inter ao topo do futebol europeu

    De Itália, José Mourinho guarda essencialmente a conquista da Liga dos Campeões no comando do FC Internazionale, em 2009/2010. Também aqui, o treinador português ajudou a colocar um ponto final numa «seca» que durava há 45 anos; a segunda Champions de Mou – a terceira do Inter – chegou na segunda época em Itália, numa final decidida com dois golos de Diego Milito sobre o FC Bayern München, no… Santiago Bernabéu. Sobre isso, mais à frente.

    @Getty / Matthew Ashton/AMA
    À Liga dos Campeões, «Il Speciale» juntou dois títulos da Serie A (2008/09 e 2009/10) ao currículo, bem como uma Taça de Itália e uma Supertaça. Portanto, ficava a um título de campeão de completar o grand slam de carreira, que chegaria em Madrid, a próxima estação de José Mourinho.
     

    O Real Mourinho contra a hegemonia catalã

    Madrid, Santiago Bernabéu, Real Madrid. Eis a mais recente aventura de José Mourinho na incessante busca de títulos, glória e polémica. Se em Itália ficaram célebres as discussões com os jornalistas, em Espanha a relação entre ambos os lados é, inquestionavelmente, mais acentuada, talvez pelo incómodo de um lusitano a ditar as regras no mais famoso e bem-sucedido clube do Mundo. 

    Pois bem, foi com Mourinho ao leme que o Real Madrid colocou um ponto final no domínio de quatro anos do Barcelona na Liga espanhola; em 2011/2012, o técnico português conduziu os merengues ao topo do futebol espanhol e fechou, em termos pessoais, o grande sonho a que se tinha proposto quando deixou o FC Porto, em 2004: ser campeão nos três países mais importantes no futebol europeu. Done, special one!

    [Leia aqui tudo sobre a história partilhada entre Mourinho e Guardiola, o pico da rivalidade no El Clásico]

    @Carlos Alberto Costa
    Que antes tenha ganho uma Taça do Rei e depois uma Supertaça (ambas ao super-poderoso Barcelona), apenas serve de confirmação à inquestionável dimensão de José Mourinho: aos 50 anos de vida ganhou tudo o queria ganhar em todo o lado onde queria. Faltará a terceira Liga dos Campeões, que a ser conquistado num terceiro clube, o poderá colocar num patamar sem paralelo no futebol europeu.

    Todavia, na última época na Casa Blanca não repetiria o sucesso. Desde cedo afastado da discussão do título, viu a contestação crescer com o passar dos meses. As zangas com Ramos, Pepe e principalmente Iker Casillas, deixaram marcas e «feriram de morte» a relação com clube e adeptos.

    A eliminação na meia-final da Champions, depois de uma humilhante goleada sofrida em Dortmund, selava o seu destino em Madrid. Mas seria a inesperada derrota na final da Taça do Rei - ainda para mais em casa - contra o rival Atlético de Madrid, que espoletou o processo de desvinculação. 

    Florentino deu uma conferência assumindo o fim do casamento e Mourinho ficou livre para escolher o novo clube. Abramovich não perdeu tempo e chegou a acordo com o Special One, para este voltar a uma casa onde já foi muito feliz. 

    Regresso ameno a casa

    «Prometo exatamente as mesmas coisas que prometi em 2004, mas com uma diferença: sou um de vocês». Foi assim que, em junho de 2013, Mourinho explicou o seu regresso ao Chelsea.

    Tal como se começava a tornar um hábito na carreira do português, os melhores momentos estavam sempre reservados para a segunda temporada em cada clube. Na primeira, começou por perder a Supertaça Europeia para o Bayern Munchen e acabou a Premier League em terceiro, depois de pela primeira vez perder um jogo caseiro à frente do Chelsea (contra o... Sunderland).

    @Catarina Morais
    Essa época fica também marcada pela queda nas meias da Liga dos Campeões e a polémica exclusão de Juan Mata, que tinha sido jogador do ano do Chelsea nas duas temporadas anteriores. O espanhol foi vendido, pouco depois, e pela porta oposta entraram nomes como Diego Costa, Cesc Fabregas e Thibaut Courtois.

    Nesse ano (2014/15), Mourinho teve uma das suas mais infelizes participações na Liga dos Campeões, ao cair perante o PSG nos oitavos de final, mas compensou isso com o tão aguardado sucesso doméstico. Os blues voltaram a sagrar-se campeões ingleses, poucos meses depois de terem levantado também a Taça da Liga.

    Special One foi coroado treinador do ano e em agosto assinou um novo contrato de quatro anos, do qual só cumpriu alguns meses. O início foi infeliz - trágico, até -, com 11 pontos nas primeiras 12 jornadas, e em dezembro, quando chegou à 16ª jornada com nove derrotas no registo, Mourinho foi despedido. Começava a queda.

    Ficar em segundo com o Manchester United, «um dos maiores feitos»

    Se Stamford Bridge era casa, então Mourinho não demorou a encontrar novos arranjos residenciais sem sair da Premier League. Depois de meio ano afastado do futebol, foi anunciado como treinador do Manchester United para 2016/17.

    @Getty / Dean Mouhtaropoulos
    Rapidamente levantou o primeiro troféu, batendo o Leicester City na Community Shield, e terminou a temporada como o primeiro treinador a vencer na primeira época como red devil, já que levantou ainda a Taça da Liga e, em maio, a Liga Europa.

    Vivia novamente uma rivalidade grande com Pep Guardiola, que por essa altura já treinava o Manchester City, mas estava a uma distância considerável dos cityzens em termos de plantel e recursos. Caiu da Champions nos oitavos, frente ao Sevilla, e perdeu a final da FA Cup contra o Chelsea, mas mesmo assim descreveu, anos mais tarde, a temporada como um sucesso, devido ao segundo posto na Premier League.

    «Se eu disser que considero terminar em segundo lugar com o Manchester United um dos maiores feitos da minha carreira, vão chamar-me louco. Digo isto porque as pessoas não sabem o que se passa nos bastidores».

    Tal como tinha acontecido na segunda passagem pelo Chelsea, a terceira temporada não passou de dezembro. Mourinho somou demasiadas derrotas e começou a ficar para trás na tabela, ao mesmo tempo que acumulou incidentes polémicos. Novamente despedido, claro, mas permaneceu em Inglaterra mais uma vez.

    Tottenham: estranha chegada e ainda mais estranha saída

    José Mourinho ficou quase um ano inteiro sem clube, dedicando-se à família e a ocasionais trabalhos de comentador televisivo, até que chegou o convite do Tottenham Hotspur.

    O clube londrino acabava de despedir Mauricio Pochettino, em novembro de 2019, depois de um projeto que já se prolongava sem qualquer tipo de troféu conquistado. Daniel Levy, presidente dos spurs, viu em Mourinho um treinador conhecido por deixar muita prata nos museus dos clubes.

    @Tottenham Hotspur
    Da primeira campanha no norte de Londres, há pouco a salientar. Mourinho ganhou o apoio dos adeptos com algumas boas exibições, bem como momentos humanos, como aquele em que creditou um jovem apanha bolas com uma asistência para o golo contra o Olympiacos na Liga dos Campeões. Mas não conseguiu reverter o mau início de Pochettino e acabou num infeliz sexto lugar.

    Na segunda temporada já viveu mais momentos históricos. Para começar, uma icónica vitória por 6-1 sobre o Manchester United, e um 2-0 sobre os maiores rivais, Arsenal, significou que o Tottenham era líder da Premier League em dezembro.

    Depois disso, começou a descarrilar. Caiu frente ao Everton na FA Cup, em fevereiro perdeu dois jogos caseiros consecutivos pela primeira vez na carreira, foi eliminado da Liga Europa pelo Dinamo Zagreb. O cenário já não era o ideal, mas, pelo menos, o Tottenham estava na final da Taça da Liga com um treinador afamado pelo bom registo em finais.

    Foi aí que o inexplicável aconteceu, em abril de 2021. A poucos dias dessa final, frente ao Manchester City, Levy surpreendeu todo o Mundo e despediu Mourinho, que deixava um clube sem qualquer troféu pela primeira vez desde 2002. Ryan Mason, jovem sem qualquer experiência como treinador sénior, assumiu a equipa de forma interina.

    Regresso a Itália

    Depois de uma série de anos em que José Mourinho deixou de ser venerado pela maioria dos adeptos de futebol, com despedimentos e um estilo de jogo mais conservador a terem um grande impacto na sua reputação, o português regressou a um país no qual ainda tinha a opinião geral do seu lado: Itália.

    Assinou pela Roma, como sucessor do compatriota Paulo Fonseca. Um clube de um calibre e objetivos inferiores ao dos projetos anteriores da carreira, mas encontrou um ambiente propício ao sucesso desportivo. 

    Não teve sucesso na Serie A, onde terminou num pouco impressionante sexto lugar, mas devolveu os títulos aos giallorossi ao bater o Feyenoord na final da primeira edição da UEFA Conference League. Foi o primeiro troféu da Roma em 11 anos, na primeira presença em finais europeias das três décadas anteriores.

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