placardpt
    História
    Tragédias

    A tragédia de Superga

    Texto por João Pedro Silveira
    l0
    E0

    A 4 de maio de 1949, o avião que transportava a equipa do Torino chocou contra a Basílica de Superga quando tentava aproximar-se do aeroporto de Turim, no fim da viagem de regresso de Lisboa, onde defrontara o Benfica no jogo de despedida do seu capitão Francisco Ferreira.

    Todos os passageiros e tripulantes tiveram morte imediata. Ao todo, 31 pessoas perderam a vida, numa das mais trágicas horas do futebol italiano. Era o fim do Grande Torino, uma das mais brilhantes equipas que a Itália e o mundo viram jogar.

    O Grande Torino

    Il Grande Torino era a mágica equipa do Torino Football Club, brilhante dominador do futebol italiano durante os anos quarenta. Durante a sua era dourada, il Toro bateu imensos recordes no futebol italiano e muitos deles ainda perduram nos nossos dias, como as maiores goleadas em casa e fora, o maior número de pontos conquistados numa época, ou ainda o maior número de épocas - quatro - sem conhecer o sabor da derrota em casa, entre outros feitos que ainda enchem de orgulho os adeptos torinese... Pentacampeão italiano (1), a era de sonho do Torino surgiu num momento complicado da história, com o fim da II Guerra Mundial e o lento recuperar dos contactos internacionais nos anos seguintes.

    A Itália fora Campeã do Mundo em 1934 e 1938, vendo o seu domínio ser interrompido pelo deflagrar da II Guerra Mundial (2). A nova geração prometia continuar os feitos de Meazza e companhia, Vittorio Pozzo, bicampeão mundial, continuava no leme e os jogadores do Torino não ficavam nada a dever às estrelas campeãs do mundo da década anterior. Regularmente jogavam, sete, oito até mesmo nove jogadores do Torino nas partidas internacionais que a Itália começou a disputar no pós-guerra, demonstrando toda a importância do Toro no futebol transalpino.

    A equipa do Grande Torino, dominadora do futebol italiano da década de quarenta, tragicamente vitimada no desastre aéreo de Superga. @Domínio Público
    De tal maneira era impressionante a influência da equipa do Torino na Squadra Azzurra que, num amigável com a Hungria, a 11 de maio de 1947, Pozzo fez alinhar dez jogadores do Toro no onze inicial, deixando apenas de fora o guarda-redes que nesse jogo foi o guardião da Juventus, Sentimenti.

    O Grande Torino, orgulhava os adeptos, fazia tremer os adversários e apaixonava todos que o viam jogar. Inovou taticamente, começando a jogar num atacante 4x2x4, mais de dez anos antes do Brasil no Mundial de 1958. O seu futebol ofensivo e a liberdade de movimentos foram de tal maneira revolucionários que inspiraram, entre outros, o «Futebol Total» holandês dos anos setenta.
     
    O onze que a história imortalizou - e perdeu a vida em Superga - era composto por: Valerio Bacigalupo, Aldo Ballarin, Virgilio Maroso, Giuseppe Grezar, Mario Rigamonti, Eusebio Castigliano, Romeo Menti, Ezio Loik, Guglielmo Gabetto, Valentino Mazzola e Franco Ossola. 
     
    O prestígio e a viagem a Lisboa

    A 27 de fevereiro de 1949, a Itália defrontou Portugal em Génova, vencendo por claro 4x1, num jogo sem grande memória para as cores lusas, tirando a assombrosa exibição, logo na estreia, do defesa direito azul-e-branco Virgílio que ficou conhecido depois desse jogo como o «Leão de Génova».

    Na equipa portuguesa, além de quatro dos cinco violinos, destacava-se o capitão da seleção e do Benfica, Francisco Ferreira, o Xico, o «Perfeito Capitão» como ficou reconhecido que aproveitou a oportunidade para convidar os jogadores do Torino a virem homenageá-lo na sua festa de despedida em Lisboa.

    Os diretores do Torino a princípio rejeitaram o honroso convite, mas acabaram por mudar de opinião e voaram para Lisboa para defrontar os encarnados. 

    A 3 de maio, 40 mil espetadores lotaram o Estádio Nacional no Jamor e viram o Benfica bater o Torino por 4x3. «Xico» Ferreira despedia-se do futebol, mas o que poucos imaginavam é que era também este o último jogo de uma equipa sem igual...

    O acidente

    O trimotor Fiat G.212, marca I-ELCE das linhas aéreas italianas, descolou do aeroporto da Portela em Lisboa às 9:40 da manhã do dia 4 de maio de 1949. Às 13:00 (hora local), o aparelho fez uma escala no aeroporto de Barcelona para reencher o depósito de combustível. 

    Capa do jornal La Domenica Del Corriere, com uma versão ilustrada do sucedido na colina de Superga.
    Durante a escala, os jogadores do Torino passearam pelo terminal do aeroporto, onde encontraram os jogadores do Milan que iriam disputar uma partida em Madrid
     
    Às 14:50, o I-ELCE descolou com destino ao aeroporto de Turim. A rota seguiu o horário traçado, sobrevoando Nice e aproximando-se de Itália, quando os controladores aéreos italianos informaram que o tempo em Turim era péssimo. Às 16:55, a torre de controlo do aeroporto de Turim alertou para as péssimas condições meteorológicas na cidade.
     
    Chuva, ventos fortes e um fortíssimo nevoeiro baixo, que tornava impossível ver algo a mais de 40 metros de distância. Após alguns minutos de silêncio, o avião aproximava-se de Superga, a colina dominante sobre Turim, onde ainda se encontra a homónima basílica. Eram 16:59.
     
    Às 17:03, o avião colidiu com a basílica e, dois minutos depois, a torre de controlo tentou contactar o I-ELCE, mas não obteve nenhuma resposta. Das 31 pessoas a bordo, nenhuma sobreviveu ao embate. 
     
    As memórias
     
    O choque e a comoção atravessaram a Itália. O Torino foi proclamado vencedor do campeonato e os adversários formaram onzes só com juniores para defrontar o Torino nas quatro jornadas que faltavam. As exéquias decorreram em Turim, na praça principal, onde mais de um milhão de pessoas seguiram os féretros. O choque deixou a Itália de tal maneira abalada que, no Mundial disputado no Brasil, um ano depois, a seleção italiana viajou para terras sul-americanas de barco.
     
    Nos nossos dias, os restos do avião, entre eles uma hélice e um pneu, além de outras peças da fuselagem do aparelho, assim como malas de alguns jogadores, encontram-se conservadas num museu da cidade turinense. O Museu do Grande Torino e da «Lenda Grená», localizado na belíssima Villa Claretta Assandri di Grugliasco, foi inaugurado a 4 de maio de 2008, 59 anos passados da inesquecível tragédia que vitimou uma das maiores equipas de todos os tempos. 
     
    ------------------------------------------------
    (1) - O pentacampeonato foi conseguido consecutivamente nas épocas de 1943, 1946, 1947, 1948 e 1949. As épocas de 1944 e 1945 não se realizaram pelo generalizar do conflito em Itália depois do desembarque aliado a sul e da forte resistência Nazi, a norte, que tentava sustentar o estado fantoche da República Fascista de Saló, um estado criado para manter o regime de Mussolini e justificar a presença alemã no norte. O campeonato seria retomado após o fim da II Guerra Mundial.
    (2) - II Guerra Mundial - 1 de setembro de 1939 a 8 de maio de 1945.
    Comentários (1)
    Gostaria de comentar? Basta registar-se!
    motivo:
    FA
    Zerozero
    2014-12-27 19h36m por fabioleitao
    antes de mais elogiar o excelente artigo (mais um) que trazem até nós. História, sem dúvida, muito interessante e fico apenas a desejar que este Torino renasça.

    Apenas deixar uma ajuda: em 2008 tinham passado 59 anos.

    Cumprimentos
    Fábio Leitão
    Agradecimento
    hm por zerozero.pt
    Muito obrigado, o número foi corrigido.
    jogos históricos
    U Terça, 03 Maio 1949 - 00:00
    Estádio Nacional do Jamor
    4-3
    Alfredo Melão 23' 29'
    Arsénio 33'
    Rogério Pipi 40'
    Franco Ossola 9'
    Émile Bongiorni 37'
    Romeo Menti 44' (g.p.)
    Estádio
    Estádio Nacional do Jamor
    Lotação37593
    Medidas105x68
    Inauguração1944