O Real Madrid dos Galácticos. Os Invincibles do Arsenal. O campeão europeu Milan, com Kaká e Cafu como reforços. Os poderosos Man. United, Bayern, Juventus ou Inter. A Champions 2003/04 tinha muitos – e fortes – candidatos, mas a 26 de maio, data da final da prova, foi o FC Porto que ergueu a “Orelhuda”: 17 anos depois, Portugal voltava a ter um clube no topo do futebol europeu. José Mourinho, Deco, Ricardo Carvalho e companhia tornaram-se, definitivamente certezas do futebol mundial. Esta é a história de uma das edições mais espetaculares e surpreendentes da Champions, mas a mais saborosa e inesquecível para os portugueses.
É que, veja-se, desde 1995 até à data (2020), esta foi a única ocasião em que não foi uma equipa dos big four (Espanha, Itália, Inglaterra e Alemanha) a ganhar a competição, sinal do extremo atrevimento e da enorme capacidade da equipa de José Mourinho.
Depois de ter conquistado a Taça UEFA na época anterior, o FC Porto estava de volta à principal competição de clubes, com ambição de chegar o longe possível na prova, mas poucos acreditavam no título. Na fase de grupos, os portistas tiveram concorrência forte: o Real Madrid, ainda mais Galáctico com a contratação de David Beckham; o Marseille, que contava com um tal de Didier Drogba no ataque; e o Partizan, que tinha afastado o Newcastle e que contava com o ex-FC Porto Drulovic. Depois de um empate em Belgrado e uma derrota caseira frente ao Real Madrid, o FC Porto somou três vitórias consecutivas e qualificou-se para a fase a eliminar da prova, juntamente com os merengues.
Na fase de grupos, o Mónaco também deu nas vistas. Com um fortíssimo ataque que reunia Giuly, Rothen, Prso e Morientes (emprestado pelo Real Madrid), os monegascos deram espetáculo na prova, com uns incríveis 8x3 ao Deportivo – apesar da goleada sofrida, também os galegos seguiram em frente.
Na fase inicial da prova, duas surpresas, com as eliminações dos italianos do Inter e da Lazio. Os milaneses foram arrasados em casa pelo Arsenal (1x5), enquanto os romanos ficaram em último lugar no seu grupo.
Assim, nos oitavos de final, esperava-se a queda do FC Porto aos pés do Manchester United, que contava com o jovem Cristiano Ronaldo no plantel. Depois de uma vitória por 2x1 no primeiro jogo europeu realizado no Estádio do Dragão, com um bis de McCarthy, os portistas viram-se em desvantagem em Old Trafford ainda na primeira parte. A eliminação estava próxima, até que, no último minuto, Howard defendeu para frente um livre cobrado por McCarthy e Costinha aproveitou a recarga para marcar. Era a euforia total nas hostes portistas, com a imortal imagem de José Mourinho a correr de encontro aos seus jogadores para festejar. O sonho dos azuis e brancos mantinha-se.
Nesta fase da prova, caíram ainda mais dois candidatos: a Juventus, derrotada pelo Deportivo nos dois jogos, e o Bayern, eliminado pelo Real Madrid, de Carlos Queirós,
Nos quartos de final, a emoção e a surpresa predominaram. O FC Porto afastou o Lyon, que mandava no futebol francês por esta altura, de forma relativamente tranquila, numa eliminatória desequilibrada por Deco, autor de um golo e três assistências – ou seja, participou nos quatro golos portistas. Numa eliminatória entre rivais de Londres, o Chelsea surpreendeu ao afastar o poderoso Arsenal em pleno Highbury Park. Era o início da era Abramovich nos Blues.
Claramente favorito frente ao Mónaco, o Real Madrid reforçou esse estatuto ao vencer por 4x2 na primeira mão. Ainda assim, o golo de Morientes, no seu regresso ao Bernabéu, deu alguma esperança à equipa francesa. Esperança que parecia ter morrido quando Raúl inaugurou o marcador na segunda-mão, só que, em cima do intervalo, Giuly empatou e voltou a fazer sonhar os monegascos, que partiram para uma segunda parte fantástica: Morientes voltou a marcar e Giuly bisou, com um espetacular golo de calcanhar. Estava consumada uma sensacional eliminatória e aquele que, para muitos, era o principal favorito da competição, estava fora.
Chelsea e Mónaco, Deportivo e FC Porto. Eram estes os jogos das meias-finais da Champions, de todo improváveis. Os portistas eram os únicos que já se tinham sagrado campeões europeus, e olhavam para a prova com otimismo.
A eliminatória frente ao Deportivo foi muito equilibrada. Depois de um nulo e poucas oportunidades no Estádio do Dragão, tudo se resolveria no Riazor, onde o Deportivo tinha ganho todos os jogos realizados, sem qualquer golo sofrido. Novamente o equilíbrio foi a nota dominante, mas uma grande penalidade cometida sobre Deco permitiu a Derlei – de regresso após prolongada ausência devido a leão – marcar o único golo da eliminatória. 17 anos depois, o FC Porto estava de volta à final da principal competição de clubes.
O adversário dos portistas foi o Mónaco, que afastou o Chelsea: depois de ter ganho em cas por 3x1 na primeira-mão, os monegascos ainda sofreram em Stamford Bridge, quando os londrinos chegaram aos 2x0, mas conseguiram reagir e o empate a dois golos permitiu ao Mónaco fazer história: primeira vez que a equipa chegava à final da Liga dos Campeões.
José Mourinho despediu-se do FC Porto e anunciou-se ao mundo como o Special One. Deco foi considerado o melhor jogador da competição. Vítor Baía foi eleito o melhor guarda-redes da prova, enquanto Ricardo Carvalho foi o melhor defesa. Os portistas fizeram a festa, impensável no arranque da competição, tornando-se na única equipa que não de Inglaterra, Espanha ou Itália a vencer a Champions depois de 1995. Que feito!
0-3 | ||
Carlos Alberto 39' Deco 71' Dmitri Alenichev 75' |