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História
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CUF (Fabril Barreiro)

Texto por João Pedro Silveira
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Tal era a dimensão e a importância da CUF no panorama nacional que em 1930 Alfredo da Silva sentencia: «o que o país não tem, a CUF cria».
 
A dimensão do grupo era tal, que na viragem da década em 1970, a CUF Já representava 5% do PIB Nacional, sendo um país dentro do próprio país, com ramificações nas colónias africanas e Timor-Leste. 
A história do Grupo Desportivo Fabril do Barreiro é indissociável da história da Companhia União Fabril (CUF), e como tal, é por aí que temos de começar.  

O grupo industrial, que em tempos teve a sua principal base de operações no Barreiro, nasceu do génio empreendedor de Alfredo da Silva, o homem responsável pela fusão da sua Aliança Fabril com a mais antiga, mas igualmente em crise, União Fabril, com sede em Alcântara, Lisboa. Em 1898, o empresário tornou-se diretor da nova empresa que em breve se tornaria numa das principais empresas do país.

Um homem dos regimes

Alfredo da Silva, apoiante de João Franco, desde que este provocara uma cisão dentro do Partido Regenerador, para dar origem ao Partido Regenerador-Liberal, apoiou o político quando este substitui Hintze-Ribeiro no governo (1906), por nomeação de D. Carlos.

Quando o monarca dissolveu a Camara e entregou a João Franco poderes ditatoriais (1907), Alfredo Silva este ao seu lado desde a primeira hora, percebendo a importância da sua ##CUF estar próxima do regime. Alfredo da Silva seria parlamentar do partido de Franco, mais tarde um grande apoiante de Sidónio Pais e mais tarde amigo pessoal de António de Oliveira Salazar. 

Um ano volvido, a ##CUF muda-se de armas e bagagens para o Barreiro, onde começaria a formar o seu império. Implantada a República em 1910, Alfredo da Silva, demorou a ganhar a confiança das autoridades republicanas, mas mesmo durante os períodos de crise, a CUF cresceu (beneficiando das necessidades causadas pela Primeira Guerra Mundial) espalhando-se para as colónias, onde podia encontrar as matérias primas fundamentais para os seus diversos negócios, especialmente durante o Sidonismo. 

O 28 de Maio de 1926 e a nova ditadura e o Estado Novo que entretanto surgiria, ajudaram a ##CUF a sedimentar a sua posição como maior grupo económico nacional, que com o tempo se tornaria na maior empresa da Península Ibérica e num dos cinco maiores grupos da Europa. 

Alfredo da Silva, tornou-se o patrão entre todos os patrões portugueses, com a sua empresa a ser a maior das raras excepções industrializantes concedidas pela ditadura de Salazar, com a sua visão tacanha de um predomínio rural e agrícola, profundamente avesso a modernidades e aos riscos de uma sociedade industrializada.

A força do grupo

Próximo do poder, criou para si uma aura de todo-poderoso, mas também de benfeitor, mas a sua liderança também tinha muito de punho de ferro. Aproveitando as concessões monopolistas em África e muito à ##luz dos valores então em voga, explorou a mão-de-obra barata nas colónias, ainda mais do que acontecia no Barreiro, com os alentejanos que lá se radicavam.

Durante décadas, o Barreiro seria, a par da Marinha Grande, uma vila ocupada militarmente pela Guarda Nacional Republicana (que tinha um posto no complexo fabril) e a própria PIDE mantinha os trabalhadores em constante vigilância.

Tal era a dimensão e a importância da ##CUF no panorama nacional que em 1930 Alfredo da Silva sentencia: «o que o país não tem, a ##CUF cria». Esta era ambição da empresa que começara como uma fábrica produtora de sabonetes, velas e adubos para se tornar num conglomerado que englobava setores da indústria, mas também com forte presença na banca e nos seguros, assim como no comércio, na extração mineira, nos transportes, no turismo e até na agricultura.

Marcas como o Banco Totta e Açores, a Setenave, a Lusofane e a Compal, empresas em ramos tão distintos como a seguradora Império, a  Lisnave, a Efacec, a Proalimentar, a Tabaqueira ou a Soponata, além obviamente da ##CUF, com os seus químicos e têxteis,  faziam parte da grande família ##CUF, formando um grupo que contava com cerca de 150 empresas detidas ou em parte participadas pelo grupo.

Quando o grupo é nacionalizado por decreto em 1975, consequência da Revolução de Abril, o grupo ##CUF contava com cerca de 110 mil empregados, e valia 5% do PIB nacional. 

O Grupo Desportivo
 
Cumprindo um velho sonho dos trabalhadores e indo ao acordo das ambições da empresa, a 27 de janeiro de 1937 nascia o Grupo Desportivo da CUF do Barreiro, com o duplo objetivo de ajudar os trabalhadores e seus familiares a dedicarem-se à prática desportiva, ao mesmo tempo que o nome da ##CUF percorria o país nas mais diversas modalidades.
 
Este clube desportivo seguia o exemplo do Clube da ##CUF em Lisboa (fundado em 1936) , o primeiro de três clubes desportivos da ##CUF que surgiram no país, o último nasceria na Cidade Invicta em 1945, sob a denominação ##CUF Porto e duraria até 1945. 
 
Exemplo perfeito dessa política da empresa foi a vitória de Joaquim Fernandes na Volta à ##Portugal em Bicicleta, no verão de 1939. Não só o nome da ##CUF percorria o país, como era sinónimo de vitória.
 
Os dois Unidos: Lisboa e Barreiro
 
Em 1940, o Estado Novo, vivendo um período de grande fulgor e propaganda, a exemplo do que outros regimes despóticos fizeram pela Europa e América do Sul, resolve mexer na denominação de alguns clubes.
 
A Junta Nacional de Educação decide que os clubes portugueses não podem ostentar o nome de empresas. As duas equipas da CUF do Barreiro e de Lisboa são obrigadas a mudar de nome respetivamente para Unidos Futebol Clube (Barreiro) e Clube Unido Futebol (Lisboa). Ambos mantêm as cores e o emblema, e o clube de Lisboa qualifica-se para disputar o Campeonato Nacional da Primeira Divisão, onde consegue o sétimo lugar (com oito equipas), conseguindo o feito de empatar com o bicampeão FC Porto no seu estádio.
 
Na época seguinte, o Unidos volta a ficar em sétimo lugar, desta feita numa prova disputada por doze, onde se destaca a vitória sobre o FC Porto em casa (e o empate na Invicta) assim como os dois empates em que travou o Belenenses. Mas será na época de 1942/43 que a equipa conseguiu o seu melhor resultado, terminando em 4.º lugar, atrás dos três grandes de Lisboa, e batendo o FC Porto nos dois jogos, sendo espetacular a goleada conseguida na Cidade do Porto (2x6), ainda hoje um dos piores resultados de sempre do FC Porto como anfitrião. 
 
1942/43 também ficou na história porque a CUF do Barreiro participou pela primeira vez na competição o que tornou possível um confronto entre as duas equipas da mesma empresa. 
 
Os de Lisboa, conhecidos por Unidos de Lisboa, bateram os do Barreiro por 9x3 em casa e por 2x4 fora, contudo, não conseguiram qualificar-se via Campeonato regional na época seguinte. No ano seguinte a DGEFDSE decretou que os clubes podiam usar o nome de empresas e os Unidos voltaram à denominação original. Um ano antes, o «universo CUF» sofrera grande abalo com a morte de Alfredo da Silva, a 22 de Agosto de 1942. 
 
Em 1947 o clube lisboeta fechava portas para nunca mais voltar a competir. Surgiria mais tarde um novo clube Unidos de Lisboa, mas sem ligação à ##CUF.
 
Crescimento
 
Entretanto no Barreiro, o projeto desportivo crescia, com os escalões mais jovens a alimentarem regularmente a equipa. A tradição de aposta nos jovens começou logo nas primeiras épocas, fruto da equipa de juniores, sob a denominação Unidos do Barreiro ter-se sagrado campeã nacional em 1940. 
 
Em 1953/54 a equipa de juniores chegou à final do Campeonato Nacional, perdido para a Académica de Coimbra, mas a equipa principal tinha motivos para festejar, pois conseguia pela segunda vez a promoção à primeira divisão. 
 
Poucos estariam perto de imaginar, mas a GD CUF estava a um passo de se tornar uma habitué do primeiro escalão. Durante 22 anos consecutivos permaneceu entre os grandes, conseguindo desde 1962/63, com exceção do ano em que desceu, nunca ficar abaixo do 9.º lugar. 
 
O 4.º lugar conquistado em 1961/62 seria um dos pontos altos desse trajeto, mas o grande sucesso chegou em 1964/65, com a CUF a conquistar um histórico lugar no pódio, terminando em terceiro lugar, apenas atrás de Benfica e FC Porto, qualificando-se para a Taça das Feiras, feito celebrado juntamente com a conquista do Campeonato Nacional de Hóquei em Patins. 
 
Estreia na Europa
 
Em 1965, o velhinho estádio de Santa Bárbara deu lugar ao novíssimo Alfredo da Silva, nova casa dos fabris, construída no Lavradio, Barreiro, num projeto do arquiteto Joaquim Cabeça Padrão. Na estreia na Europa, os fabris acabaram por cair na segunda eliminatória, contra o todo-poderoso AC Milan, vencendo por 2x0 no Barreiro, perdendo por 2x0 em San Siro e acabando eliminados no jogo de desempate (0x1).
 
Duas épocas mais tarde (67/68) a CUF caiu logo na primeira ronda da competição, perdendo com os jugoslavos do Vojvodina. Nova presença na Europa, seria na Taça UEFA que entretanto sucedera à Taça das Feiras. Os rapazes do Barreiro caíram na segunda ronda frente aos alemães do Kaiserlautern, depois de terem eliminado os belgas do Molenbeek
 
Na Taça de Portugal o grande momento dos industriais chegou em 1968/69 com a presença nas meias-finais, contudo a CUF não teve andamento para o Benfica, que venceu por 7x2 no conjunto das duas mãos, avançando para o Jamor onde encontrou a Académica, numa célebre final que ficou famosa pelo protesto dos estudantes com as políticas do regime. 
 
Quatro anos volvidos, nova meia-final, desta feita só com um jogo e novamente contra um adversário lisboeta. O adversário era o Sporting, que venceria, avançando para a final, onde bateria o Vitória de Setúbal (3x2). 
 
A história do clube sofreria um duro revés com a Revolução de Abril. Durante o «Período Revolucionário Em Curso» (PREC) a ##CUF, o maior conglomerado empresarial do país, seria nacionalizado. 
 
Revolução e mudança de nome
 
O desinvestimento na secção desportiva é imediato. O clube não consegue manter uma equipa competitiva e no meio de grande tormenta e tensões laborais, acaba em último lugar na edição do campeonato de 1975/76, descendo de divisão.
 
Quatro anos depois, a CUF dava lugar à Quimigal, e a GD CUF transformava-se na GD Quimigal, nome que ostentaria até ao final do século. 
 
Em 1991/92 a Quimigal caía para os distritais de Setúbal, iniciando um longo período de declínio que muitos na altura temiam culminar na extinção. Mas os verde-e-brancos sobreviveram e em 1999/00 sagraram-se campeões distritais. Este seria o último momento da Quimigal, que mudaria de nome, para GD Fabril Barreiro, fechando de vez a ligação do clube à empresa onde nascera. 
 
A nova denominação e o emblema tentavam ser fiéis à tradição e a saudade pelos tempos gloriosos da CUF, que durante duas décadas foi um dos mais competitivos clubes do país. Hoje, a equipa que outrora teve uma grande expressão a nível nacional, disputa a primeira divisão distrital da AF Setúbal.

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