* Chefe de Redação
Eram quase seis da tarde no Rio de Janeiro. Toca o telemóvel, surge o nome no visor.
«Pedro, li a sua mensagem para conversarmos. Vem cá a minha casa bater um papo.»
Agosto de 2016, nasce ali uma amizade para a vida.
O jornalista faz-se à estrada, atravessa a Cidade Maravilhosa de uma ponta à outra, chega à Barra da Tijuca, toca à campainha e o resto é bondade e humildade.
Durante três ou quatro horas, aquela família de um campeão do mundo trata-me como se fosse um dos seus, oferece-me jantar, providencia até um hotel de qualidade.
«Você está hospedado nessa tal zona? É muito perigosa, eu vou ligar aqui a um amigo...»
Bebeto, um dos melhores avançados de sempre, é assim. Genuinamente interessado, genuinamente Bom, um homem de família, famoso e acessível ao mesmo tempo.
Se lhe peço um contacto, ele próprio me organiza a entrevista. Se lhe pergunto uma informação, o Bebeto Bom responde em minutos. Não falha.
Há dias, abro o computador e vejo-o insultado em público por um antigo companheiro de ataque. Um daqueles que nunca responde, nunca atende, recusa qualquer solicitação ao jornalista – mesmo as intermediadas por Bebeto, ò ironia! – e que faz da ofensa uma forma de vida.
José Roberto Gama de Oliveira, 59 anos, O Bebeto, tem um percurso imaculado, no futebol e na política. Basta ir à Corunha ou andar com ele pelo Rio para perceber a empatia que gera com qualquer um. Ricos e pobres, mais ou menos remediados.
Muitos não sabem, mas Bebeto era o único deputado estadual do Rio que entrava nos bairros mais perigosos sem segurança privada. Não precisava. Todos, nessas zonas mais do que sensíveis, sabiam que ele estava lá para ajudá-las.
Recebi-o em Portugal, levei-o a casa, vi a exclamação nos olhos do meu vizinho brasileiro ao vê-lo aqui no Porto e a simpatia de sempre em Bebeto, a tal bondade.
Bebeto merece que Portugal e o Brasil saibam quem é quem nessa estúpida diatribe. A tal ‘traição’, trazida para o espaço público pelo Baixinho do planeta dos malandros, mais não é do que uma vingançazinha macabra, fútil.
Ambicioso, o homem trocou o pequeno Podemos [partido de centro-direita, moderado] pelo Partido Liberal [ninho do bolsonarismo] e quis levar Bebeto. Este, legitimamente, prosseguiu a sua caminhada ideológica e apoiou Lula na eleição presidencial.
Foi isto.
Este Bebeto vs Romário simboliza, de resto, a dicotomia reinante no extraordinário território brasileiro.
A civilização e o civismo contra as trevas, a xenofobia, a misoginia; a moderação versus o extremismo.
Tenho o privilégio de chamar ‘irmão’ a Bebeto, atesto a decência e a integridade de um ser humano maravilhoso. Características, aliás, passadas ao filho Mattheus, futebolista no Farense e portador de uma educação irrepreensível.
Num mundo de loucos e intolerantes, os Bons não podem ser esquecidos ou menorizados. E Bebeto é um deles, um dos melhores.