* Chefe de Redação
Omnipresente.
Se é lateral direito, Pepê faz o corredor de cima a baixo, competência burocrática e selvajaria hedonista, tudo no mesmo jogador de futebol.
Ala esquerdo. Pepê esfrega as mãos, volta ao lugar de sempre, improvisa arranques e travagens à procura das zonas de tiro. O sítio onde é mais feliz.
Meio-campo. Com certeza, seja feita a vontade de Sérgio Conceição. Tremendamente competitivo, impressionante a receber de costas e a iludir a pressão, um tratado de bem jogar.
Pepê é a mais perfeita criatura desenhada por Sérgio Conceição.
Explico-me. Ao chegar do sol de Porto Alegre, Pepê era o típico avançado/extremo de movimentos repetitivos, um Everton Cebolinha com menor estatuto no Brasil. E na Europa.
Receber a bola na esquerda, procurar o meio, tentar o remate ou a combinação. Isto e só isto. Até bater numa parede.
Cebolinha não era diferente, nem melhor, nem pior. Teve, isso sim, o azar de cair nas mãos de um treinador impaciente (Jesus) e num clube em reformulação e profunda crise institucional (Benfica).
O Everton que aterrou na Luz foi o Everton que acabou devolvido à procedência. Os mesmos defeitos, as mesmas virtudes, o mesmo penteado e as mesmas tatuagens. Estagnado.Pepê é o exemplo contrário, radicalmente oposto. Passou de avançado talentoso a futebolista todo-o-terreno, capaz de perceber o que o rodeia e o que deve fazer em cada momento do jogo. Sempre sem perder a extraordinária capacidade de ser genial.
Sérgio Conceição fez um trabalho laboratorial com o rapaz de Foz de Iguaçu. Testou-o, levou-o ao tubo de ensaio, ao limite, dedicou-lhe horas de aconselhamento, entregou-lhe o palco deixado vago pela partida de Luis Díaz. Um triunfo.
Muitas vezes, olho Pepê em campo e sinto-o uma marioneta de Conceição, como se o treinador lhe controlasse todas as ações, um ventriloquismo assoberbado. Mas não, não chega a isso.
Inteligente, Pepê vestiu a roupagem de aluno da primeira fila e não falha uma pergunta. Faz tudo bem, o mais simples e o mais complexo, transformou-se em jogador de seleção brasileira, um extraordinário futebolista com personalidade forte. Percebe o que o treinador exige e representa-o como tão bem sabe e gosta. Pepê tem prazer no que faz e por prazer tudo faz mais sentido.
A exibição no clássico de Alvalade, por ser a mais recente e mediática, terá sido a prova maior deste testemunho de qualidade. Mas Pepê já é este Pepê há muitos meses.
A metamorfose de Pepê é um capítulo de ouro no trabalho do treinador Sérgio Conceição.