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    2018/11/30
    E1
    “Joga Bonito” é uma coluna de opinião de um treinador-jornalista que acredita ser possível apresentar um futebol bem mais atractivo, apaixonante e entusiasmante do que aquele que se vê habitualmente em Portugal. E pasme-se, com o mesmo objectivo presente na cabeça de todos os treinadores, adeptos e restantes agentes desportivos nacionais: ganhar!

    Dizem que todos os treinadores necessitam de tempo para que os seus novos jogadores percebam, assimilem, interiorizem e executem as suas ideias. É um pensamento comum perante os reforços que chegam aos clubes a cada janela de transferências, mas aplica-se ainda mais quando um novo treinador chega a um novo clube. Porque, neste caso, tudo acaba por ser uma nova realidade para ambas as partes: equipa técnica e jogadores.

    Desde logo surgem pequenas questões que são importantes: De quanto tempo ao certo estaremos nós a falar? Existe algum timing que possa ser aplicado? O conhecimento profundo do clube, dos seus jogadores, do campeonato em que se está inserido e dos adversários pode ter algum peso nesta questão? E o desconhecimento total (ou quase) dessa mesma realidade?

    O rol de perguntas será enorme, se quisermos ser precisos e minuciosos, mas, para que possamos desmistificar algumas destas questões, talvez seja importante olharmos para um exemplo prático e actual do futebol nacional. Neste caso, o SCP de José Peseiro por oposição ao SCP de Marcel Keizer.

    José Peseiro foi, na minha opinião, o mentor do melhor futebol praticado pelo SCP nos últimos vinte e seis anos (tempo que levo de vivência em Portugal). Gostei muito do 1x3x5x2 implementado por Lazlo Boloni, gostei muito do 1x4x1x3x2 de Jorge Jesus aquando do seu primeiro ano em Alvalade, mas o 1x4x4x2 Losango de Peseiro em 2004/2005 ficou-me, até hoje, na memória como o futebol mais alegre, vistoso e harmonioso que alguma vez vi ser praticado pelos leões. Nessa época, no entanto, e como todos sabem, o SCP nada venceu. E esteve tão perto de o fazer...

    Anos mais tarde SCP e Peseiro voltaram a encontrar-se, mais precisamente no início desta época. Um reencontro marcado por um Verão extremamente atribulado e atípico, como todos sabemos, e que condicionou o arranque de época leonino. Mas o treinador ribatejano conhecia o clube, a realidade do futebol português, o campeonato, enfim, estava devidamente informado acerca do contexto que ia encontrar. O que, a priori, deveria ter facilitado seu trabalho, não obstante o facto de toda a controvérsia gerada à volta do clube ao longo do defeso.

    O futebol de 2004/2005 voltaria a Alvalade, pensei eu, radiante e entusiasmado. Quão enganado eu estava! Nem por sombras, nem nada que se pareça. Ao contrário do 1x4x4x2 Losango dinâmico, alegre e envolvente dessa época de estreia, o que se viu do leão de Peseiro em 2017/2018 foi um 1x4x2x3x1 rígido, apático, triste e previsível. Mas como se justifica tamanha mudança de atitude e comportamento perante o jogo? O que terá mudado na cabeça do treinador que deu nas vistas no Nacional da Madeira e esteve à beira da consagração em Alvalade?

    Existem várias respostas, obviamente, e todas elas plausíveis. No entanto, recorro a uma afirmação do próprio José Peseiro, que afirmou em conferência de imprensa que esta equipa do SCP não poderia jogar da mesma forma que a equipa de 2004/2005 por causa de tudo o que se passou no Verão.

    A verdade é que isso de nada valeu a Peseiro, que foi despedido e que viu chegar para o seu lugar Marcel Keizer, um treinador estrangeiro, desconhecedor do plantel, dos adversários, do campeonato português, enfim, de todo o contexto que iria encontrar. Perante este cenário, seria de prever mais do mesmo em termos de qualidade de jogo, certo?

    Errado! Nada mais errado! Marcel Keizer, ainda que perante adversários de menor dimensão e com argumentos técnico-tácticos mais modestos, parece ter trazido para Alvalade um futebol alegre, positivo, vistoso, pleno de combinações e dinâmicas. Tudo isso sem ter o mesmo nível de conhecimento da realidade que viria encontrar que José Peseiro tinha quando iniciou a época.

    Afinal, de quanto tempo precisa um treinador para fazer valer as suas ideias? Se olharmos para o Chelsea, por exemplo, Sarri já tem a equipa a jogar à sua maneira. A pré-época bastou-lhe para conseguir isso. Por cá, no mesmo período de tempo, Peseiro limitou-se a apagar a boa memória que todos os amantes de bom futebol tinham de si. Supostamente por causa de um Verão atribulado, o qual iria exigir mais tempo para que a equipa pudesse alcançar um nível de qualidade de jogo que lhe permitisse jogar bem e ganhar.

    E em apenas duas semanas, agora sob o comando de Marcel Keizer, tanta coisa mudou no futebol (jogado) do SCP. Para melhor. O que me faz pensar se será possível mudar tanto em apenas duas semanas. E se o segredo dessa mudança não estará tanto no contexto que envolve a equipa, mas sim nas ideias e no trabalho de quem as operacionaliza em treino e em jogo.



    Comentários

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    motivo:
    Bom. . .
    2018-11-30 19h13m por PPereira76
    Grande abraço!

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