betano
      A preto e branco
      Luís Cirilo Carvalho

      Sensatez e vitorianismo

      2024/11/09
      E0
      "A Preto e Branco” é uma coluna de opinião que procurará reflectir sobre o futebol português em todas as suas vertentes, de uma forma frontal e sem tibiezas nem equívocos, traduzindo o pensamento em liberdade do seu autor sobre todas as questões que se proponha abordar.

      Uma das coisas que caracteriza, desde sempre, os adeptos vitorianos é a capacidade e o gosto de discutirem o futebol do clube em vários planos, desde treinadores a jogadores, táticas a substituições, contratações a dispensas, bons e maus negócios.

      Naturalmente que é em torno dos jogadores que as discussões são mais acesas, porque em termos de gostos cada um tem os seus e, naturalmente, acha que são os melhores. Por isso, defende que devem jogar estes e não aqueles, consoante as respetivas preferências.

      Sempre assim foi e sempre assim será.

      Claro que as redes sociais aumentaram exponencialmente o âmbito das discussões, que anteriormente se faziam á mesa do café ou nas tertúlias informais espalhadas pela cidade e pelo concelho. Onde há dois vitorianos, há conversa sobre o Vitória SC e atualmente envolvem universos muito mais vastos.

      Curiosamente, um dos assuntos que sempre mereceu maior discussão, tanto quanto me lembro, foi o dos guarda-redes do clube. As opiniões divergentes sempre foram ao sabor da realidade do Vitória SC ter tido excelentes guarda-redes ao longo da sua História, ao ponto de não me lembrar de alguma vez não termos estado muito bem servidos na baliza.

      Ricoca, Machado, Dionísio, Roldão, Gomes, Rodrigues, Sousa, Melo, Damas, Jesus, Silvino, Neno, Nuno, Pedro Espinha, Palatsi, Nilson, Douglas, Miguel Silva, Bruno Varela e Charles. São apenas vinte exemplos disso e muitos deles internacionais A por Portugal, bem como campeões nacionais por outros clubes que não (infelizmente) o Vitória SC.

      Era eu miúdo e lembro-me bem de na "Casa das Gravatas", uma conhecida tertúlia vitoriana durante meio século, ouvir animadas conversas sobre o Vitória SC e, dentro delas, a inevitável discussão sobre guarda-redes.

      Ouvia falar do Ricoca e do Machado, que nunca vi jogar,  mas também dos guarda-redes desses tempos (anos 60/70). Nomes como Roldão, Rodrigues, Dionísio, Giesteira, entre outros, com os participantes na conversa a defenderem que este era melhor que aquele e aquele melhor que aqueloutro.

      E depois ao longo dos anos ouvi muito debate e muita discussão em que também fui participando, onde que se discutia quem devia ser titular: se Rodrigues ou Sousa, Damas ou Melo, Jesus ou Silvino, Neno ou Nuno, Douglas ou Miguel Silva e agora Bruno Varela ou Charles, entre outros exemplos possíveis.

      Com uma diferença, que faz toda diferença.

      É que na fase pré redes sociais as discussões faziam-se com outra elevação, com outro respeito por quem veste a nossa camisola, com a preocupação de não denegrir as escolhas do outro, porque todos jogavam no Vitória SC e, por isso, todos mereciam a nossa consideração.

      Com o advento das redes sociais o panorama mudou para muito pior.

      Porque tendo toda a gente o legítimo direito de dar opinião pública, e as redes sociais permitem-no, isso também implicou que muitos dos utilizadores desses espaços, quer por lamentável falta de educação quer por conceitos errados do que é ser vitoriano, venham a público defender as suas opiniões sem qualquer respeito pelas opiniões alheias, e menos ainda por jogadores que vestem honradamente a nossa camisola e em defesa dela dão tudo.

      Neste capítulo específico dos guarda-redes, as coisas começaram a tomar mau rumo anos atrás, com as discussões sobre se o titular devia ser Douglas ou Miguel Silva, e continuam agora por esse lamentável caminho, com a divisão de opiniões sobre Bruno Varela e Charles.

      Não que cada adepto não tenha o inquestionável direito de preferir um ou outro, porque cada cabeça cada sentença.

      Mas preferindo um, e defendendo publicamente essa preferência, não há nenhuma necessidade, de criticar, denegrir e até rebaixar o outro, como se de um inimigo do clube se tratasse. Um bocado ao jeito daquela polémica mundial sobre Ronaldo e Messi.

      O Vitória SC tem dois excelentes guarda-redes feitos, e mais dois ou três jovens que se estão a fazer.

      Qualquer um dos dois está perfeitamente à altura de defender a baliza vitoriana, e ambos tem correspondido quando chamados a jogar, o que naturalmente dá uma enorme tranquilidade ao treinador, aos colegas de equipa e aquela maioria de adeptos que se preocupa mais com o clube do que com as suas preferências pessoais.

      Bruno Varela tem um currículo e uma carreira superiores, porque já foi campeão nacional pelo Benfica (a jogar a época toda), é internacional A por Cabo Verde, depois de ter chegado a estar num jogo da seleção A de Portugal como suplente não utilizado, tem feito excelentes épocas no Vitória SC, é capitão de equipa e tem demonstrado uma profunda ligação ao clube e à comunidade.

      É o titular, e foi opção clara dos quatro treinadores que trabalharam em simultâneo com ele e com Charles no clube.

      Charles é também um excelente guarda-redes, com uma carreira sólida no nosso futebol, em especial ao serviço do Marítimo. Sempre que foi chamado, correspondeu da melhor maneira, e isso levou já a que o Vitória renovasse contrato com ele por mais duas épocas, o que mostra bem o agrado com que as suas prestações são vistas no clube.

      Será assim tão difícil, prefira-se qual se preferir, respeitar as opções do treinador (de Rui Borges e dos anteriores que foram da mesma opinião) e ficar, acima de tudo, satisfeito por o Vitória SC ter dois excelentes guardiões?

      É uma questão de sensatez.

      E de vitorianismo já agora!



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