O avançado e capitão do SC Braga foi o vencedor do Prémio Regularidade do zerozero, como aqui lhe demos conta. O jogador, ágil como em campo, raro pela longevidade que tem no clube, recebeu-nos de braços abertos no estádio bracarense e conversou connosco durante largos minutos sobre o feito.
Já lá vão seis anos. Para o último jogo, ficou reservada a hipótese de se isolar como melhor marcador da história do SC Braga. Conseguiu-o logo no primeiro minuto, num jogo onde também tinha em aberto a atribuição deste prémio. Pese embora a derrota, conseguiu ambos.
Conversámos com o jogador, depois de uma longa maratona para podermos ter o prémio disponível a tempo de ainda o entregar antes de partir de férias. Ricardo estava feliz, sempre com o irmão por perto - andava no estádio com outras questões, mas também se juntou a nós para o momento - e ficou agradavelmente surpreendido com o objeto em causa. Garantiu que haverá prateleira especial para tal, portanto nada nos fará crer que tenha sido somente simpatia.
Ao longo da época, fomos pontuando. Pontuámos todos os que jogaram os 306 jogos da Liga Bwin. Sem olhar a resultados finais, devemos dizê-lo. Só nas últimas duas/três jornadas começámos a ter real perceção do duelo que se estava a travar. No fim, lamentamos não ter mais prémios para entregar, se bem que este fica em boas mãos.
Ricardo abre facilmente o sorriso, aceita os nossos desafios na conversa e, não fosse alguma pressa de quem está nas últimas horas antes de ir de férias - não, não houve outros indícios que possa estar a pensar, nesta fase de defeso -, provavelmente falaríamos por um pedaço de tempo bem maior. Ainda assim, foi uma bela conversa. Apresentamo-la em vídeo e transcrevemo-la em baixo.

«Na segunda volta, surgiram os melhores resultados»
zerozero: Foram muitas centenas de jogadores que, ao longo de 34 jornadas, brilharam no futebol português e, neste caso, na Liga Bwin. O zerozero pontuou todos os jogadores em todos os encontros e, no fim, Ricardo Horta foi o vencedor do Prémio Regularidade 2021/22. Parece-te justo?
Ricardo Horta: Sim. Creio que também estaria bem atribuído ao Taremi. Em primeiro lugar, quero agradecer por este prémio, é com muito orgulho que o recebo, é sinal que a época me correu muito bem e agradeço ao zerozero.
ZZ: Foram três notas 5, três notas 8 e quinze notas 7 e onze notas 6. Consegues adivinhar quais foram os 8? Ou seja, os três melhores jogos do campeonato?
RH: Humm... Posso dizer que foi aqui em casa contra o Paços de Ferreira (2-1)...
ZZ: Certo!
RH: [pausa] Talvez contra... o Estoril, aqui em casa?
ZZ: Errado. Poderá ter havido má avaliação nesse jogo [risos]
RH: Vizela? Vizela em casa (4-1). E o outro... estou a avaliar pelos golos... Contra o FC Porto (1-0)?
ZZ: Correto. Foi, de resto, a única derrota do FC Porto em todo o campeonato. Portanto, também aí fica demonstrado que a tua e a vossa época foi uma realmente boa, tal como a força de um SC Braga que consegue competir e ganhar muitas vezes aos crónicos candidatos.
RH: Acho que sim, a força do SC Braga notou-se principalmente na segunda volta. Creio que, na primeira volta, o grupo estava algo instável, mesmo a nível de jogadores, muitas saídas que, na minha opinião, não foram colmatadas. Depois saiu o Galeno em janeiro, que era muito importante para nós, com características incomuns. A partir daí, o grupo começou-se a fechar, subiram muitos miúdos da formação, ficámos mais estáveis. Passámos a ter semanas de treinos sempre com os mesmos jogadores, criámos um núcleo muito forte e aí surgiram os nossos melhores resultados. Quer no campeonato, onde vencemos os três grandes na segunda volta, quer na Liga Europa, onde fizemos uma excelente prestação.
ZZ: Também fizemos o onze do ano, onde estás incluído. Lançamos o desafio de escolheres o teu onze do ano deste campeonato. Só precisas de escolher 10, tu és o outro.
RH: Vamos tentar... Na baliza punha o Diogo Costa. Lateral direito o Porro, depois Pepe, David Carmo... Defesa esquerdo vou meter o Zaidu, por este golo que decidiu o campeonato. No meio-campo meto o Vitinha, o Matheus Nunes, o Musrati, que fez uma grande época. Na frente meto-me a mim, o Darwin e o Sarabia. Um 4x3x3... Com esta equipa, ia dar um grande treinador [risos]
ZZ: Pensas nisso para o futuro?
RH: Não... [pausa] Sei que, à medida que os anos passam, começa-se a sentir esse bichinho, mas a mim acho que ainda não apareceu. Gosto muito de aprender com todos os treinadores que apanho, mas ainda não penso numa carreira de treinador. Talvez possa ser um bom adjunto... [risos]
ZZ: E pode nem ser em futebol. Pelo que sabemos, tu e o teu irmão têm um ecletismo impressionante, gostam mesmo de desporto. Antes do último jogo, ouvimos dizer que vinham no autocarro a acompanhar o Giro d'Italia.
RH: Sim, sim. Desde pequenos que adoramos desporto. O meu pai também é assim como nós. Vemos quase tudo, desde o campeonato da Europa de Andebol, basquetebol, voleibol. Estávamos a ver o João Almeida nessa última etapa e acabámos por meter mais quatro ou cinco colegas a ver connosco. Somos apaixonados pelo desporto, mas especialmente futebol.
ZZ: Estamos aqui por causa do prémio do zerozero, mas esta é uma época marcante para ti além disso. No último jogo, tornaste-te o melhor marcador da história do SC Braga. És uma figura, uma lenda, um homem para a história deste clube.
RH: Sim, é muito gratificante, estou mesmo orgulhoso por atingir esta marca. Sabia que, no início da época, ainda me faltavam muitos golos para lá chegar e que ia ser difícil alcançá-la. Quando surgiu a proposta para sair, senti que, caso saísse, ia ficar com algo por fazer. À medida que ia marcando golos, o recorde ficava mais próximo e, na minha cabeça, sentia que podia bater este recorde. Por isso, depois de a transferência não se concretizar, isto passou a ser mesmo um objetivo, mesmo não assumindo publicamente que o era. Pessoalmente, era um objetivo e, felizmente, no último jogo consegui fazer isto num clube centenário, um clube grande. É muito gratificante.
ZZ: No plantel, há alguém com capacidade para bater esses números?
RH: Humm... Não sei. Falámos muito disto, porque, hoje em dia, há poucos jogadores que se mantêm muitos anos nos clubes caso se destaquem ano após ano. O normal é serem vendidos ao fim de dois ou três anos. Se acontecer, ficarei feliz, mas neste plantel acho difícil.
ZZ: Isso que dizes é curioso, porque já vais com seis épocas de SC Braga. Normalmente, um jogador que se destaque e não sai, quebra. Quando olhamos para os teus números, claramente não houve essa quebra. Porquê?
RH: Acho que isso tem muito a ver com a personalidade dos jogadores. Há muitos que, por uma transferência falhada, amuam, entre aspas, e já não se sentem felizes no clube. Eu não penso assim. Amo esta profissão, este desporto, e dou sempre tudo, acontecendo coisas boas ou não. Dou sempre o meu máximo, mostrar o meu futebol nos jogos e nos treinos. Apesar de nunca ter surgido uma transferência que realmente me agradasse, fiz sempre bons trabalhos aqui, boas épocas e mostrar sempre mais.

«A seleção não é uma obsessão»
ZZ: Ao longo da época, dos jogadores que não foram chamados, tu foste, de longe, o mais falado para a seleção nacional. Como te sentes em relação a isso?
RH: Respondo a esta quase como na última. Tento fazer o meu trabalho no clube, não é uma obsessão. A seleção tem grandes jogadores, com muita qualidade e talento. Se eu for chamado, vou tentar corresponder e mostrar o meu futebol. Mas já o disse várias vezes: não é uma obsessão, embora, claro, se for chamado é motivo de grande orgulho.
ZZ: Não terá a ver com a qualidade do Ricardo Horta, mas dos que já lá estão.
RH: Claro, e eu digo sempre isso. Para eu ir, têm de sair nomes como Félix, Diogo Jota, Rafael Leão... são jogadores também de grande qualidade. Mas isso já são escolhas do selecionador, não quero, de todo, entrar por aí. Tento fazer o meu trabalho, dar o meu melhor e felizmente as coisas estão a correr muito bem no SC Braga e espero que continue assim.
ZZ: No futebol português, muitas vezes os adeptos passam a mensagem de que tudo está mal e quem regula o futebol e os clubes passa de que está tudo bem, a melhorar e cada vez mais profissional. Vocês, que estão lá dentro, que opinião têm sobre isto?
RH: Na minha opinião, e falo muitas vezes com amigos sobre isso, porque eles, no fundo, são adeptos, digo sempre que o futebol é dentro das quatro linhas. Essas coisas extra-futebol, que nada tem a ver com o jogo, para mim nada tem a ver com futebol. Futebol são as jogadas, os golos bonitos, as defesas, as fintas... Tudo o que acontece fora de campo e que mete dirigentes, empresários, para mim já não é futebol. Falo só do futebol pelo qual me apaixono e essas coisas passam-me um pouco ao lado.
ZZ: [compasso de espera para chamarmos o irmão André, que se juntou à conversa] Já viste o prémio?
André Horta: É bonito...
RH: Olha, não te meti no onze do ano.
AH: Não??? Quem é melhor do que eu?
RH: Meti o Musrati
AH: Quem é que é melhor do que eu? [risos] Não, quero só expressar o meu orgulho, não é todos os dias que vemos um irmão nosso sagrar-se o melhor marcador da história de um clube, ser considerado melhor jogador pelo zerozero, um site muito conhecido a nível nacional e internacional. É um grande orgulho poder jogar com ele, poder viver isto tudo com ele, é um sonho que tínhamos desde pequeninos. Quero continuar a desfrutar com ele todos estes momentos.
ZZ: Quem é o maior candidato a ganhar este prémio para o ano?
AH: É ele, claro.
RH: Não, mas ele tem de se superar.
AH: Naaa, pode ganhar ele, é sinal que marcou muitos golos e fez muitas assistências.