Sem passar a pente fino os melhores cabeceamentos das três décadas de história futebolística da Eslovénia, diríamos que o de Pavlin, no Euro 2000, está pelo menos no top-3.
Foi no primeiro jogo do Campeonato da Europa, e logo contra a vizinha Jugoslávia prestes a desmembrar-se definitivamente; Zahovic cruzou e o «11» fez o 2-0.
Um lance que cativou o FC Porto, tanto que o comprou. E, mesmo sem sucesso nas duas épocas que passou nas Antas, não há sobre Pavlin uma má sensação.
Pois bem, também não a há em Pavlin. Pelo contrário!
Ver aqui a parte II da entrevista.
Mas sobre o FC Porto falamos na segunda parte da entrevista. Neste primeiro capítulo, o assunto é o Portugal x Eslovénia desta segunda-feira. Não foi fácil chegar ao contacto com Miran Pavlin - fica o agradecimento ao nosso colega Pedro Jorge da Cunha, um dos maiores nomes da praça - mas chegou a tempo.
Com leveza, alegria e contágio, num inglês tipicamente de Leste. Faz parte, percebemos imediatamente, da comitiva eslovena que tenta mais um passo histórico. Se o fizer contra Portugal, será o maior de todos, pois claro.
Segue-se a conversa...
O herói esloveno que foi uma das primeiras apostas de Mourinho no FC Porto. Quem se lembra de Pavlin? https://t.co/IEX3HA3sq6 pic.twitter.com/YrzQJl9Ptb
— David Pereira (@DavidJCPereira) March 25, 2024
«Nos próximos 50 anos, não vão ver ninguém melhor do que Cristiano Ronaldo»
zerozero: Falamos um bocadinho. Prefere em português ou inglês?
Miran Pavlin: Em inglês, por favor. Eu percebo em português, mas não sou bom falante.
zz: Que palavras ainda se lembra?
MP: Acho melhor não dizer… [risos] Quando eu jogo futebol com amigos, eu ainda digo «fo*****»! [risos] Eu estive em Portugal tempo suficiente para me lembrar dessas coisas.
zz: Diga-nos, o que tem feito?
MP: Estou no futebol, estou há quatro anos e meio na federação, como diretor da seleção nacional. Estou muito contente por estar na Alemanha.
zz: E que sentimento há por aí? É o maior jogo da vossa história, certo?
MP: Sim. Nós achávamos que o maior jogo tinha sido o amigável de março em Ljubljana, mas afinal é na segunda-feira. Está a ser uma história fantástica, mas… Agora é duro para nós, Portugal tem o melhor jogador da história do futebol. Vai ser difícil para nós.
zz: Mas vocês não têm pressão, essa está do lado de Portugal.
MP: É verdade, mas nós queremos pressão. Todos dizem que não temos nada a perder, mas isso não é verdade. Há 24 anos que não estávamos num Europeu, quando foi a minha geração. Agora, nós queremos mais, queremos o passo seguinte. Porque em 2000, eram 16 equipas e agora também são. Nós queremos é os quartos de final.
zz: Qual vai ser a melhor estratégia para bater Portugal?
MP: Bem, o jogo de março… não vai ser assim desta vez. Mas, contra grandes equipas, nós não temos segredos. Jogamos em 4-4-2, somos estáveis na defesa, tentamos os contra-ataques pelo Sesko e pelo Sporar, a tentar explorar alguma debilidade na defesa portuguesa. O nosso problema vai ser estabilizar a defesa. O lado ofensivo de Portugal é fantástico, um dos melhores do mundo. Essa é a nossa missão primária, depois vamos ver. Quanto mais tempo segurarmos o jogo com 0-0, melhor para nós.
Com medo de Ronaldo
zz: Vocês têm sido especialistas em empates, três jogos, três igualdades. Fazem lembrar Portugal em 2016. Pode ser uma boa forma de sucesso, não?
MP: Ir ao prolongamento é bom para nós, depois são só mais 30 minutos. E a seguir há os penáltis, e eu acho que temos um dos melhores guarda-redes do Mundo. Nós não sofremos muitos golos, isso é bom para nós e faz-nos acreditar. Temos de ser pacientes. Podemos andar uma semana a preparar uma tática e estratégia e no primeiro minuto tudo mudar.
zz: Se o jogo for a penáltis, acha que a Eslovénia tem vantagem?
MP: Sim. Para mim, o Oblak é o melhor guarda-redes do Mundo. É a minha opinião. Já o acompanho desde os 16 anos. Ele é especialista em muitas coisas, nos penáltis também. Mas é uma lotaria, nunca sabemos.
zz: De que jogador têm mais medo?
MP: Ahhh... A vossa equipa é boa. Mas têm o melhor jogador da história. O Cristiano Ronaldo... ahhh, aquela mentalidade. Não é só porque marca golos. É o pacote todo. Nos próximos 50 anos, não vão ver ninguém melhor do que ele. É o conjunto todo, que mentalidade ele tem! Temos medo dele, é verdade. E ele contagia a vossa equipa toda. Com esta idade, ufff!
zz: Já falou com algum português sobre o jogo?
MP: Não, deste ainda não. Conheci as pessoas no jogo de março, estive com o meu antigo colega Ricardo Carvalho, que agora é adjunto. Falei com eles e com outras pessoas da Federação Portuguesa. Com o Fernando [Gomes], que estava no FC Porto na minha altura.
zz: Como está a ser a sua experiência como diretor?
MP: Está a ser muito bom para nós, bastante especial. Foram muitos anos sem ir a um Europeu. Além disso, a organização na Alemanha está a ser excelente, a UEFA é exemplar, um fantástico torneio. Mas conto-vos a minha história dos últimos quatro anos e meio. Vim para a seleção nacional depois de sermos quartos no grupo de qualificação, metíamos três ou quatro mil pessoas nos estádios, como contra Malta, Moldávia ou Kosovo. O começo foi assim. E ninguém achava que viríamos a uma fase final a curto prazo. Trabalhámos, trabalhámos, trabalhámos, devagar e com cabeça. Tivemos alguma sorte no sorteio da qualificação, identificámos alguns jovens com talento e valor e, aos poucos, fomos crescendo. Até chegarmos aqui.
zz: Foi, portanto, um motivo de orgulho.
MP: Claro. Eu joguei em 2000, joguei alguns jogos com o FC Porto na Liga dos Campeões. Isto entra nas ocasiões mais especiais que tive no futebol.
zz: Lembro-me bem daquela cabeçada no Euro 2000. Contra a Jugoslávia, não foi?
MP: Isso mesmo, 3-3. Estivemos a ganhar 3-0. O Mihajlovic até foi expulso, mas eles conseguiram marcar três golos. Por nós, o Zahovic marcou dois e eu fiz esse golo, que me valeu a transferência para o FC Porto. Fiz algo de especial nesse jogo e eles compraram-me [risos].