Mario González abriu o coração: «Não creio que tenha sido um desastre, mas...»

*com Miguel Freitas

Um golo. Mais outro. E outro a seguir! Continua a marcar! Esta é a fórmula habitual de Mario González. Uma interrupção apenas, desde que o comum adepto português o conhece: em Braga, num clube a que ainda está ligado. Parece que não será por muito mais tempo, que na Bélgica estão loucos com a sua veia goleadora. Faça assim, caro leitor: abra a Jupiler Pro League (campeonato belga) e espreite a tabela dos melhores marcadores. Et voilà. Aí, como aqui, nos tempos de Tondela, Super Mario faz do Golo o seu nome do meio.

Ainda assim, a conversa que se segue tem muito sobre SC Braga. Mario tem a certeza que não mostrou tudo o que vale, mostrou-se algo amargurado com o último verão, mas não guarda qualquer mágoa. Até porque, como qualquer avançado que se preze, está bem alimentado de golos. Como em Tondela. Como no empréstimo ao Tenerife.

Agora, é em Heverlee, com a camisola do Leuven.

Voltou a ser feliz, agora na Bélgica �Getty /

«O dono do Leicester comprou o clube há quatro anos e está a investir»

zerozero: A época ainda vai a meio, mas que para o Mario está a ser impressionante, uma vez que tem 13 golos no campeonato e 15 no total da temporada. Após uma passagem onde se evidenciou em Portugal, a experiência na Bélgica não podia estar a correr melhor. 
Mario González: As coisas estão a correr bem e nunca pensei em ter um início como este. Estou muito contente num novo país, depois de uma etapa em solo português que acho que foi positiva. 

ZZ: Como é que está a correr a adaptação? Em termos futebolísticos não está a ter problemas, pois os números falam por si, mas acaba por ser uma mudança muito grande em termos de cultura.
MG: Estou num lugar diferente, mas não tive problemas em ambientar-me, pois nunca tive medo de sair de onde estava. A Bélgica tem poucas horas de luz e às 16h30 já é de noite, o que acaba por ser um pouco triste às vezes, mas tem os seus aspetos positivos, claro. Existem três ou quatro cidades bonitas, onde já fui e gostei muito. Está a ser uma experiência enriquecedora em termos linguísticos, pois lido diariamente com atletas que falam francês e inglês.

Mario González 2022/2023

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ZZ: Que futebol encontrou na Bélgica? É muito diferente daquele a que estava habituado na Península Ibérica?
MG: Nunca tinha imaginado que ia ser algo tão físico, com muitos duelos. A maioria das equipas baixa o seu bloco defensivo desde o apito inicial, portanto, no começo, foi difícil. Quando estive em Portugal ou Espanha, tinha a sensação que era mais rápido que os defesas adversários mas, na liga belga, nem sempre é assim. 

ZZ: Então como é que tem marcado tantos golos?
MG: Se calhar este estilo de jogo favorece mais as minhas qualidades. Mas a verdade é que os jogadores acabam por cometer alguns erros, sobretudo a nível tático, pois as equipas estão menos trabalhadas e existe menos cultura futebolística comparativamente à Península Ibérica. Em qualidade técnica, no entanto, não ficam nada atrás e podemos observar o exemplo do Club Brugge, que ganhou ao Atlético Madrid na Champions League, assim como o Union St Gilloise que derrotou o SC Braga. Como já disse, a parte tática é a que deixa mais a desejar, com algumas falhas grandes, e eu, sendo um jogador inteligente como acho que sou, consigo encontrar sítios sem jogadores dentro de campo.

ZZ: Pode dar alguns exemplos?
MG: Aqui não têm o conceito de trabalhar como uma equipa muitas vezes, pois a responsabilidade acaba por ser individual. Eu estou a marcar o meu adversário e sou eu que tenho de tentar com que ele não passe. Muitas vezes, em termos defensivos, não tens ajudas, porque, quando perdes um duelo ou uma disputa, não há ninguém para cobrir o espaço que deixaste, sendo que eles fazem marcação ao homem e não ao espaço. 

ZZ: Além do futebol, como é que descreve o clube que encontrou?
MG: É um emblema em crescimento, pois só tem 20 anos de história. Eram três clubes que, posteriormente, se juntaram num só. O dono do Leicester, o Grupo King Power, comprou o clube há quatro anos e está a investir no estádio e nas infraestruturas. Em termos de jogadores, a equipa cresceu nos últimos anos e está em constante evolução. O objetivo para este ano é disputar o playoff da Conference League, se bem que pode ser um bocado ambicioso. Para fazer uma comparação, consigo ver semelhanças com o Cercle Brugge ou Sint-Truiden, emblemas que estão na metade da tabela.

Fez muitos elogios a Ricardo Horta �Vítor Parente / Kapta+

«O Banza está a sofrer um pouco aquilo que eu sofri»

ZZ: Continua ligado ao SC Braga. Tem acompanhado a equipa?
MG: Sempre que tenho oportunidade, vejo. Esta temporada já vi 15 ou 20 partidas, ainda no outro dia acompanhei frente ao Boavista. Tenho boa relação com muitos jogadores do plantel e espero que as coisas corram bem para o clube.

ZZ. Os bracarenses há alguns anos que tentam voltar à Liga dos Campeões, onde estiveram há cerca de uma década. Parece-lhe que esta época é uma oportunidade maior que as anteriores?
MG: Estão na luta, aproveitando o facto de o Sporting estar um bocado mais fraco neste momento, ainda que, de certeza, no final da época vão estar também na luta. O SC Braga tem qualidade em todas as posições e consegue lutar por todas as competições em que está inserido. 

ZZ: Na altura em que foi contratado, fizemos uma análise em que apontamos que procurava muito o Ricardo Horta porque era a figura da equipa, algo que continua a acontecer. Entretanto, teve a possibilidade de ir para o Benfica, algo que não se concretizou, mas é um símbolo do clube.
MG: A equipa do SC Braga depende muito do Ricardo Horta, pois está construída para ele, algo que, na minha opinião, é positivo, dado o jogador diferenciado que ele é. Ele percebe muito de futebol e gosta de passar os dias a ver jogos de futebol. Tem uma qualidade superior, comparativamente aos demais, no que toca a descobrir os seus companheiros dentro de campo. Dentro da área, também faz a diferença, porque falha poucas vezes frente à baliza, por isso acho que acaba por ser normal o preço que pedem por ele.

ZZ: De quem se tem falado também é do Vitinha, o próximo ponta-de-lança que se pode estrear pela seleção A de Portugal. A sua ascensão em pouco tempo surpreendeu-o?
MG: É um jogador jovem, que ainda só tem dois anos na equipa principal do SC Braga, mas que já tinha uma boa conexão connosco, assim como o Abel Ruiz e o Simon Banza, que eu acho que é um grande avançado, mas está a sofrer um pouco daquilo que sofri. Quando chegas ao SC Braga, tens de fazer alguns movimentos que não são naturais num avançado, mas que ajudam a equipa, que tem um estilo de jogo muito concreto. É necessário algum tempo para perceberes o que te pedem, mas o Vitinha e o Abel Ruiz já têm essas rotinas bem definidas, fruto de muitos anos a trabalhar nesse estilo.

Começou bem a pré-época, mas caiu nas escolhas �Catarina Morais / Kapta +

«O Artur Jorge tinha dito que contava comigo...»

ZZ: Que expectativas tem para a sua ligação com o SC Braga?
MG: De momento, sou jogador do SC Braga, mas o OH Leuven tem uma opção de compra, que eu acho que vão exercer, apesar de não me terem comunicado nada. Nunca podes dizer nunca, mas será difícil voltar a jogar em Braga, pois, neste momento, não precisam de mais avançados e vão receber mais dinheiro daquilo que pagaram por mim na altura. 

ZZ: Essa solução agrada-o?
MG: Sim, eu acho que não tive a confiança por parte do clube e, consequentemente, não me consegui habituar como gostaria. Não creio que tenha sido um desastre, mas penso que o estilo de jogo não era o melhor para mim. Disseram-me que contavam comigo, mas as coisas não foram ao encontro das promessas, portanto encontramos uma solução boa para todos. Se tudo correr normalmente, fico por aqui.

Mario González SC Braga 2021/2022

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ZZ: Não ficou com nenhuma mágoa?
MG: Não, não. Fiquei chateado comigo mesmo porque não consegui mostrar aquilo que acho que tenho. Acredito que tenho nível para jogar no SC Braga, mas isto é o futebol. Com o tempo, consegui perceber que o estilo de jogo não favorecia as minhas qualidades, mas que, no contexto do clube, resulta, pois conseguiram duas taças nos últimos anos e chegaram longe na Liga Europa na época passada. Falei com o treinador para dar a conhecer as minhas intenções e chegamos a um acordo, portanto, nada de mágoa e só lhes desejo o melhor.

ZZ: A passagem pelo CD Tondela foi aquela onde vimos um Mário González mais goleador, sendo que, nessa época, ficou no pódio de melhores marcadores do campeonato. Acredito que a aventura em Portugal tenha muito mais de positivo do que de negativo. Mesmo que assine em definitivo pelo OH Leuven, um regresso a Portugal é algo que vê com bons olhos?
MG: Quando fui para Tondela, não tinha a sensação que era uma boa opção, mas, depois de falar com os meus agentes e família, vi que estava enganado. Portugal está no meu coração porque as coisas correram muito bem na primeira temporada, onde fiz grandes jogos. Se tiver uma proposta que me agrade, voltarei com todo o gosto.

ZZ: Agora que olha para trás, e ainda que falte algum tempo para tirar conclusões da sua carreira, a passagem pelo CD Tondela foi a que mudou mais a sua vida?
MG: Sim, sim, porque foi o início de tudo o que está a acontecer. Esta época também estou a evoluir bastante, mas foi em Tondela onde tive o maior crescimento profissional. Tenho muito boas recordações de Tondela e tenho pena que tenham descido e que agora passem por algumas dificuldades, mas espero que voltem o mais rápido possível ao principal escalão do futebol português.