A derrota por 0-3 em Alvalade, na última terça-feira, dia 11 de fevereiro, deixou o Sporting com uma tarefa hercúlea pela frente: vencer o Borussia Dortmund na Alemanha por uma diferença igual ou superior, isto se o conjunto liderado por Rui Borges quiser seguir em frente na Champions.
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O desafio é enorme, mas há quem saiba o que é marcar três golos aos alemães e qual o ambiente que os leões vão encontrar no Signal Iduna Park.
André Paulo, ex-guarda-redes do Sporting, fez parte da equipa que jogou em Dortmund para a Liga dos Campeões em 2021/22 (derrota por 1-0) e também esteve presente na vitória por 3-1 em Alvalade, que ajudou a garantir o apuramento leonino para os oitavos de final dessa edição da prova.
O agora jogador do Oliveira do Hospital relembrou o ambiente intenso, as dificuldades e 'desvendou' os segredos que podem ajudar a equipa de Rui Borges a acreditar no «impossível».
Dortmund, outra vez
André Paulo acompanhou de perto a derrota do Sporting na primeira mão do playoff e sabe que o desafio na Alemanha será exigente. O jogador, de 28 anos, recorda bem a atmosfera vivida no Signal Iduna Park.
«Esse Dortmund, em termos de jogadores, era mais completo, mas lembro-me do ambiente. Incrível mesmo. Olhas para aquela bancada [Yellow Wall] e dá muita vontade de jogar ali», começou por dizer.

Antes do jogo, como manda a tradição, a equipa teve oportunidade de sentir a imensidão do estádio, mesmo vazio: «Já era impressionante, imaginámos como seria aquilo cheio. Todos em pé, parecia que vinham para cima de nós. Mete respeito, nos momentos de aperto sentia-se que vinha dali um barulho extra, como se tivessem um jogador a mais. Mas já estávamos habituados; Alvalade, Luz e Dragão, às vezes ainda é pior.»
Sobre a possibilidade do Sporting inverter a eliminatória, André Paulo é realista, mas não descarta um feito histórico.
«O Sporting tem uma montanha muito difícil de escalar agora, mas o Dortmund não está num bom momento. As lesões do lado do Sporting não ajudam, mas a chave é não pensar em recuperar a vantagem. É pensar em ganhar e quando o primeiro entrar, é ir buscar o segundo. O foco tem de estar em ganhar, não em recuperar a desvantagem. O resto vai acontecendo», asseverou.
Os tempos de leão ao peito
André Paulo guarda com carinho as memórias do seu percurso no Sporting, em particular a temporada do título. O guardião integrou um grupo jovem que surpreendeu o país ao erguer o troféu de campeão nacional que há tanta escapava aos verde e brancos.
«O ano do título foi muito especial. Éramos uma equipa muito jovem, muitos jogadores da formação, jogadores que ninguém conhecia, basicamente. Começámos mal a época e depois fomos jogo a jogo. Fomos ganhando confiança e víamos que era possível conseguir o título, apesar de isso não ter estado na nossa mente no início», frisou.

O lema "jogo a jogo", tantas vezes repetido pelo grupo e por Ruben Amorim, não era apenas um chavão, mas uma filosofia enraizada. «Era mesmo literal. Jogo a jogo. Eram três pontos e não interessava o que vinha a seguir, tínhamos de ganhar aqueles três pontos. Foi sempre assim.»
O ambiente dentro do balneário contribuiu decisivamente para o sucesso. «Foi dos melhores ambientes em que já estive. Ainda por cima numa equipa grande... Não é assim tão fácil encontrar um ambiente daqueles. Muita união, todos a remarem no mesmo sentido e a apoiarem-se», acrescentou.
«Ruben Amorim é direto e isso cativa os jogadores»
A união do grupo deveu-se, em grande parte, à liderança de Ruben Amorim, um treinador que, segundo André Paulo, soube conquistar a confiança dos jogadores com um discurso muito direto e justo.
«O mister Ruben é incrível mesmo. A maneira como lida com os jogadores, mesmo nos treinos. A paixão dele, a forma como está sempre ativo e a puxar por nós... É um treinador totalmente diferente.»
O técnico, antigo jogador e com o bichinho da bola, por vezes dava uns toques no treino. «Às vezes entrava no meinho», recordou André Paulo. Mas, quando havia dúvidas sobre quem devia ocupar o centro da roda, a resposta era sempre a mesma: «Em caso de dúvida ia sempre outro [risos].»
Amorim soube manter o grupo unido, apesar da inevitável gestão de expectativas e minutos de jogo. André Paulo reconhece que não teve tantas oportunidades como gostaria, mas nunca se sentiu injustiçado.
«Com ele joga quem está melhor. Se havia alguém melhor do que eu, eu não podia jogar. Com ele era fácil, toda a gente compreendia isto», reconheceu.
O respeito pelo treinador era generalizado, em grande parte pela sua transparência nas decisões: «Nós percebíamos que as decisões dele eram tomadas com alguma justiça, mas depois também era a forma de ser dele. Era muito direto connosco. Isso cativa as pessoas, principalmente no futebol. Depois era muito bom treinador, tudo o que nos dizia que o adversário ia fazer acabava por dar certo. Aí ganhas os jogadores e eles seguem-te.»
Agora, alguns anos depois e com um timoneiro diferente, o plano está traçado. Em 2021, o Sporting marcou três golos ao Borussia Dortmund para vencer e ficar mais perto de se qualificar para os oitavos. Conseguiu. E André Paulo esteve lá. Se há alguém que conhece a receita, é ele. É hora de repetir.