João Félix, «a galinha de ovos de ouro» do Padroense FC

* por Pedro Pimparel Serafim

Não é só no Euromilhões que saem prémios chorudos, que acabam mesmo por mudar o destino de uma vida. No desporto, isso também pode acontecer, sendo o Padroense FC, um excelente exemplo disso. É no Padrão da Légua que habita um emblema centenário, conhecido por potenciar jovens talentos, que sonham, num futuro próximo, fazer do futebol as suas vidas.

Muitos tentam, poucos conseguem é, sem dúvida, uma das expressões mais célebres, no que ao desporto-rei diz respeito. Todavia, na formação de Matosinhos já passaram inúmeros meninos que chegaram aos mais altos voos do futebol profissional, muitos deles já tendo a oportunidade de representar as cores da Seleção das Quinas.

João Félix, nome que a ninguém passa despercebido, faz parte deste lote. O futebolista do Chelsea disputou o Campeonato Nacional de sub-17 pelo emblema matosinhense, na época 2014/2015, quando ainda estava ativo um protocolo de colaboração com o FC Porto. 

Em declarações ao zerozero, Germano Pinho, presidente do Padroense FC, referiu que já em Juvenil, Félix possuía um talento acima da média: «Era aquele tipo de jogador que, desde cedo, mostrava provas muito sólidas de que tinha um potencial muito elevado. É um jogador de complexidade frágil, mas muito virtuoso, muito técnico, e como tal tínhamos expetativas de que ele pudesse vir a dar um jogador de primeira linha. Honestamente, ver onde ele chegou não foi surpresa para mim».

Segundo o dirigente do clube, a saída do atleta para o SL Benfica, na época seguinte, gerou «uma compensação pequena» para os cofres da instituição, fruto dos direitos de formação, compensação criada pelo Mecanismo de Solidariedade da FIFA. Porém, os cerca de 10 mil euros recebidos seriam catalisadores para um enriquecimento inesperado.

A verdade é que o jovem prodígio acabou por dar continuidade ao seu desenvolvimento nos encarnados, tornando-se campeão nacional de Juniores em 2017/2018, ao mesmo tempo que era uma das coqueluches da equipa B. O destaque do Seixal acabaria mesmo por se estrear na equipa principal do Benfica, em agosto de 2018, frente ao rival Sporting CP.

Félix marcou de cabeça, o golo que restabeleceu a igualdade no marcador (1-1), na reta final do jogo, e a partir daí … o leitor já conhece a história. Foram os 20 golos marcados e oito assistências, em 39 jogos disputados, que despertaram a atenção dos colossos europeus. Com 19 anos de idade, o Menino de Ouro rumou no final da época, ao Atlético Madrid, de Diego Simeone, num negócio nunca antes visto no futebol português: 126 milhões de euros foi o valor pago pelos colchoneros para trazer a promessa para a capital espanhola.

Lembram-se dos 10 mil euros mencionados anteriormente? Com esta transferência, a quantia destinada ao Padroense transformou-se, subitamente, em 280 mil euros (!), um valor fora do comum para um conjunto que atua na Divisão de Elite da Associação de Futebol do Porto. Aos olhos de Germano, este substancial montante não podia ter chegado em melhor altura.

«A transferência ocorreu no período pandémico, numa fase de contenção das receitas. Este valor, principalmente para um clube da nossa dimensão, foi crucial porque permitiu que o clube passasse este momento mais complicado com algum equilíbrio», destacou.

O dirigente admitiu, ainda, que este montante «não foi pago na íntegra», mas sim «desdobrado em dois anos e meio», o que permitiu uma gestão monetária mais pensada e cautelosa.

A reformulação da bancada

Se parte do valor serviu para sustentar as despesas do clube numa fase complicada, a outra fatia direcionou-se para a renovação de equipamentos e para a reestruturação de infraestruturas. Com este objetivo em mente, a bancada do apelidado «Campo de Treinos», destinado à formação, foi desenvolvida para assumir uma nova dimensão.

«Nós reconstruímos a bancada precisamente em período de pandemia, uma resolução que se efetivou em menos de três meses. Criamos uma cobertura para dar mais conforto às pessoas e, mais recentemente, colocamos cadeiras individuais. Apesar de ser uma estrutura pequena, é bastante funcional e esteticamente muito enquadrável. É, sem dúvida, uma mais valia para o nosso parque desportivo, porque é lá que se realizam mais de 90 por cento dos jogos. Os seniores têm um jogo em casa de 15 em 15 dias, mas nós na formação temos por volta de 12 jogos por semana», referiu o presidente.

Para além das receitas extraordinárias, provenientes dos jogadores da casa, o clube fundado em 1922, também tem contado com o apoio monetário da Câmara Municipal de Matosinhos, com vista ao melhoramento das facilidades. Segundo Germano, «as duas fontes de rendimento» conjugadas têm permitido que o Padroense tenha «rendimento desportivo, com qualidade e eficiência, e sem roturas financeiras».

Os meninos do Padrão da Légua

O protocolo de cooperação desportiva com o FC Porto estendeu-se até 2022, e permitiu que, para além de João Félix, muitos outros jogadores mediáticos - que, atualmente, já são realidades do futebol nacional - jogassem pelos vermelhos e brancos. Craques como André Silva (RB Leipzig), Diogo Dalot (Manchester United), Diogo Leite (Union Berlim), Vitinha (Paris Saint-Germain) e Fábio Vieira (Arsenal) são alguns futebolistas que escreveram o seu nome na história do clube.

O Presidente do Padroense FC confessou um enorme orgulho no percurso realizado pelos seus ex-atletas, e relembrou que no último Mundial da Seleção A portuguesa, foram convocados cinco jogadores que já tinham representado o emblema matosinhense: «Muito poucas equipas podem dizer o mesmo».

«Ainda recentemente li uma entrevista do Rúben Neves, que está agora no Wolverhampton, e que se perspetiva que saia para um clube de maior dimensão no final da época. Ele disse que a sua formação foi toda muito boa no FC Porto, mas que não podia esquecer o ano em que passou no Padroense, e que lhe permitiu um crescimento importantíssimo. Eu fiquei muito sensibilizado», conclui.

Se o Jackpot já saiu uma vez, por que não sair a segunda? A verdade é que com a próxima janela de transferências já ao virar da esquina, os direitos de formação podem novamente ser ativados em novos negócios:

«Estamos à espera que este ano, o Félix volte a dar dinheiro, porque ele provavelmente não ficará no Atlético Madrid. O próprio André Silva pode vir a sair do RB Leipzig e há a perspetiva do Diogo Leite ficar no Union Berlim, a título definitivo. Há atletas em que estamos de orelhas afiadas para que as coisas corram bem, tanto a eles como aos clubes envolvidos, e consequentemente, a nós também», recorda o dirigente.

Não é só na formação que atuaram profissionais com passagem na primeira divisão nacional. Germano Pinho relembrou Arsénio (Arouca) e André Simões (Famalicão), que representaram o emblema de Padrão da Légua ao serviço dos seniores, e onde assumiram um papel de destaque. Contudo, o presidente assumiu que o investimento atual, por parte da direção, está maioritariamente vocacionado para a base e não tanto para o escalão acima.

O responsável relembrou que «os principais objetivos passam por criar boas condições de crescimento e na certificação a um nível elevado», mas acredita que futuramente o foco possa vir a ser outro.

«Neste momento a aposta tem sido somente na formação, mas eu espero, desejo e acredito, que o Padroense crie condições objetivas para poder ser mais ambicioso na vertente desportiva. Ficaria muito contente com isso, mesmo já não sendo comigo», confessou o dirigente de 73 anos.

Recorde-se que o Padroense FC esteve muito perto de subir à segunda divisão, em 2010/2011. Atualmente, os comandados de João Costa ocupam a sexta posição da Divisão de Elite da Associação do Porto.