*com Cristiano Tavares Faria
Nunca antes, em quase 111 anos de história, tinha acontecido, mas a dolorosa notícia, para os fãs do Olhanense, acabou por ser confirmada com a derrota ante o Oriental Dragon: a descida inédita do Campeonato de Portugal aos distritais da AF Algarve.
Apenas a última machadada numa temporada iniciada de forma terrível dentro das quatro linhas, a dar sequência ao imbróglio existente fora delas, entre clube e SAD. Matéria de conhecimento público, que acabou por ser tema de conversa com Djalmir, terceiro maior artilheiro da história dos rubro-negros.
Radicado em Olhão, as raízes entrelaçadas com o clube e a cidade, onde mais se notabilizou, ficaram marcadas a tinta permanente: «Digo às pessoas que não nasci em Olhão, mas fui criado. Foram oito anos e meio bem passados, graças a Deus.», começou por dizer ao zerozero.
Rapidamente, a bonita analepse, promovida pelo antigo goleador brasileiro, esbarrou na realidade que afronta os Leões de Olhão, no presente.
«Quando voltei [n.d.r 2018/19, campeonato de Portugal], ainda fui ajudar meio ano no campeonato nacional. Depois tive de sair outra vez, porque estavam lá pessoas que não tinha ligação nenhuma, nem afinidade nenhuma, portanto não havia motivos para estar ali», referiu, em menção à SAD italiana, que geriu os destinos do clube, até ao início desta época.
«A equipa estava classificada para os playoffs, depois houve a Covid e só chamaram as duas primeiras equipas», recordou, ao sublinhar a atípica época 2019/20: «É uma coisa que ainda vai render para o Olhanense... Dá a sensação que as equipas do sul são um bocadinho prejudicadas em relação ao que rodeia o futebol, porque é longe, as pessoas não gostam de viajar.»
«O Olhanense precisava de estabilidade e essa subida à segunda liga, se calhar, era esse saltinho que precisava para ajustar muita coisa», referiu, admitindo que tal insucesso desportivo, aliado à venda do clube aos proprietários italianos, foi a receita perfeita para o desastre.
«Tínhamos garantido a manutenção [n.d.r 2012/13], no último jogo do campeonato. Depois houve a assembleia geral em que eu e o Rui Duarte, um dos capitães, estivemos e já desaprovávamos tudo que ia aparecer por ali. O clube ia deixar de gerir os seus próprios recursos e no futebol e, pronto, foi vendido... Foi a derrocada total», relembrou com mágoa.
Daí em diante e mesmo distante de Portugal durante cinco anos, Djalmir manteve ligada a ficha ao seu antigo clube, por intermédio de «amigos olhanenses que se queixavam dos jogos serem no Estádio do Algarve.» Uma das razões para a crescente «desidentificação» e afastamento da massa adepta do clube, tão sublinhada, pelo antigo goleador.
«Ao estádio só vai quem ainda tem sangue na guelra. A partir do momento em que o clube foi vendido, é como se dissessem: 'Isto aqui não é o Olhanense!'», relatou.
Hoje em dia, a SAD, já fora das mãos italianas, após transferência de funções para Luís Torres, vê o litígio iniciado no tempo da gestão estrangeira manter-se. Os apoios são cada vez mais escassos e a estrutura é, apenas, assegurada pelo referido presidente da sociedade desportiva, nas palavras de Djalmir, um olhanense convicto.
«O clube hoje vive de migalhas, porque foi praticamente abandonado. Ninguém quis ajudar mais o Olhanense. Num clube temos presidente, vice-presidente, diretor desportivo, temos um staff de 10 ou 15 pessoas... No Olhanense temos uma pessoa que trata de tudo, que é o Luís Torres», assegurou, antes de considerar Isidoro Sousa, como o «responsável pela venda do clube.»
Sem deixar de parte a opção de refundar o clube do zero, Djalmir prefere acreditar que «os olhanenses não vão deixar o clube morrer», apesar da grande perda de associados na última década: «Eramos quase três mil sócio pagantes. Hoje temos trezentos. É uma maneira de protesto.»
«Venderam o brinquedo mas queriam continuar a brincar com ele», é por esta frase alegórica, que Luís Torres começou por definir as intenções do clube perante a sociedade desportiva, desde o momento em que deixou os investidores entrarem.
Em conversa com o zerozero, o presidente da SAD dos algarvios convergiu com a visão de Djalmir, sobre a relação deteriorada entre clube e SAD, ainda que aponte a temporada 2019/20, como o certificado de declínio rubro-negro: «Ao não termos ido para a Segunda Liga, dado o sucesso desportivo que os jogadores tiveram, durante essa época, perdemos praticamente todos numa primeira fase e o remanescente numa segunda.»
«A Federação, não contente com a decisão de não termos subida à Segunda Liga, ainda criou a Liga 3, virtualmente. Ou seja, toda a gente sabia que ia existir, mas que ainda não existia. Ao ter feito essa competição virtual, em 2020/21, fez com que descêssemos de divisão. O que aconteceu foi isso: acabamos em primeiro e descemos», sustentou.
Um duro revés nas aspirações de um projeto que viu nascer «uma estupefação nos parceiros» que o apoiavam, ditando o «abandono completo dos investidores», que deixou o Olhanense numa situação frágil, sobretudo a partir do início de 2022.
«Isso fez com que fossemos obrigados a liquidar o nosso melhor ativo, o Ricardo Matos, para o Portimonense, para conseguir acabar a temporada. Esta época, fomos objetivos e claros a dizer que não tínhamos capacidade financeira para fazer o projeto, ao nível do que as pessoas estavam habituadas», sentenciou.