Vic-54 25-04-2024, 06:41
O impacto das plataformas de Streaming e das redes sociais no futebol é cada vez maior, no entanto, nenhum clube tem uma relação tão estreita entre o desporto-rei e o mundo digital como o que vamos apresentar, caro leitor.
Raro é o fã que, nos diferentes tipos de videojogos relacionados com a modalidade, nunca tentou criar um clube de raiz e - com muitas horas de sono perdidas - só parar na glória. Pois bem, a ficção transformou-se em realidade num projeto que está a dar que falar e com fãs espalhados pelo planeta: o Hashtag United Football Club.
Aliando a paixão pelo futebol a uma carreira construída online, o conhecido youtuber britânico Spencer FC - perto de dois milhões de seguidores - decidiu criar oficialmente um clube em 2016. A ideia inicial do projeto passava por jogos entre youtubers, celebridades e outro tipo de equipas, com os melhores momentos a serem gravados e publicados na plataforma.
A repercussão da iniciativa foi tão grande que a entrada no futebol amador não demorou. Passados uns anos, o «clube da Internet» tem tido um crescimento exponencial e vem a subir patamares, com milhares de pessoas a acompanharem religiosamente cada vitória e subida de divisão. Um fenómeno que divide opiniões, mas não deixa ninguém indiferente.
Comediantes, seleção britânica de surdos, canais de televisão, o grupo Sidemen ou membros do Staff do Manchester City. Exemplos de algumas das equipas que Spencer Carmichael-Brown e os seus amigos defrontaram, em partidas marcadas por momentos hilariantes e que ficaram virais nas redes sociais. O fenómeno cresceu e a responsabilidade social aumentou, com algumas antigas estrelas da modalidade a juntarem-se em torneios de caráter solidário, que chegaram mesmo a Wembley.
«No início jogávamos todo o tipo de jogos. As visualizações dispararam e decidi tornar o projeto mais sério, com a entrada na pirâmide do futebol inglês. O nome tem significado devido à nossa ligação às redes sociais e sabíamos que ia criar algum barulho. A verdade é que a nossa base é a Internet, não temos uma localização fixa e de raiz», explicou Spencer à Sky Sports sobre as origens do clube.
Mesmo com resistência das entidades organizativas devido ao nome pouco usual, o Hashtag United Football Club tornou-se mesmo uma realidade e em 2018/2019 estreou-se nas competições amadoras. Uns meses antes, atento ao fenómeno, César Azpilicueta [atleta do Chelsea] investiu no clube e aliou-se ao grupo de donos, o que alavancou ainda mais o projeto.
Um engajamento peculiar - palestras, viagens e jogos são todos documentados em vídeo - num nível futebolístico ainda baixo, que acabou por atrair marcas como Adidas ou o simulador Football Manager a patrocinarem a equipa. Num país tão tradicional, de forma natural surgiram vozes críticas contra este ´abanão` de ideias e métodos na base do futebol inglês.
«O nosso crescimento deve-se aos fãs de todo o mundo. Competimos com clubes da Premier League a nível de seguidores e visualizações nas redes sociais. É natural que os mais tradicionalistas não gostem, porém, acredito que estamos a fazer bem ao futebol amador. Atraímos jovens e muitas vezes dividimos as receitas das transmissões com os outros clubes», revelou o principal responsável da equipa atualmente a jogar em Pitsea, nos arredores de Londres.
Em mais um exemplo da tão lusa capacidade de multiplicação, existe presença portuguesa no clube desde o início da presente temporada. Emigrado em Inglaterra desde tenra idade, Pedro Carvalho explicou ao zerozero um pouco do seu percurso e como surgiu a oportunidade de representar a equipa.
«Por volta dos meus 11/12 anos os meus pais emigraram para Inglaterra. Passámos por uma cidade mais pequena e depois fomos para Londres. Continuei sempre a jogar e estive em várias equipas. Por contactos de agentes passei durante 18 meses pela Polónia, mas não gostei muito da experiência e acabei por voltar.»
«Tive conhecimento do Hashtag United em 2020, acho. Tinha uns amigos que jogavam no clube e comecei a acompanhar o projeto pelo Youtube. A minha equipa anterior fez um amigável contra o Hashtag e estive bastante bem nesse jogo. Passou um ano e o treinador entrou em contacto comigo para vir para cá esta época», revelou-nos.
Com os seguidores a dispararem nas redes sociais e mensagens de adeptos de todo o mundo, o extremo abordou o crescimento de popularidade desde a chegada ao clube, assim como as boas condições proporcionadas pelos Tags.
«A nossa divisão não é muito alta, mas o sentimento das outras equipas é diferente quando jogam contra nós. Dão aquela corrida extra. Nas redes sociais é incrível a interação dos adeptos connosco. Muitas mensagens de apoio, etc. Para teres noção, ainda recentemente vieram alguns adeptos da Indonésia para cá [risos]. Viajaram até Londres de propósito só para nos verem.»
«As condições são incomparáveis com as que já encontrei. Também a nível de organização e ainda recentemente estava a jogar numa divisão superior. Aliás, grande parte do nosso plantel vem de escalões acima. O nosso objetivo é claramente subir de divisão e estamos a fazer por isso [12 triunfos consecutivos, melhor sequência da atualidade inglesa]. Neste momento dividimos o nosso campo com outra equipa. Não conseguimos comprar um estádio para esta época e a ideia no futuro pode passar por construir», confessou.
Apesar da mudança de país ainda em criança, o jogador de 24 anos continua a ter um grande sentimento por Portugal e revelou-nos abordagens anteriores de equipas lusas. O desejo de regressar está no coração.
«Tenho muita vontade de jogar aí. Já tive oportunidade de ir para clubes do Campeonato de Portugal, mas gostava de abraçar um projeto mais forte. Isto não quer dizer que não goste de estar em Inglaterra. Estou habituado à intensidade e agressividade do futebol», admitiu.
Com duas subidas já conseguidas mesmo num percurso afetado pela pandemia da Covid-19, o potencial deste projeto é enorme e tem servido para atrair jogadores, que ganham uma exposição rara num escalão ainda amador. Só no Youtube, por exemplo, 617 mil pessoas seguem o canal oficial do clube.
«Acho que o Hashtag pode ser um bom trampolim. Atraímos um número raro de pessoas para os nossos jogos, muito pelo online. O meu foco está atualmente na minha equipa, mas já tive sondagens de alguns clubes de divisões que não esperava. A nível individual as coisas estão a correr bem. Acredito que não vai demorar muito até o clube estar perto dos campeonatos profissionais. O percurso desde a fundação tem sido espetacular», afirmou o português.
Cá estaremos para seguir os próximos capítulos desta aventura. Tudo à distância de uns cliques.
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