Depois de três finais finais, o Benfica conseguiu por fim conquistar a UEFA Youth League, conhecida como a Liga dos Campeões dos mais novos, ao bater o RB Salzburg (0-6). Luís Castro foi o treinador que acabou com essa seca e abriu as portas do Benfica Campus ao zerozero para uma entrevista onde abordou essa conquista, as suas ambições profissionais, os talentos que despontam no Seixal e muito mais.
Nesta 1ª de três partes da entrevista o foco esteve nessa histórica campanha encarnada na Youth League, onde o técnico português explicou todo o trabalho que foi feito para que a equipa alcançasse esta conquista sob a forma de um grande domínio sobre os seus adversários, não esquecendo alguns dos jovens talentos que mais se destacaram.
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zerozero (zz): Estamos a falar com o primeiro treinador do Benfica a conseguir conquistar a Youth League, algo inédito e uma grande conquista. Aconteça o que acontecer, já deixou uma marca no Benfica?
Luís Castro (LC): Sim, aconteça o que acontecer deixei uma marca. É um trabalho coletivo de todo o Benfica, porque, como foi visto em todos os jogos, fomos superiores e para isso é preciso ter muita qualidade nos jogadores, têm que estar bem trabalhados e ter as bases necessárias. Agora é evidente que fui o primeiro enquanto treinador principal e o Benfica não vencia uma competição europeia há alguns anos, por isso foi importante para o clube e para a formação, especialmente porque já perseguíamos este troféu com alguma insistência. Era a 4quarta final e foi ótimo conseguir.
zz: Na altura da eliminatória com o Sporting, o mister destacou que seria a quarta final four do Benfica e que isso atestava a competência do clube na formação. Este foi O título, mas o resto também mostra que as coisas estão a ser bem feitas e não é algo geracional…
LC: Sim. Não foi uma geração, foram quatro gerações totalmente diferentes que estiveram nas quatro finais. O título é a cereja no topo do bolo, mas acho que estava à vista de toda a gente que o bolo era ótimo. Não era fácil. Esta época foi feito um ranking das equipas que estavam na Youth League, à semelhança daquilo que se faz nas equipas principais – onde Portugal está em 6º neste momento -, e Portugal na Youth League, nos sub-19, está em primeiro, com muitos pontos arrecadados pelo Benfica, que é a equipa com mais jogos, com mais Final Four’s, mais finais, empatada com outra equipa. São muitos jogos a nível europeu e isso atesta competência a nível da estrutura.
zz: Olhando para o trajeto do Benfica esta época, foi praticamente imaculado, com exceção para a derrota com o Dínamo Kiev. Foi claramente a equipa mais forte. Esperava isso?
![]() | Luís Castro UEFA Youth League 2021/22 |
zz: Na meia-final teve uma adversidade [expulsão de Samuel Soares]. Já era conhecida a qualidade dos jogadores, mas o que é que essa adversidade mostrou mais?
LC: Depois da expulsão mostrámos que temos jogadores muito talentosos, muito evoluídos taticamente, já o tinham demonstrado até esse momento a nível ofensivo, e ali mostraram a nível tático defensivo um conhecimento e preparação enorme. Mostraram, acima de tudo, que são jogadores que honram a camisola, porque não foi fácil, perante um adversário tão complicado, jogar com menos um tanto tempo. Eles mostraram que estão aí para dar muitas alegrias aos benfiquistas.
zz: Sente que a equipa já estava mais perto de ganhar a final depois desse jogo?
LC: Podemos ver por dois lados. Um, ajudou a unir ainda mais o grupo, mostrando que, além do talento individual que tínhamos, eramos um grupo muito forte. Já tínhamos demonstrado. Ninguém vai ganhar a Alcochete 4-0, com os jogadores que o Sporting apresentou, se não houver muita qualidade, mesmo em termos coletivos. Por um lado, penso que ajudou os jogadores a perceberem, já sabiam, mas tiveram a certeza, quem tinham a seu lado nesta guerra, quem eram os parceiros que estavam dentro de campo para lutar pelo objetivo. Deu-nos uma maior força a nível coletivo. Mas, por outro lado, jogámos muito tempo com dez, corremos muito tempo atrás da bola. Houve um desgaste enorme e a outra equipa, na sua meia final, conseguiu facilmente substituir os quatro jogadores da equipa que mais correm – jogavam num losango no meio campo e conseguiram substituir – e tiveram um lateral esquerdo amarelado e também o conseguiram substituir para não levar outro cartão. Eles geriram tudo na meia final o cansaço, algo que nós não conseguimos fazer. Agora, quando me perguntaram na antevisão da final se estava preocupado com o cansaço dos jogadores, eu disse que não porque, fosse onde fosse, mas numa final eles iam buscar as forças necessárias para vencer.
zz: Como é que isso explica uma vitória tão dominadora do Benfica perante uma equipa com bastante experiência de Youth League?
LC: Em primeiro, penso que foi muito mérito da equipa técnica…
zz: Disse numa entrevista que os seus analistas nem dormiram para preparar o jogo…
zz: Como é que uns miúdos tão novos conseguem mudar e interpretar isso tudo?
LC: Qualidade, muita qualidade, inteligência de jogo, perceção do que é uma estratégia, qualidade tática e técnica, porque para estarem predispostos para isso precisam de ter qualidade técnica para fazer as coisas como nós queremos. Muita qualidade individual, que depois se transforma nisso. Nós estávamos no mesmo hotel que o Red Bull, estávamos a festejar e a certa altura foi ao bar. Estava lá uma pessoa que não é da equipa técnica deles, mas que os acompanha há muito tempo. Cumprimentou-me, felicitou-me e disse: «Eu acompanho esta equipa há muito tempo, fizemos uma prova fantástica até à final, vamos a torneios internacionais que dominamos, sabemos a qualidade da equipa e não é este jogo que nos vai fazer desistir da equipa, mas aos dez minutos de jogo eu comecei a perceber, e comentei com uma pessoa que estava comigo, que ia ser muito difícil. Vocês anularam-nos tudo e aproveitaram tudo o que era possível.»
zz: Muito trabalho também…
LC: Sim. Tenho uma equipa técnica fantástica. Ajudaram nisso, mas também na recuperação dos jogadores. O fisiologista e o fisioterapeuta não pararam porque tivemos pouco tempo entre jogos e muitos dos jogadores tinham muito tempo de jogo, tanto de campeonato como de seleções. Isso foi muito importante. Tenho elogiado em todas as entrevistas os jogadores, e acho que eles são os principais obreiros disto, tenho elogiado toda a estrutura do Benfica, porque nós tínhamos esta qualidade toda e não contratei nem um, nunca fui eu que tratei deles na escola para serem mais inteligentes e responsáveis, não sou eu que lhes dou a muito boa alimentação que têm aqui, não sou que trato da relva para podermos treinar todas as semanas,… Penso que é uma vitória de todos, desde quem abre a porta de manhã, até quem apaga as luzes ao sair. Mas também tenho que dizer que o staff que esteve na prova fez um trabalho fantástico.