Vestiu o fato-de-macaco para tocar uma sonata de Beethoven. Sentou-se ao piano, ainda sujo com as manchas de óleo e o suor de um dia duro, e escreveu a sinfonia certa para dar a melodia que o Boavista precisava. Mais lenta e recuada nas fases regulares, emotiva e acelerada quando se exigia tensão emocional. Um médio todo-o-terreno, útil em todos os momentos que o jogo encerra, um artista sem pejo de meter a mão na massa. O golo de cabeça foi só o refrão mais inspirado, mas longe de ser o único.
Não engana. Pormenores de craque, capacidade para desequilibrar, quebra-cabeças difícil de deslindar. O que lhe faltou? Uma banda mais competente a acompanhar a atuação do ‘frontman’. Surgiu menos vezes no um para um de que tanto gosta e nas zonas interiores foi rodeado e bloqueado com competência pela cerca imaginada por Petit. Um dos mais inconformados do lado gilista, apesar de tudo. No golo foi servido com mestria, por Pedrinho, e depois a finalização foi brilhante. Insistimos: um craque.
Um achado. Passada larga, 190 centímetros em perfeita harmonia, boa relação com a equipa e com a bola. Não merecia ver os dois golo anulados – o primeiro por três centímetros, sentenciou o VAR -, depois de tanto oferecer ao jogo. Tem experiência de Bundesliga, tem boa escola e é uma evidente mais-valia no ataque do Boavista. Leva seis golos esta temporada, mas é um avançado completo e a pedir um olhar atento nos próximos meses.
Poucos se terão apercebido, mas há um internacional francês a querer brilhar no Bessa. Chegou pesado, massacrado por lesões e claramente sem condições para ser opção. Melhorou, esperou pela sua vez e Petit percebeu o que tinha em mãos. Mais forte, mais solto, Ntep teve uma mão cheia de pormenores deliciosos e incluiu ‘túneis’, dribles e outras habilidades no menu de degustação. Zé Carlos vai ter pesadelos com ele esta noite. Aos 54 minutos esteve perto de marcar e, pela reação, percebeu-se que já estava no limite físico. Quando durar mais de 45/60 minutos será, com naturalidade, um caso sério.
No Bessa ninguém rouba bolas como o internacional colombiano. Lê o jogo com sabedoria, acerta quase sempre o tempo de antecipação, faz faltas quando tem de fazer, anda por todo o lado. Depois, com bola, percebe que o mais sensato é entregar com simplicidade. Exibição convincente lado a lado com Makouta, a dar uma dimensão ao meio-campo do Boavista que, há semanas, parecia impossível.
Passe maravilhoso a isolar Samuel Lino para o 1-1. Muito pressionado, muito bloqueado, soube manter o sangue frio e a coragem com bola. Não tremeu. Arriscou o remate num par de ocasiões e teve a lucidez de identificar os caminhos mais aconselháveis para perturbar Porozo e companhia. Nota alta num jogo de estupenda exigência.
O melhor futebolista do Boavista ao longo da época teve uma tarde má. Também tem direito. Decidiu mal, demasiadas vezes, em situações que normalmente define bem. Isolado perante Frelih fugiu para o lado pior e perdeu tempo de remate; no meio-campo, e com linhas de passe abertas em transição, arriscou um ‘chapéu’ sem sentido. Há dias assim.
O matador espanhol encolheu-se na arena axadrezada. O poder físico de Porozo anulou-lhe os movimentos e a influência no ataque organizado. Não teve bola, não teve espaço e voltou a Barcelos sem deixar a marca de sangue que o tem acompanhado por esses estádios afora.
1-1 | ||
Gaius Makouta 4' | Samuel Lino 67' |