A Austrália tem estado um pouco pelas bocas de todo o mundo no que ao desporto diz respeito nos últimos tempos devido a toda a polémica em volta de Novak Djokovic, número 1 no ranking mundial ATP (Association of Tennis Professionals), que foi, inicialmente, proibido de participar no Open da Austrália, um dos quatro grand Slam's do ténis, por não estar vacinado contra a covid-19.
Com o torneio a arrancar no próximo dia 17, segunda-feira, os últimos dias têm sido de grande alvoroço. O tenista de 34 anos chegou a ser deportado da Austrália aquando da sua chegada àquele país e proibido de participar no torneio, mas o caso tem estado a ser analisado pelas autoridades australianas - Djokovic assumiu ter prestado informações falsas no preenchimento da declaração de entrada na Austrália e ter dado uma entrevista durante o período em que deveria estar em isolamento por ter testado positivo- e, entretanto, a verdade é que Djokovic permanece no país e foi incluído no sorteio da 1ª ronda do Open.
Aproveitando o timing de toda esta polémica, o zerozero esteve à conversa com Nuno Reis, central formado no Sporting, que é um de dois portugueses a atuar na A-League, o principal escalão do futebol australiano. O defesa português de 30 anos está a cumprir o seu segundo ano ao serviço do Melbourne City, clube que foi campeão australiano em 2020/21 e que pertenço ao mesmo grupo do Manchester City e falou-nos um pouco da sua experiência na Austrália.
Atendeu-nos com as filhas a falar como barulho de fundo e cedo as duas jovens surgiram como tema de conversa. Foi há cerca de um ano que Nuno Reis foi anunciado como reforço do Melbourne City e explicou-nos o que leva um jogador com mercado a querer ir para «o outro lado do mundo»: «Foi na altura em que começou a covid-19 e o Levski Sofia (Bulgária) - onde atuava - estava a passar por dificuldades financeiras, sem pagar os salários. Rescindi com eles, voltei para Portugal e fiquei sem clube alguns meses e fomos analisando as melhores opções. Cheguei a receber ofertas de Portugal. Acabou por ser uma questão de tempo. Falei com o meu empresário e disse que podia ir para qualquer lado do mundo. Quando surgiu esta oportunidade, o representante do grupo City entrou em contacto comigo, perguntou o que achava e eu fiquei contente. Ainda por cima um clube com o grupo City por trás, é fácil imaginar a grandeza, organização e a nível de condições que são excelentes.»
«Além do clube estar já bastante organizado e ter a mentalidade do grupo City envolvida no clube, acho que estão sempre um passo à frente. Para tudo o que precisamos, seja a nível do jogador, seja a nível da sua vida pessoal e da sua família, estão sempre lá. É um clube familiar, que se preocupa com o bem-estar da nossa família, porque sabe que se a nossa família estiver bem, os jogadores automaticamente também vão estar melhor mentalmente», acrescenta.
«Vir para o outro lado do mundo não é uma decisão fácil, ainda para mais com duas filhas pequenas, mas acho que foi o passo certo, até porque ao nível da educação este é o melhor país do mundo e elas estão bem. A adaptação para elas também foi rápida. Sinto-me em casa aqui. As minhas filhas também. A minha filha mais velha já vai para o 2º ano e adaptou-se rapidamente, felizmente. Não tiveram dificuldades em adaptar-se, até porque na Bulgária já tinham andado numa escola internacional e aprenderam a falar inglês, o que ajudou que aqui estivessem logo mais à vontade», explica-nos.
Apesar da Austrália ser um país onde os desportos-reis são o râguebi, o cricket e o footy - é o futebol australiano, o desporto mais importante do país -, Nuno Reis confessa que ficou «surpreendido» com o futebol praticado naquele país da Oceânia, afirmando que o «campeonato tem crescido de forma brutal nos últimos anos.
Nuno Reis 4 títulos oficiais |
«Quando cheguei aqui foi na altura do final do lockdown e passados uns meses apareceram dois ou três casos e as pessoas foram proibidas de sair do Estado de Victoria. Aqui cada estado tem um género de presidente, à qual eles chamam de "premier", portanto cada Estado tem as suas próprias regras. Há Estados que são mais liberais e há outros que não. Basicamente com esta situação da covid-19 temos mesmo que viver um dia de cada vez, porque hoje está tudo bem e amanhã já não somos autorizados a sair do Estado de Victoria», começou por dizer.
«Nós por acaso conseguimos sempre treinar todos juntos porque o premier de Victoria deu-nos à equipa toda isenção de poder trabalhar. Portanto se a polícia nos mandar parar somos obrigados a mostrar o passaporte e a isenção. Caso contrário, se a polícia nos apanhar na rua as multas são pesadas e chegam a ser de 300/400 dólares. É uma questão cultural», concluiu sobre esta temática.
Embora seja um campeonato em crescimento, há apenas dois portugueses que lá atuam e as equipas são, na sua vasta maioria, compostas por jogadores australianos. O outro atleta luso que atua na A-League é o também central Roderick Miranda, ex-Benfica, que atua no Melbourne Victory, nada mais, nada menos que o rival do Melbourne City.
«Os jogos são muito imprevisíveis. As equipas são difíceis de jogar, são fisicamente muito fortes e gostam de jogar fechadinhas. Nós tentamos implementar outro estilo e por isso é que às vezes somos surpreendidos. Acho que nos últimos anos o jogador australiano tem aumentado de qualidade e se formos a ver são vários os casos de jogadores que fazem um ano de profissional na A-League e automaticamente dão o salto para outras ligas. O mais natural é irem para Inglaterra ou Escócia, mas são vários os jogadores de 19, 20 anos a irem para os campeonatos europeus. Se calhar antigamente olhávamos para aqui e pensávamos que era só bola para a frente e fé em Deus, mas agora já se nota as equipas bem estruturadas e organizadas a nível tático pelos seus treinadores, vemos jogadores tecnicamente evoluídos», descreve-nos.
Chegou ao Sporting com apenas 12 anos, em 2003, e por lá ficou até aos 24 - pelo meio esteve emprestado ao Cercle Brugge, da Bélgica, e ao Olhanense. Era visto como uma das grandes promessas da formação leonina, capitaneou equipas dos vários escalões e até à equipa B, mas nunca se estreou pela equipa principal em jogos oficiais. Admite que gostava de ter tido essa oportunidade, mas que não guarda mágoa e agradece por todos os momentos.
«A única mágoa que qualquer jogador que passa pela Academia tem é não representar a equipa principal. Gostava de ter tido essa oportunidade, fiz tudo o que podia, mas não surgiu e não guardei mágoa nem nenhum por fazer. Mas se olharmos para a realidade há 15 anos era muito diferente. A mentalidade era diferente, o orçamento dos clubes era maior e olhavam em demasia para o jogador estrangeiro, quase sempre antes de olhar para o jogador português. Em muitos países por onde passei não era assim, a prioridade era sempre o jogador da formação. Tive a sorte de participar em muitos treinos. Ganhei experiência, trabalhei com grandes jogadores como o João Moutinho, Liedson, Derlei», conta.
Contudo, sete anos depois de terminar a ligação aos leões, admite que ainda os acompanha e mostra-se muito feliz pelo sucesso que a formação de Alvalade alcançou ao longo dos últimos anos. Nuno Reis diz mesmo que já «fazia falta» o «verdadeiro Sporting.»
«Finalmente conseguimos o verdadeiro Sporting. Já cá fazia falta há muito tempo e não estou a dizer apenas por terem sido campeões e estarem a vencer os jogos todos, mas mais pela estabilidade que o clube neste momento apresenta. Está com um presidente e uma estrutura estável. O treinador e os jogadores confiam uns nos outros a 200% e podemos dizer que a Academia finalmente está a ser a primeira aposta na equipa principal, em vez de olharem primeiro para fora. A mentalidade tem de ser esta, de apostar nas joias da casa. O Sporting está a fazer um grande campeonato e merece. Já fazia falta», conclui.