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    Spartak Moskva

    Texto por Francisco Paulo Carvalho
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    Fundado em Krasnaya Presnya, um bairro operário situado no centro Moscovo, o Spartak Moskva nasceu a 18 de abril de 1922, pelas mãos de um conjunto de jovens jogadores, onde se destaca Nikolai Petrovich Starostin, um antigo jogador de futebol e de hóquei em patins soviético e principal responsável pela evolução do clube nos primeiros anos.  Ele e os seus três irmãos – Alexander, Andrei e Peter - são considerados o coração e a alma do nascimento do Spartak e ainda hoje têm estátuas suas dentro do estádio.

    Contudo, inicialmente, esse não era o seu nome de nascimento e o Spartak era, na verdade, o «Krasnaya Presnya», batizado com o nome do local onde nasceu.

    Nascido numa região de trabalhadores operários, com uma série de fábricas e favelas e com a má fama de ser uma zona perigosa, com muito crime e violenta, o Krasnaya Presnya nasceu para alimentar a paixão pelo desporto das classes mais baixas e pobres da sociedade soviética da altura.

    A ideologia fundadora do clube baseava-se naquilo que era chamado de “futebol marginal”, ou seja, aquele praticado por jovens trabalhadores, que não tinham acesso aos campos desportivos das elites e que jogavam futebol em qualquer espaço que estivesse disponível nas ruas. Essa autonomia e espontaneidade encontrada nos jovens trabalhadores do povo são, ainda hoje, consideradas as verdadeiras ideologias do Spartak.

    O Krasnaya Presnya era, portanto, o clube do povo e desde cedo surgiu como o principal opositor ao CSKA Moskva, o outro clube da cidade e com ligações ao famoso Exército Vermelho – exército e força aérea da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) – e ao Dínamo Moskva, próximo da NKVD (polícia secreta russa). Durante os primeiros anos estas ligações causaram alguns constrangimentos ao novo clube de Moscovo, uma vez que surgia como uma organização que desafiava as instituições autoritárias da severa União Soviética.

    Nikolai Starostin, o "pai" do Spartak
    Pelo meio, o Krasnaya ainda passou a chamar-se de «Pischeviki», mas em 1935 surgiu finalmente o nome «Spartak», inspirado em Spartacus, o lendário gladiador de origem trácia que viveu na República Romana entre 109 a.C. e 71 a.C. e liderou a célebre revolta dos escravos na Roma Antiga contra o Império Romano, conhecida como a «Guerra dos Escravos» ou «Guerra dos Gladiadores». A autoria do seu nome, assim como do logótipo que chegou até aos dias de hoje, é atribuída a Nikolai Starostin. Tudo isto, antes de Starostin ser alvo de perseguições por parte do regime comunista por tentar arrastar os costumes burgueses para o desporto soviético, até então reservado para as elites.

    No ano seguinte, o Spartak conquistou pela primeira vez na sua história o campeonato da União Soviética, estabelecendo-se definitivamente como um dos maiores clubes daquele país e recebendo mesmo a distinção com a «Ordem de Lenin», na altura considerada a maior condecoração do país e o equivalente a receber uma medalha de herói. Era concebida após a conquista de um grande ou único feito.

    O Spartak não ficaria por aqui e antes da Segunda Guerra Mundial despoletar um pouco por todo o mundo, com a URSS a ter um papel direto na mesma, ainda venceria mais dois campeonatos, de 1938 e 1939, ao qual juntou duas Taças Soviéticas, reforçando a sua afirmação.

    Vida de glória pós-Guerra

    Depois do final da Grande Guerra, em 1945, o futebol voltou ao ativo na União Soviética e o Spartak venceu duas Taças Soviéticas ainda nos anos 40, aumentando o seu crescente palmarés. No entanto, foi nos anos 50, ainda presidido por Starostin, que o Spartak mais cresceu a nível desportivo.

    No total foram quatro campeonatos (1952, 1953, 1956 e 1958) e mais duas Taças da URSS (1956/57 e 1957/58). Além disso, nos anos em que não conquistou ou o campeonato ou a Taça, esteve sempre a batalhar com o CSKA e o Dínamo, ficando regularmente em 2º lugar ou sendo finalista vencido. O nome Spartak era, por esta altura, uma certeza no panorama desportivo russo.

    Além disso, o Spartak começou a ser um dos principais “fornecedores” para a seleção soviética, disponibilizando dez jogadores para a equipa que se sagraria campeã olímpica em 1956, nos Jogos de Melbourne, Austrália - vitória por 0x1 frente à Jugoslávia. A nível individual, o principal destaque era Nikita Simonian, um avançado original da Arménia, que se naturalizou soviético e se tornou o maior artilheiro de sempre do Spartak. Outro grande nome do clube era o médio Igor Netto, um dos melhores jogadores do mundo da época e que ficou no clube entre 1949 e 1966.

    Na década de 60 o maior poderio do Spartak diminuiu um pouco, mas isso não impediu o clube de bairro de Moscovo de voltar a sagrar-se campeão soviético em 1962 e 1969 e de vencer mais duas Taças da URSS, em 1962/63 e 1964/65.

    A tempestade antes da bonança

    Depois desses dois últimos títulos e com a entrada na década de 70, o Spartak Moskva entrou na pior fase da sua história. Em 1970/71 ainda venceu a Taça da URSS mais uma vez, mas a partir daí foi sempre a descer a nível desportivo, culminando com a descida ao segundo escalão do futebol russo em 1976.

    O dia da descida ficou marcado como um dos mais tristes da história do Spartak. No encontro decisivo, o Spartak precisava de vencer o Dínamo Kyiv para garantir a manutenção, enquanto o Dínamo precisava de vencer para ser campeão, mas acabaram empatados. Para esse encontro, a polícia soviética limitou o número de bilhetes disponíveis para a claque do Spartak, que se fez comparecer com menos de 500 pessoas, em contraste com o estádio cheio do Dínamo.

    Raivosos pela perda do título, os adeptos do Dínamo invadiram o setor da equipa russa. A polícia e um grupo de adeptos, das duas equipas, mais sensatos ainda se juntaram para formar um escudo e proteger os adeptos do Spartak, mas isso não impediu que três deles fossem mortos e centenas dos presentes no estádio se ferissem com gravidade.

    Por estranho que pareça, essa descida de divisão aproximou ainda mais o Spartak da sua massa adepta, que esteve ainda mais presente a partir do momento em que o restrito regime soviético – que continuava com ligações ao CSKA e ao Dínamo – negou qualquer tipo de apoio aquele que já era definitivamente um dos clubes mais importantes e históricos do país.

    Com Vasiliy Kalinov como estrela maior da equipa e sob o comando do técnico Konstantin Beskov, o Spartak esteve apenas um ano na Segunda Divisão e logo na sua primeira temporada de regresso à elite do futebol soviético conquistou novamente o campeonato da URSS, onde se destacou e muito o contributo de Fyodor Cherenkov, uma das maiores estrelas do futebol soviético na altura, que se viria a tornar o recordista de jogos ao serviço do Spartak, com 499 partidas disputadas, ou Oleg Romantsev e Rinat Dasayev.

    Domínio outsider da URSS

    Apesar da conquista desse título e do rápido regresso à elite do futebol soviético, os anos 70 e 80 foram marcados pelo domínio de equipas fora de Moscovo no campeonato soviético. Face à imensidão da URSS, eram várias as equipas que entravam no campeonato que, hoje, pertencem a outros países.

    Os anos 70 já não tinham sido de feição para o Spartak, que apenas tinha conseguido conquistar dois títulos e tinha mesmo descido de divisão, mas os anos 80 foram aqueles em que o clube de Moscovo mais tempo esteve sem conquistar qualquer título e apenas voltou a celebrar dois campeonatos da URSS em 1987 e 1989. Neste último, foi comandado pelo mesmo Oleg Romantsev que anos antes tinha sido peça fundamental no título de campeão soviético, em 1979, como jogador.

    Contudo, durante estes anos quem mais cresceu foi o Dínamo Kyiv, que pertencia ao território ucraniano, outrora pertencente à URSS, e igualou o Spartak em número de campeonatos soviéticos, dominando nessa altura a nível interno.

    Além do Dínamo Kyiv, outras equipas que hoje pertencem a outras países, na altura pertencentes à União Soviética, foram variando entre si a conquista dos títulos, como o Dnipro (Ucrânia), Dinamo Minsk (Bielorrússia), Dinamo Tbilisi (Geórgia), Torpedo Zhodino (Bielorrússia) ou até o Shakhtar Donetsk (Ucrânia).

    Anos de glória após a queda da URSS

    A dissolução da URSS deu-se a 26 de dezembro de 1991 e com ela deu-se a declaração de independência das várias antigas repúblicas que pertenciam à União Soviética. Isto levou a quem também o campeonato soviético se desmantelasse e levasse à criação de campeonatos referentes aos vários novos países que na altura se formavam.

    Na nova Rússia, nascia a Premier League russa em 1992 e, com ela, a melhor época de sempre do Spartak. Desde esse ano e até 2001, o Spartak conquistou todos os títulos de campeão nacional russo que havia para ganhar com a exceção de um (Spartak Vladikavkaz venceu em 1995), ao qual juntou ainda duas Taças da Rússia (em 1993/94 e 1997/98). Tudo isto ainda sob o comando de Romantsev.

    A nível internacional, o Spartak falhou em conquistar qualquer galardão, mas ganhou bastante nome entre os seus pares, destacando-se a sua grande campanha na Liga dos Campeões de 2000/01, onde caiu apenas na 2ª fase de grupos da prova, depois de ter ultrapassado o Sporting e o Bayer Leverkusen na 1ª (na altura a prova era composta por duas fases de grupos e só depois a fase a eliminar) e as suas performances na Taça das Taças de 1993 e na Taça UEFA de 1998.

    Da queda à atualidade

    Depois de uma década de 90 absolutamente dominadora a nível interno, a viragem do século trouxe uma realidade bastante distinta para o Spartak e prova disso foi a longa seca que chegou depois da conquista da Taça russa em 2002/03.

    A partir dessa conquista, o Spartachi – como também é conhecido – esteve 15 anos afastados das conquistas e o melhor que conseguiu fazer nesse período a nível interno foi ficar em 2º lugar em 2006/07, 2007/08, 2009/10 e 2011/12. Contudo, foi um período de grande instabilidade, onde também terminou em 8º, 9º ou 10º por algumas ocasiões.

    Quem beneficiou desta cadência do Spartak foi o rival CSKA Moskva e o Zenit, um velho adormecido que cresceu de forma exponencial no século XXI e conquistou sete títulos de campeão nacional desde 2007/08.

    Glória voltou em 2016/17 @Spartak
    Contudo, em 2016/17, depois de uma temporada em que terminou em 5º lugar na Premier League russa, o Spartak voltou à glória tão aguardada e voltou a sagrar-se campeão russo pela 10ª vez na sua história, comandado pelo italiano Massimo Carrera. Nesse ano, a formação russa contava com grandes nomes no seu plantel, como os brasileiros Luiz Adriano, Fernando ou Maurício (ex-Sporting), ou  os ex-Benfica e FC Porto Lorenzo Melgarejo e Zé Luís e ainda o holandês Quincy Promes.

    A luta pelo título foi intensa praticamente até ao fim, mas o Spartak acabou por conseguir superiorizar-se ao Zenit e ao CSKA e terminar o campeonato com 69 pontos, mais oito e nove que os seus adversários diretos. Regressou, assim, à Liga dos Campeões no ano seguinte, 2017/18, embora tenha sido eliminado na fase de grupos. Além disso, conquistou em 2017 a Supertaça russa, batendo o Lokomotiv por 2x1.

    Desde aí, voltou a estar arredado da luta pelo título e o melhor que conseguiu foi um 2º lugar em 2020/21, embora nessa época tenha terminado a oito pontos do campeão Zenit. Já em 2021/22, os dirigentes do clube apostaram em Rui Vitória para comandar a equipa, o primeiro treinador português do Spartak em 100 anos de história.

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