Durante dois anos, quando voltou da Escócia após experiência no Rangers, Fábio Cardoso teve a orientá-lo João Henriques. Na altura no Santa Clara, o agora reforço do FC Porto conseguiu não apenas a afirmação total na liga portuguesa, mas também o estatuto interno de ser um dos líderes da equipa, que se tem cimentado desde então. E foi com o treinador, que agora está no Moreirense, que o zerozero foi conversar para saber um pouco mais do novo jogador portista.
Desde logo, uma garantia: o passado ficou para trás, o futuro é de ambição. E, no que se pode chamar «um jogador à Porto» (João Henriques detalha porquê), não vai faltar entrega e dedicação, para que, seja no imediato ou durante a temporada, a sua oportunidade no onze chegue e seja agarrada.O novo camisola 2, que assinou por cinco temporadas, terá custado cerca de 2,2 milhões de euros e vai ter de lutar com Pepe, Mbemba e Diogo Leite por dois (ou três) lugares no centro da defesa. Num sistema ou noutro, o português está familiarizado. Na equipa... também já deve estar entrosado. Pelo menos a avaliar pelas características descritas pelo seu antigo treinador.
Zerozero: Este salto já há algum tempo se justificava?
João Henriques: Logo no final da primeira época, que foi muito boa, coletiva e individualmente, ainda por cima por ele ter sobressaído muito nos esquemas táticos ofensivos [n.d.r.: marcou seis golos], em que ele fez muitos golos, para um central, isto para além do seu rendimento. Nessa altura, já se justificava. Não aconteceu, se tivesse acontecido creio que ele agora já estaria pronto para outro passo a seguir.
ZZ: Há sempre a questão emocional, pelo passado no Benfica e a forma algo desconfiada como os adeptos do FC Porto olharam para esta contratação. Ele tem as características necessárias para lidar com isso da melhor maneira?
JH: O Fábio é muito estável emocionalmente. É um extraordinário profissional, que obviamente sabe o que foi o seu passado, mas também o presente. É muito inteligente, sabe estar no futebol e lidar com este tipo de pressão. Não tenho dúvidas nenhumas que, apesar desta pressão e desconfiança, ele vai ultrapassar isso com facilidade e vai conquistar os adeptos no jogo. É um jogador muito à imagem do FC Porto e das ideias de Sérgio Conceição.
ZZ: Em que sentido?
JH: É um jogador muito agressivo, muito competitivo, que treina e joga da mesma forma e que, depois, dá tudo pela camisola que veste. É daqueles jogadores que, como dizemos na gíria, metem a cabeça onde a maioria não mete o pé. Já tem várias marcas de cabeça aberta, de pontos levados... é o Fábio Cardoso, não vira a cara a luta, cada lance é um duelo para vencer. É o tipo de jogadores que o FC Porto gosta: campeões, guerreiros, lutadores, gente abnegada em cada situação. É um jogador que conquista logo no primeiro treino. Vai conquistar o balneário no primeiro treino, o treinador já o terá conquistado, porque o levou para lá, e a seguir vai conquistar os adeptos. É a imagem de marca que ele tem, a sua competitividade, com e sem bola, mas sempre muito honesto com o jogo. Tudo o que lhe é pedido, ele cumpre à risca com o maior profissionalismo, e é isso que se pede a um jogador. Vai ter o rendimento esperado, não tenho dúvidas.
ZZ: Ele tem uma concorrência forte, com Pepe, Mbemba, Diogo Leite, e já se sabe que Sérgio Conceição não dá a titularidade de caras, sem que os jogadores lutem por ela. Ele tem características para também saber esperar, se for caso disso?
JH: Sim. Acima de tudo, é um grande profissional, não é um jogador que atire a toalha ao chão por não conseguir a titularidade. Vai é dar dores de cabeça ao treinador e fazer com que os colegas tenham de andar muito para conseguirem ter a titularidade. E, não sendo opção, é garantido que vai estar de fora a apoiar e a torcer para que os colegas consigam. É um homem de H grande, com bons princípios e valores, daquele tipo de jogador à antiga, que não precisa de assinar nada, que basta dar a palavra e está o decreto assinado.
ZZ: Confiou nele para jogar e para capitanear a equipa no Santa Clara. Que tipo de pessoa é dentro do grupo?
JH: Tem de tudo um pouco, é um verdadeiro líder nato e um exemplo como treina e como trabalha; e depois tem a capacidade de levar as pessoas para um lado mais descontraído e brincalhão, porque participa nas brincadeiras e cria o ambiente. Quando é para trabalhar, trabalha, quando é para brincar, sabe entrar nesses momentos tão importantes no balneário. É alguém que sabe dosear e estar no lugar dele, que sabe respeitar e que é muito respeitado.
ZZ: Na apresentação, ele falou de desejar este salto há algum tempo. Isso era algo que fazia parte das conversas que teve com ele? Como é que ele se comportava com essa relação presente/futuro?
JH: O Fábio é extremamente ambicioso. Um dos compromissos que tinha com os meus jogadores era o defender o clube para que, com isso, saíssemos valorizados. Sabíamos disso, pois seríamos nós os maiores beneficiados, e ele tinha essa consciência. Logo na primeira época, começaram a abrir-se portas mais acima, a falar-se de hipóteses para ele. E aí ele cresceu ainda mais. Desestabilizou-se um bocadinho emocionalmente, perdeu um pouco o foco perante a hipótese de sair, a porta que ele tinha em mãos acabou por fugir entre os dedos e a janela de mercado fechou. Ele aprendeu e, no segundo ano, disse-me 'aprendi com o erro do ano passado, nunca mais vai voltar a acontecer'. É um rapaz que aprende muito facilmente, a partir dali ele esteve sempre focado em todas as janelas de mercado, nunca mais aconteceu. Ele sabia que o rendimento dele abrir-lhe-ia as portas, mais cedo ou mais tarde. Está onde está porque aprendeu e, continuo a dizer, esta entrada só peca por tardia, pois há dois anos já estava preparado para este nível.