Depois da paragem para os compromissos internacionais, eis que este fim-de-semana está de regresso o futebol de clubes e com isso está também de regresso uma das melhores, senão mesmo a melhor, liga do mundo, a Premier League.
Como o principal escalão do futebol inglês já habituou os adeptos, é quase certa a existência de jogos entre grandes equipas todas as jornadas e nesta, a 9ª da Premier League, haverá um sempre escaldante Tottenham x Manchester City, dois dos maiores clubes do futebol britânico e do mundo.
Além de ser um confronto entre candidatos aos lugares cimeiros da tabela classificativa, senão mesmo ao título, e de contar com vários jogadores portugueses - Gedson Fernandes do lado dos londrinos e Rúben Dias, João Cancelo e Bernardo Silva do lado dos cityzens - este jogo marcará o sempre escaldante reencontro entre dois dos melhores treinadores do mundo, e talvez de sempre: José Mourinho e Pep Guardiola.
Conhecidos pelos seus grandes feitos - juntos têm um total de 55 títulos, 30 para Guardiola e 25 para Mourinho, incluindo quatro Ligas dos Campeões - o português e o espanhol criaram ao longo dos anos uma espécie de rivalidade entre os dois nos últimos anos fora das quatro linhas. Feitas as contas, ao longo da sua carreira, os dois treinadores já se defrontaram um total de 23 vezes, sendo que Guardiola vai com alguma vantagem, tendo vencido 10 desses duelos, enquanto Mourinho venceu seis e empataram as restantes sete vezes. Mas, afinal, como nasceu esta grande rivalidade?
Parece quase saído de uma série de televisão, de um livro ou de um filme, mas a verdade é que a relação entre Mourinho e Guardiola nem sempre foi assim. A primeira vez que a dupla da Península Ibérica conviveu em termos profissionais foi na época de 1996/97.
Nesse ano, o mítico treinador inglês Bobby Robson assumiu o comando técnico do Barcelona e com ele veio José Mourinho, que assumiu o cargo de treinador-adjunto - primeiro até foi tradutor, mas mais tarde assumiu outras funções. Nessa altura, o plantel dos catalães contava com várias estrelas do futebol mundial, incluindo Luís Figo, Hristo Stoichkov, Ronaldo, Fernando Couto e, nada mais nada menos, que um jovem de 26 anos chamado Pep Guardiola.
Hoje em dia, existem várias imagens dos dois em momentos de maior proximidade, a falarem antes ou durante os treinos, mas a principal prova de intimidade entre os dois seria mesmo nas celebrações após a conquista da Taça das Taças em 1997, num abraço longo e entusiástico captado pelas câmaras na altura.
Mais tarde, em 2011, numa entrevista, o espanhol abordou essa mesma relação dos tempos do Barcelona, afirmando que «não foi bem amizade, mas uma relação profissional», não dando assim tanta importância a essa relação. Também Mourinho reviveu esses tempos anos depois, referindo que guarda uma foto desse famoso abraço e contrariando o seu agora colega de profissão, dizendo que eram «próximos». «O José sempre reconheceu que o Pep era importante no clube. Ele pensou 'Tenho que me dar com ele, tenho que conhecê-lo'. E foi isso que ele fez, eles eram bastante amigáveis um com o outro», contou Bobby Robson.
Apesar da estadia do treinador inglês na Catalunha apenas ter durado essa temporada, Mourinho continuou por lá no decorrer de quatro temporadas, sempre enquanto treinador adjunto, até que no ano 2000 iniciou a sua carreira de treinador principal, em Portugal, e se começou a destacar, especialmente no comando do FC Porto - onde venceu uma Liga dos Campeões, uma Taça UEFA, dois campeonatos, uma Taça de Portugal e uma Supertaça.
O seu sucesso levou-o para o Chelsea, onde continuou a brilhar e, em 2008, foi entrevistado, em Lisboa, para substituir Frank Rijkaard no comando do Barcelona, pelo que tudo apontava o regresso aos balugranas. A confiança de Mourinho no regresso a Espanha era tal, que até pretendia que Guardiola, na altura treinador da equipa B, subisse a seu adjunto. Aliás, o próprio espanhol recomendou o seu antigo treinador para o lugar.
Por isso mesmo foi tal a surpresa quando foi anunciado pelos dirigentes catalães que o escolhido para o lugar era Pep Guardiola. Mais tarde, veio-se a saber que um dos principais responsáveis por tudo foi Johan Cruyff. A antiga lenda do futebol holandês e mundial deixou clara a sua opinião de que Guardiola era a melhor opção e convenceu os dirigentes do clube. Embora Mourinho possa negar, a rejeição foi um golpe duro, que teve impacto permanente na relação do português com o clube e com Guardiola. Era a prova de que realmente é amigos, amigos, mas negócios à parte.
A estadia de Guardiola em Barcelona enquanto treinador foi, como hoje se sabe, lendária. Além de ter implementado o famoso tiki-taka, conquistou tudo o que havia para conquistar e levou mesmo a que muitos apelidassem aquela equipa como uma das melhores de sempre.
Enquanto o Barcelona de Pep procurava o domínio no futebol, o seu mais recente rival foi para Itália, comandar o Inter de Milão. Depois de na primeira temporada ter conquistado a Serie A, na seguinte chegou a hegemonia dos nerazzurri, com a conquista do campeonato, Taça de Itália e da Liga dos Campeões. Embora aquela final frente ao Bayern Munchen, em que venceram por 0x2, seja por si só já marcante, o que mais ficou na retina até foi mesmo a fase anterior da competição.
Nessas meias-finais, o Inter de Mourinho ultrapassou esse lendário Barcelona de Guardiola com uma vitória no agregado das duas mãos por 3x2 e o português, irreverente como sempre, não escondeu a felicidade por essa vitória. «Eles iam ter mais bola que nós, muito mais, obviamente», admitiu Mourinho anos mais tarde, numa análise tática ao jogo, «eles moviam a bola sem nos ferir, e nós só tínhamos que ser mentalmente fortes para assumir isso. Eles que tenham a bola, mas que não criem ocasiões».
Depois de conquistar o mundo do futebol com o Inter e de ter vencido o primeiro round frente ao seu rival, José Mourinho aceitou o convite do Real Madrid, que, na altura, tinha dificuldades em superar o seu eterno rival, fosse no campeonato espanhol, fosse a nível internacional.
Já em Espanha, Mourinho esteve três temporadas, onde dividiu os holofotes com Guardiola nas duas primeiras - na terceira o treinador espanhol decidiu tirar um ano sabático e esteve sem clube. A primeira época nos merengues foi complicada e o técnico português apenas conseguiu vencer a Copa del Rey, mas a segunda trouxe muito suor, sangue e lágrimas, especialmente nos duelos entre as duas equipas e Mourinho conseguiu levar a melhor no campeonato e na Supercopa de Espanha - pode relembrar melhor esse intenso confronto em Espanha aqui.
Mourinho, sempre fiel a si mesmo, nunca deu a parte fraca perante o seu rival e por várias vezes, sempre sem referir nomes específicos, foi deixando várias farpas relativas ao estatuto e arrogância catalã de achar que mais nenhuma maneira de jogar futebol era igualmente legítima em comparação com o aclamado tiki-taka. O português acusava mesmo o Barcelona de simular faltas e pressionar árbitros para que lhes favorecessem.
«Eu nunca tentei esconder as minhas falhas. Há gente mais inteligente que eu, que tenta vender uma imagem diferente da minha, mas que na verdade é igual a mim», afirmou a certo ponto. «Se for verdade que somos parecidos, então está na hora de eu reavaliar o meu comportamento», replicou Guardiola. Estava aqui intensificada esta rivalidade.
Depois desse segundo round em Espanha e de um ano sem Pep Guardiola no futebol, o espanhol rumou ao Bayern Munchen. Ditou o destino que a temporada 2013/14 ditasse logo um reencontro entre os dois. O Chelsea havia vencido a Liga Europa na temporada anterior e o Bayern a Liga dos Campeões, o que fazia com que as equipas se encontrassem na Supertaça Europeia de 2013. O jogo foi do mais equilibrado possível e cheio de intensidade e foi mesmo necessário ir até às grandes penalidades para decidir quem venceria este round de Mourinho vs Guardiola. No final, acabou mesmo por ser o treinador dos alemães a vencer por 5x4 nos penaltis.
Seguiram-se dois anos sem qualquer confronto entre os dois treinadores. Enquanto logrou ser campeão inglês novamente, em 2014/15, o outro comandou o Bayern Munchen, onde voltou a dominar o futebol a nível interno - na Liga dos Campeões os bávaros nunca conseguiram passar das meias-finais sob o comando de Guardiola.
Na época 2016/17, o Manchester City trouxe Pep Guardiola para o comando da equipa por forma a atacar a hegemonia do futebol inglês definitivamente e de uma forma quase poética os rivais dos cityzens, o Manchester United, trouxeram o rival do espanhol para o seu comando. Falamos obviamente de Mourinho. Estava montado o palco para aquele que seria o quarto round deste fervoroso confronto.
Nessa temporada, os dois técnicos fizeram umas «tréguas improvisadas» à boleia da grande competitividade do futebol inglês, com o português a assumir que seria imprudente valorizar excessivamente essa rivalidade, uma vez que as restantes equipas de topo do futebol inglês poderiam aproveitar isso mesmo para se distanciarem.
No entanto, a rivalidade entre os dois e a rivalidade dos dois clubes de Manchester combinaram para um clima mais tenso naquela cidade de Inglaterra e levou mesmo a que fossem chamados 400 polícias quando, logo à 4ª jornada da Premier League, as duas se defrontaram - o City venceria em Old Trafford por 1x2.
Por mais intensa que a rivalidade fosse, a verdade é que o City de Guardiola acabou em 3º lugar no campeonato, nove pontos acima do 6º classificado, o United de Mourinho. No entanto, Mourinho venceu a Liga Europa, a Supertaça e a Taça de Inglaterra, parecendo que estava a sair por cima face ao seu rival.
Perante isso, o City investiu (e bem) na sua equipa e acabou a sagrar-se campeão inglês na época seguinte - ao qual juntou a Taça de Inglaterra - voltando a vencer a Premier League quatro anos depois. Se ser campeão não era suficiente para adoçar Guardiola e os adeptos e dirigentes do City, em segundo lugar ficou o Manchester United de Mourinho, com uns impressionantes 19 pontos a menos. Estava refeita a igualdade entre os técnicos em Inglaterra.
Curiosamente, tem sido o Liverpool de Jurgen Klopp quem se tem vindo a destacar desde aí. Contudo, os confrontos entre Guardiola e Mourinho têm vindo a continuar e na temporada foi mesmo o português quem levou a melhor, ao vencer o City por 2x0, em jogo a contar para a 25ª jornada da Premier League.
O registo total dá vantagem ao técnico espanhol nos confrontos com o português ao longo das suas carreiras, mas a verdade é que nestas temporadas que ambos passaram em Inglaterra juntos, esses números têm vindo a ser mais equilibrados - embora os títulos possam dizer outra coisa.
Feitas as contas, em Inglaterra, os dois treinadores defrontaram-se um total de sete vezes, seis para o campeonato e uma para a Taça, com ambos a vencerem três vezes cada um e a empatarem outra. Quer isto dizer que o confronto deste sábado entre os dois será um desempate do confronto Mourinho vs Guardiola, pelo menos em Inglaterra. Conseguirá o português superiorizar-se ao seu rival ou aumentará o espanhol a sua vantagem global face ao Special One?
2-0 | ||
Son Heung-min 5' Giovani Lo Celso 65' |