Depois de Reggie Miller e antes de Steph Curry, a magia do lançamento de três pontos era de Ray Allen. Era este base quem, noite após noite, dava aos amantes da NBA um lançamento de execução perfeita, onde cada movimento do corpo servia apenas para uma coisa: Colocar a bola dentro do cesto, de preferência com um lançamento de três pontos.
Mas Ray Allen é muito mais que um atirador. Desde logo é alguém que tem dois anéis de campeão. No seu pico de forma era também um atleta capaz de jogadas espetaculares e, talvez o mais importante de tudo, Ray Allen é o autor do lançamento mais bonito, mítico e importante da história das finais da NBA.
O amor pela modalidade nasceu por dois motivos.. Primeiro porque, por volta dessa idade, teve o seu «pulo» na altura e depois porque o facto de ser diferente, mais recatado e ter vivido tanto tempo na Europa não permitiram ao jovem ter muitos amigos no liceu de Hillcrest. Por isso, dedicou-se totalmente a tornar-se o melhor jogador de basquetebol possível e isso notou-se dentro do campo. Levou a sua escola a vencer pela primeira vez a vencer a liga estatal, fazendo 25 pontos e 12 ressaltos na final.
Como não podia deixar de ser, recebeu várias propostas de universidades, acabando por passar três anos na Universidade do Connecticut. Nesse período tornou-se uma estrela, tendo sido eleito o jogador universitário do ano em 1995 e, na época 95/96, foi eleito o jogador da conferência Este. No seu último ano de universidade apresentou médias de 23,4 pontos por jogo, 6,5 ressaltos e ainda mais de três triplos convertidos por jogo. Naturalmente, a NBA bateu à porta e Allen decidiu não fazer o último ano de universidade, tornando-se profissional.
Entrou no draft de 1996 e foi escolhido na 5ª posição pelos Minnesota Timberwolves. Logo após ter sido escolhido pelos Wolves foi imediatamente trocado para os Milwaukee Bucks por Stephon Marbury, que tinha sido escolhido na 4ª posição do mesmo draft.
O impacto foi imediato, e Ray Allen jogou os 82 jogos da fase regular da temporada 96/97, 81 deles como titular. Os Bucks são uma das equipas com mais história na NBA, mas nos anos 90 atravessavam uma crise e quando Allen chegou, a equipa já não ia aos playoff há vários anos.
Depois de apresentar médias de 13,4 e 19,5 nos dois primeiros anos de NBA, a estreia nos playoff para Ray Allen veio na época 98/99. Nessa temporada, encurtada por lockout, os Bucks conseguiram contratar o experiente treinador George Karl e tinham no plantel jogadores como Sam Cassell, Tim Thomas, Glenn Robinson e, claro, Ray Allen. Apesar de uma eliminação «sem espinhas» na primeira ronda, contra os Indiana Pacers, percebia-se que os Bucks estavam ali para ser uma das melhores equipas do Este nos anos seguintes.
Foi na temporada seguinte que os Bucks atingiram o seu máximo como equipa. Chegaram à final de conferência, perdendo em sete jogos para os 76ers, de Allen Iverson. Ray Allen brilhou nos playoff, com médias superiores a 25 pontos. Apesar da derrota na final, os Bucks mostraram sempre ter mais soluções e tudo fazia prever que a temporada seguinte fosse mesmo da afirmação da equipa de Milwaukee, especialmente depois da aquisição do extremo/poste Anthony Mason. O certo é que tudo correu mal. Ray Allen teve alguns problemas físicos, falhando 13 jogos da fase regular, e a equipa nunca conseguiu entender-se da melhor forma em campo, falhando mesmo os playoff de forma surpreendente.
Depois do fracasso, vários jogadores pediram para sair da equipa, sendo que Ray Allen foi um deles. A meio da temporada 02/03, o base foi trocado para os Seattle SuperSonics, num negócio que levou Gary Payton para os Bucks.
Atentos à situação de Allen nos Seattle SuperSonics, mas também à situação de Kevin Garnett nos Timberwolves, os Boston Celtics conseguiram garantir os dois jogadores no mesmo verão, juntando-os a Paul Pierce e formando assim o primeiro big-3 da era moderna da NBA.
Aos 32 anos Ray Allen deixava de ser uma estrela sozinha em Milwaukee ou em Seattle e passava a ter outros dois all-stars ao seu lado. Isso fez o base mudar o seu jogo. Sem necessitar de ser o único obreiro de um ataque, Allen passou a ser um especialista. Passou a ser um jogador que jogava sem bola e que corria quilómetros para aparecer no sítio certo para lançar de três, dando a maior importância a Paul Pierce, Kevin Garnett e ao base Rajon Rondo na criação do ataque.
Esse papel assentou que nem uma luva a Ray Allen e os Boston Celtics passaram de ser a pior equipa da Liga em 06/07, para os grandes candidatos e eventuais campeões em 07/08. Na final, a primeira da carreira de Ray Allen, a equipa de Boston bateu os grandes rivais LA Lakers, de Kobe Bryant por 4 – 2. A importância do base nas finais foi extrema. Para além de defender durante grande parte do tempo Kobe Bryant, Ray Allen ainda foi essencial no jogo 4, jogando todos os 48 minutos da partida e ajudando à maior recuperação de sempre em finais. No jogo do título fez sete triplos (o máximo em finais) e, com 26 pontos, ajudou a equipa dos Celtics a vencer com tranquilidade os Lakers.
Tudo apontava para que a temporada seguinte fosse de mais domínio ainda para os Celtics, mas uma lesão em Kevin Garnett levou a uma eliminação na 2ª ronda dos playoff, antes do regresso às finais na temporada 09/10.
O base ainda esteve mais dois anos nos Boston Celtics, perdendo sempre nos playoff perante os Miami Heat. Nessa altura Miami tinha Lebron, Wade e Bosh e a rivalidade entre as duas equipas estava no ponto mais alto. As séries entre os dois conjuntos eram verdadeiras batalhas, especialmente em 2012, quando se encontraram na final da conferência Este.
Por isso, quando no verão de 2012 Ray Allen rejeitou renovar com os Celtics para assinar pelos Miami Heat, o jogador passou a ser visto como um traidor em Boston. A mudança deixou tanta irritação na equipa dos Celtics que, em 2018, quando o grupo celebrou os 10 anos do título, Allen não foi convidado. Mais tarde, o base veio explicar a sua decisão de sair da equipa verde, garantindo que a proposta que lhe foi feita, juntamente com o papel que lhe estava a ser pedido na equipa, mostrava que os dirigentes dos Celtics não queriam verdadeiramente contar com ele.
Em 2014 Ray Allen voltaria a estar presente nas finais, mas desta vez perdeu para os Spurs. No verão, com 39 anos e apesar de ainda ter algumas propostas para continuar, preferiu retirar-se da NBA, apesar de inicialmente ter afirmado que iria apenas fazer uma pausa de uma temporada.
Saiu da NBA com 24 505 pontos e dois anéis de campeão. Para além disso é, em 2020, ainda o jogador com mais triplos convertidos da história, com um total de 2 973. Conseguiu também uma medalha de Ouro nos Jogos Olímpicos de 2000 com os EUA . Em 2018 entrou no Hall of Fame do basquetebol.
Ray Allen foi quem pegou na tocha de Reggie Miller e a levou até à era-moderna, no que diz respeito ao lançamento de três pontos. O seu gesto de lançamento era visto como perfeito e, numa altura em que não era visto como a melhor arma, conseguiu transformar o lançamento de três numa arte.