Tiago Silva: «Não há contacto físico com os meus pais, não há um beijinho, não há um abraço, como de costume... É estranho»

O futebol parou por todo mundo devido ao surto de coronavírus e por todo o mundo há portugueses à espera de ultrapassar esta situação para voltarem a fazer o que mais gostam: jogar futebol.

Neste tempo em que o exigido é «ficar em casa», o zerozero foi conversar com vários portugueses espalhados pelos quatro cantos do Mundo para perceber como tem sido este período sem futebol e como têm acompanhado toda esta situação, lá fora e em Portugal. Sempre à distância, claro.

Da vizinha Espanha à longínqua Indonésia, o mote passa por ficar em casa e ler os relatos da rubrica: «O meu futebol em quarentena».

• Tiago Silva, médio do Nottingham Forest, de Inglaterra

zerozero (ZZ): Como tens ocupado o teu dia durante a quarentena?

Tiago Silva (TS): Felizmente, nós jogadores de futebol temos alguns privilégios. Tenho a sorte de viver perto de um parque e consigo correr sem meter em risco as outras pessoas. Treinar, quando consigo treino em casa. Mas também como não estava preparado para isto não tenho muitas coisas para treinar em casa. É mais à base de elásticos, pouco mais dá para fazer. Como fui operado (apêndice) e estive duas semanas sem fazer nada, agora estou a tentar recuperar a forma. Fisicamente estou péssimo. Nunca me senti assim. O único ponto positivo é a família. Vai estragar as férias, estamos sem competição e é para isso que trabalhamos, por isso o único ponto positivo é mesmo estar perto da família.

ZZ: Que indicações te deu o clube?

TS: Depois da operação ainda fiquei uma semana em repouso em Inglaterra e depois vim para Portugal quando me foi dada a autorização. Tive mais uma semana de repouso e só na semana passada é que comecei a correr mais a sério. É um clube super organizado. Fazem videoconferência com a equipa toda. Passaram plano de treino e de alimentação. Tudo. São super cuidadosos em relação a isso.

ZZ: Como é ficar tanto tempo em casa?

TS: É horrível. Passei muito tempo em Inglaterra sem vir a Portugal, por isso, quando cheguei, ainda estava feliz. Mas nunca achei que isto atingisse esta dimensão que está a ter. pensei: ‘vou ficar aqui mais uma semaninha, até me vai fazer bem’… Agora que estou a perceber que isto não vai arrancar tão cedo está a custar um bocadinho.

ZZ: Que conselhos deixas (livros, filmes, séries...)?

TS: Os conselhos que deixo é que sejam cumpridores, não saiam de casa, sigam as recomendações da Direção Geral de Saúde e para se divertirem passem tempo com a família, criem laços, alguns que foram perdidos… aproveitem. Nada acontece por acaso. Tudo é uma lição! Depois também têm Netflix, Playstation…

ZZ: Tens mantido contacto com os teus colegas?

TS: Temos alguns portugueses e um treinador português na equipa. Até temos um grupo de whatsapp só com portugueses e vamos falando lá. Sei que alguns estão cá em Portugal, mas outros estão lá. Não está a ser fácil para ninguém.

ZZ: Como tens acompanhado a situação em Portugal?

TS: O que me deixa mais tranquilo é que em relação a Espanha e Itália, países que estão aqui ao nosso lado, temos uma situação mais ou menos controlada. É preocupante porque a minha família tem muitas pessoas de risco. Fiquei feliz pela maneira como foi abordado o assunto em Portugal.

ZZ: Como está a situação em Nottingham?

TS: Eles inicialmente estavam um bocadinho como eu, na ignorância em relação à dimensão disto. Agora é que eles estão a perceber bem e estão a levar o assunto mais a sério. Quando estava lá e o vírus começou a espalhar, não eram muito cuidadosos. Achavam que lá não ia chegar. Agora já perceberam a gravidade e estão um bocado alarmados. Acabaram de declarar na semana passada 3 semanas de quarentena obrigatória e parece-me que ainda vai ser preciso mais tempo.

ZZ: Como contas regressar à competição? Tem sido fácil manter a forma?

TS: Tem sido muito complicado. Nem na pré-época me senti assim. Acho que também tem a ver com a intensidade e densidade de jogos que tive em Inglaterra. Nós lá jogamos três vezes por semana e parar assim de repente, depois operação, depois duas semanas de repouso, em que era a minha namorada que praticamente me fazia tudo, não é fácil… Voltei a Portugal ainda numa fase de recuperação e estou limitado ao terraço de casa e ao parque. A recuperação/treino não tem sido nada fácil.

ZZ: Quando isto acabar, qual é a primeira coisa que queres fazer?

TS: Felizmente, estou aqui perto da família. Se há coisa que valorizo é a família. É verdade que não posso estar diretamente com os meus pais, pois só os vejo para lhes entregar as compras. Não quero que saiam de casa, então faço as compras por eles e entrego-lhes em casa. É estranho. Não há contacto físico, 1 metro de distância deles, entrego o saco, pegam no saco... Não há um beijinho, não há um abraço como de costume. Vai ser isso que vou fazer quando tudo estiver normalizado.

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