Do «choque» da despromoção no Arouca ao póquer no dia do 28.º aniversário: «Sinto-me preparado para a Liga»

Depois de três temporadas na Segunda Liga, duas no Penafiel e outra no Arouca, com 29 golos pelo meio, Fábio Fortes acompanhou os arouquenses na difícil descida até ao Campeonato de Portugal. Tinha assinado com o sonho da subida e acabou no regresso ao terceiro escalão. Um «choque».

Fábio Fortes Campeonato de Portugal Série B 19/20

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18 golos em 25 jogos. Quatro no último jogo, no qual ainda assistiu para outros dois golos, num dia muito especial. Afinal, não era para menos. Fábio Fortes apontou o primeiro póquer da carreira no dia do seu 28.º aniversário e com um espetador muito especial nas bancadas.

A viver a melhor temporada da carreira em termos de números, o avançado ainda não desistiu do sonho de chegar ao principal escalão e garante estar «verdadeiramente preparado», nem de outro sonho de nome Cabo Verde.

©Catarina Morais / Kapta +

«Parar é morrer… E eu não queria morrer»

zerozero (ZZ): Quatro golos e duas assistências no jogo do último fim de semana, frente ao Ginásio Figueirense (9x0), e logo num dia muito especial. Conta-nos lá isso.

Fábio Fortes (FF): Foi um bom presente para mim próprio. [risos] Ainda por cima o meu pai esteve presente no estádio, algo que não é habitual. Ele vive em Lisboa e não é habitual ver os meus jogos. Mas fez-me essa surpresa.

ZZ: A verdade é que já tinhas batido o recorde pessoal de golos antes destes quatro golos. Como explicas este bom momento – 18 golos em 25 jogos?

FF: É um conjunto de coisas, sobretudo o bom trabalho da equipa. Os golos também vêm com a experiência e acho que esse é um dos fatores que tem influenciado o grande número de golos que tenho feito esta temporada.

ZZ: Sentes mesmo que a experiência acumulada é fundamental nesta fase da tua carreira?

FF: Sim, sim. Em relação aos outros anos, um pouco atribulados, penso que as coisas estão bem encaminhadas em termos individuais e coletivos. Portanto, acho que tem tudo para continuar a ser uma boa época.

ZZ: No mês passado até fizeste um golo de bicicleta… Explica-nos lá esse momento?

FF: Sensação única. Se pudesse fazer um golo daqueles todas as semanas era ótimo. [risos] Já tinha tentado várias vezes, mas dessa vez resultou. Este fim de semana tentei e não consegui. [risos].

ZZ: Tem corrido mesmo tudo bem…

FF: Como disse, devido ao bom momento da equipa e também individual, as coisas têm surgido naturalmente. Num avançado podem dizer o que quiserem, mas estamos lá para fazer golos. Fazer assistências também é bom, claro, mas o que eu quero mesmo é ajudar o Arouca a subir de divisão.

ZZ: Esta é a segunda época no Arouca, sendo que a primeira resultou na descida de divisão. Como é viver esta realidade e como é que foi processada essa mudança para o Campeonato de Portugal?

FF: Foi um choque para toda a gente, seja jogadores, treinadores, diretores ou mesmo para aquelas pessoas que acompanhavam o Arouca. Até há pouco tempo, o clube estava a jogar na Liga Europa… E a ganhar jogos contra os grandes. Sinceramente, assinei pelo Arouca com o intuito de subir de divisão e descer foi um choque e uma desilusão muito grandes. Não está nos planos de um jogador, na altura com 26 anos, descer de divisão da forma que foi. Tínhamos uma equipa muito boa, capaz de lutar por lugares muito melhores e ninguém estava à espera…

Fábio Fortes II Liga Portuguesa

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FF: Tem sido uma adaptação boa, apesar de no início ter tido algumas dificuldades. É um campeonato com muito valor, com jogadores com muito para dar, mas estamos a falar de uma realidade completamente diferente. Mas acho que os jogadores que ficaram no Arouca e aqueles que reforçaram a equipa, alguns deles com passado por divisões superiores, estão a adaptar-se bem e a remar para o mesmo lado. Agora, se me perguntasse no final da época passada, ou no princípio desta época, se queria disputar este Campeonato, eu diria que não, como é óbvio.

ZZ: Três épocas seguidas na Segunda Liga, boa média de golos e ainda com essa ilusão de subir à Liga. Como foi processar tudo?

FF: O sonho de qualquer jogador português é disputar a Primeira Liga e isso ainda não aconteceu comigo, apesar de ter assinado pelo Vitória SC, aos 19 anos. Não tenho nenhum jogo no principal escalão... Era um sonho. Queria estar num campeonato melhor, mas agora estou concentrado em fazer golos e em ajudar o Arouca!

ZZ: Mas admites um cenário onde o caminho mais fácil seria entrar numa espiral de desmotivação, não?

FF: Uma pessoa tem de se adaptar às circunstâncias. São coisas com as quais, muitas vezes, não convivemos muito bem, com essa mudança drástica de realidade, mas pronto… Acho que depois me fui mentalizando que isto tinha pernas para andar e que tínhamos equipa para lutar pela subida de divisão. Teve de ser assim. Tem de se fazer pela vida, parar é morrer. E eu não queria morrer.

©Vítor Parente / Kapta+

«Regresso aos profissionais é uma questão de tempo»

ZZ: E como é que foi a adaptação do Arouca? Como está o clube?

FF: Se forem ver o plantel reconhecem alguns jogadores. Alguns jogaram na Primeira Liga. Temos também um treinador com experiência em subidas de divisão. Temos um grupo que trabalha muito para chegar ao fim de semana e vencer os jogos e assim tudo fica mais fácil.  Esse é o segredo da boa campanha. Acredito que é uma questão de tempo até o Arouca estar novamente nos campeonatos profissionais.

ZZ: Por vezes, existe aquela ideia de quando um clube desce de forma muito repentina de forma quase sucessiva que acaba um pouco por desaparecer… Isso aplica-se ao Arouca?

FF: Não, não… O clube tem as mesmas condições de quando estava na segunda ou primeira ligas. As pessoas que estão à frente do clube gostam realmente do clube e querem voltar aos grandes palcos. Depende de muita coisa, é verdade, não depende apenas de trabalho, mas também de sorte.

ZZ: O Arouca segue na primeira posição, mas ainda faltam muitas jornadas, e nos próximos jogos defrontam o Leça e o Castro Daire, duas equipas que também estão em lugares cimeiros. Que avaliação fazes do Campeonato?

FF: O último jogo foi a demonstração de vontade e determinação da nossa equipa. Uma equipa que não relaxa e que, mesmo depois de ter perdido contra o Gondomar, conseguiu dar uma grande resposta. Temos noção que nada está ganho e que temos muito trabalho pela frente. As pessoas podem contar com uma equipa lutadora, trabalhadora e que nunca baixa a guarda.

ZZ: Olhando para este modelo competitivo. Sentes que é um modelo injusto?

FF: Na minha opinião, sim. Podemos ganhar os jogos todos na fase regular e chegar ao play-off e ter 1/2 jogos maus e estamos fora. Na minha opinião, os campeonatos são feitos de regularidade e isso vê-se na primeira e na segunda ligas. Não percebo porque é que aqui não é assim. Depois é também um campeonato que acaba muito tarde. As equipas que sobem não têm tempo para preparar a época seguinte. Mas temos de conviver com essa realidade.

ZZ: Alguma meta até ao final do Campeonato?

FF: Tenho sempre as minhas metas bem definidas. Mas estou tão concentrado em ajudar a equipa que isso passa um bocadinho ao lado. No final fazem-se as contas aos golos, assistências e essas coisas. Até agora o balanço é de uma época positiva e é para continuar assim.

ZZ: Cumpriste recentemente 28 anos. Ainda acreditas na chegada à Liga?

FF: Sim, claro que acredito. Tenho o sonho de criança de jogar numa primeira liga, seja portuguesa ou de outros países. Acho que esta é a fase da minha carreira em que me sinto melhor, tanto do ponto de vista físico como mental. Sinto-me verdadeiramente preparado. Já me sentia no ano passado. Tenho a ambição de disputar ligas superiores, mas acho que esta também não é a altura para estar muito concentrado nisso. É um sonho que está de pé. 

ZZ: O que gostarias de nos contar daqui a um ano?

FF: Gostaria de estar a falar sobre uma subida de divisão e sobre uma convocatória para a seleção de Cabo Verde. Mas se me ligarem, certamente será para falar de coisas boas. 

ZZ: Seleção de Cabo Verde?

FF: Sim, é um objetivo. Há dois anos tinha sido convocado para dois amigáveis, quando tinha acabado a época no Penafiel, e não consegui ir por lesão. Caso chegue essa convocatória, seria uma grande alegria, mesmo para a minha família. Mas será sempre uma consequência do trabalho e dos resultados.