Não foi fácil pegar no computador e começar a escrever um texto sobre Kobe Bryant. Há poucos momentos globais no desporto e, infelizmente, este é um deles. Perdemos aquele que foi a inspiração de muitos e, confesso, aquele que me inspirou a mim para amar a NBA.
Se segue o zerozero e, especialmente o Afunda de 3 ou o zerozero basquetebol, já deve ter reparado numa tendência para falarmos dos Lakers e isso é porque as três pessoas que mais escrevem e contribuem são mesmo adeptos da equipa da LA e têm mesmo Kobe Bryant como jogador favorito. Por isso, e porque sei que o sentimento do Miguel Amaral e do Vasco Moreira é semelhante ao meu, vou tentar passar para si o que a tragédia que foi a morte de Kobe e da sua filha representam para nós.
Permita-me que recue até 2001 para lhe começar a falar de Kobe Bryant. Foi nessa temporada (2000/2001) que comecei a acompanhar a NBA e muito por causa de um dos maiores amigos/rivais de Kobe, Shaquille O'neal. O primeiro jogo que vi por completo foi o jogo 1 das finais dessa temporada e não me apaixonei pelo então número 8 dos Lakers. Impressionou-me o número 3 dos 76ers, Allen Iverson. Curiosamente, até achei Kobe um pouco «maniento».
Até ao final dessas finais a minha opinião mudou e muito. A confiança de Kobe, os saltos constantes e aquela arrogância quase encantadora fez começar uma «relação» espectador/atleta que durou até 2016, mas que se prolongou e se vai prolongar.
Logo a abrir a nossa relação vi-te ser campeão duas vezes seguidas, sendo que já o tinhas sido em 2000. Ainda assim, depois daquele fiasco que foi a Super Team com o Gary Payton, Shaq e Karl Malone, confesso que não fiquei totalmente convencido quando a tua má relação com Shaq levou aos Lakers a preferirem-te a ti, trocando o poste para Miami. Ainda por cima estavas a ser acusado de abuso sexual por parte de uma empregada de um hotel. Mas acho que esse «ponto baixo» na tua carreira fez nascer qualquer coisa. Fez nascer o espírito Black Mamba.
Quem não se lembra de ver os jogos dos Lakers e ver-te ao lado de jogadores como Smush Parker, Chris Mihm ou Kwame Brown. Era quase como ver o Cristiano Ronaldo jogar nas distritais, mas também acho que essa fase foi essencial para perceberes que não podias ser campeão sozinho. Os 81 pontos num jogo (já revi tantas vezes esse jogo e acho que podias ter chega aos 90, pelo menos) foram muito impressionante, os 62 pontos em três períodos quando a equipa toda de Dallas tinha 61 foram também marcantes, mas faltava-te aquele bichinho, que era ter uma equipa capaz de voltar a lutar pelo título.
Por isso, quando no dia 1 de feveiro de 2008 descobri que os LA Lakers tinham «burlado» os Memphis Grizzles e tinham conseguido trocar Kwame Brown, Javaris Crittenton, Aaron McKie por Pau Gasol pensei: «Ui! aí vamos nós outra vez. Kobe vai atacar o título. Já tem três, será que chega aos seis de Jordan?». E foi o que aconteceu. Os meus anos de faculdade foram contigo nas finais (a de 2008 ainda não tinha entrado). Perdeste uma, ganhaste duas (terminaste com cinco anéis) e, pelo meio, ainda tivemos toda aquela história de Kobe vs Lebron. Defendi-te com unhas e dentes e ainda hoje acho que se quisesse começar uma equipa e pudesse escolher um jogador para ser o maior número de vezes campeão possível, tinha que te escolher a ti. Tu fazias tudo por tudo para vencer e ias onde os outros não conseguiam ir (acordar às 4 da manhã todos os dias para teres mais tempo para treinar que todos os outros? Isso foi absolutamente chocante saber).Mas com o passar dos anos o teu corpo foi desistindo de ti. A rotura no tendão de aquiles (ainda foste lançar os lances livres!!), os ombros, o joelho começaram a preparar-me para o teu final de carreira. Antes disso ainda passaste o teu ídolo Michael Jordan e ainda me deste aquela noite em abril de 2016. Numa fase em que eu próprio me preparava para uma mudança na minha vida tu mostraste terminar uma fase tem de ser em beleza e, no teu último jogo, fizeste 60 pontos! 60 pontos! Acho que já vi mais vezes esse jogo que o golo do Éder no final do Euro.
Terminaste a carreira antes de eu ter o privilégio de escrever sobre a NBA e se calhar ainda bem. Se já agora acho que sou parcial, imagina se ainda tivesse de escrever sobre os jogos dos Lakers de Kobe Bryant... Ainda assim, completei as fichas de todos os teus jogos, fiz a notícia do teu Óscar (o Kobe Bryant ganhou um Óscar!!) e vivi imenso a tua cerimónia de retirada das camisolas 8 e 24 por parte dos Lakers.
Para me despedir, digo apenas que no sábado, antes de partir para Braga para a final da Taça da Liga decidi que ia fazer a notícia da provável ultrapassagem do Lebron à tua marca de pontos. Lá para o meio consegui escrever que eras o meu jogador favorito e ainda bem que o fiz, mal eu sabia que menos de 24 horas depois ia estar a ser alertado para a tua morte. Felizmente não tive de escrever essa (ficou para o Miguel).
Fica um obrigado, meu, do zerozero e do desporto. «Mamba out»