Aos 26 anos, Adriano Castanheira continua a brilhar nos relvados da Segunda Liga, mas talvez não por muito mais tempo. O esquerdino foi um dos destaques do segundo escalão na época passada e a estreia na Primeira Liga esteve muito perto de acontecer.
A verdade é que não aconteceu, pelo menos para já. Paços de Ferreira e Boavista estiveram interessados e negociaram com o Sporting da Covilhã, mas os clubes não chegaram a acordo. Problema? Não para Adriano Castanheira. O esquerdino foi à procura de mais e a resposta não podia ter sido mais clara. Foi o melhor jogador da Segunda Liga nos meses de agosto e setembro e falou ao zerozero sobre a carreira e o trajeto ascendente que o trouxe até às portas da Primeira Liga.
«Vou ter treino agora e à tarde vou ter faculdade. Ligue-me por volta das 18h». O contacto com Adriano Castanheira, licenciado em Sociologia, não foi imediato. Era dia de mestrado e sempre que possível o jogador sai do treino e segue para a Universidade da Beira Interior. Esperamos umas horas para conversar e valeu a pena.
ZZ: As aulas correram bem?
Adriano Castanheira: Sim, estamos numa altura de trabalhos por isso é tranquilo.
ZZ: São aulas de quê?
Adriano Castanheira: Estou a tirar um mestrado e as aulas são à quinta e sexta-feira. Normalmente treino quinta e sexta de manhã e depois aproveito para ir às aulas.
ZZ: Isso já é a pensar no futuro?
Adriano Castanheira: Tenho uma licenciatura e estou a dar continuidade com o mestrado. Pós futebol? Uma pessoa nunca sabe o que pode acontecer e convém ter estudos para quando acabar o futebol ter algo a que me agarrar.
ZZ: Então deixemos agora os estudos de lado. Como é que apareceu o futebol na tua vida?
Adriano Castanheira: Na Suíça. Nasci lá, em Neuchâtel, comecei a jogar futebol com cinco ou seis anos. Lembro-me de o meu pai me oferecer a primeira bola, comecei a jogar muito novo. Sempre foi uma paixão. Depois vim para Portugal, os meus pais são da Covilhã e comecei a jogar aqui.
ZZ: Quando vieste para Portugal?
Adriano Castanheira: Tinha 11 anos.
ZZ: E como foi, com 11 anos, estar no Covilhã?
Adriano Castanheira: Foi positivo, não difere do futebol na Suíça, mas aqui, em iniciados, joguei na distrital e depois subi para os nacionais. Foi mais competitivo. Depois fui para o FC Porto, a exigência é maior e a nível profissional é um pouco diferente.
ZZ: Como é que um miúdo sai da Covilhã para ir para o FC Porto?
Adriano Castanheira: Passou pelo presidente. O clube estava na Segunda Liga, tinha alguns contactos com o FC Porto e surgiu a oportunidade. Na altura ou ia para o FC Porto jogar nos juvenis ou assinava contrato profissional com o Covilhã e começava a treinar nos séniores. Optei por ir para o FC Porto e acabei lá a minha formação.
ZZ: Lembras-te do dia em que apareceu essa oferta? Que jogadores estavam por lá?
Adriano Castanheira: Sim. Fiquei muito contente, não hesitei. A minha geração foi a do Tozé, Fábio Martins, Lupeta, Ricardo Alves. Foi uma geração boa, com bons jogadores, havia qualidade e isso ajudou-me a crescer. Foi importante.
ZZ: Depois de acabares a formação voltaste para a Covilhã. Porquê?
Adriano Castanheira: Na altura o Covilhã estava na Segunda Liga, falei com o presidente e havia a possibilidade de vir para cá. Não joguei muito, talvez tivesse sido mais positivo ir para o Campeonato de Portugal. A oportunidade surgiu, era Segunda Liga e decidi tentar e vim para o Covilhã.
ZZ: A adaptação foi complicada?
Adriano Castanheira: Sim, a adaptação acabou por não ser fácil. A transição de júnior para sénior é sempre complicada. Acabou por não ser muito positivo, não tive os minutos que queria. Fiquei três anos no Covilhã, deu para crescer, mas senti que era melhor baixar um escalão para jogar mais e evoluir. Acabas sempre por evoluir, tínhamos um bom plantel, com jogadores experientes, mas não tinha minutos de jogo e precisava de jogar. Foi por isso que saí.
ZZ: Mas passado um ano voltas para o Covilhã. Isto é uma relação de amor?
Adriano Castanheira: Sim, é o clube da terra, o clube onde cresci como homem e jogador. Saí para o Benfica Castelo Branco e depois para a União de Leiria, mas surgiu interesse do Covilhã em contratar-me. Tinha estado três anos no Campeonato de Portugal, tinha evoluido, senti que as épocas tinham corrido bem, senti que seria uma nova oportunidade, com outro estatuto para tentar afirmar-me. As coisas correram bem na última época e agora também.
ZZ: Vieste melhor jogador?
Adriano Castanheira: Vim diferente, joguei e ganhei minutos. Nas épocas no Campeonato de Portugal isso foi importante, ganhei muita confiança em mim, continuei a trabalhar, vim para o Covilhã e destaquei-me.
ZZ: No futuro, quando olhares para a época passada (2018/19) vais recordá-la como a época de afirmação?
Adriano Castanheira: Foi uma época de viragem e sem dúvida de afirmação por estar na Segunda Liga. Inicialmente as coisas não correram bem mas demos a volta, fizemos uma segunda volta muito boa. A par desta, foi sem dúvida a melhor época enquanto jogador profissional.
ZZ: Tem sido uma boa época a nível individual e coletivo, não tem? Até já foste o jogador do mês.
Adriano Castanheira: Consegui dar continuidade à época passada e a nível coletivo começámos bem o campeonato, com várias vitórias consecutivas. Agora as coisas não estão a correr tão bem, mas estamos numa boa posição, vamos tentar voltar a ganhar jogos.
ZZ: Achas que esta é a Segunda Liga mais competitiva dos últimos anos?
Adriano Castanheira: A Segunda Liga é muito competitiva. As equipas dos últimos lugares conseguem ganhar aos dos primeiros. É uma liga competitiva, há jogadores que se destacam e conseguem dar o salto para a Primeira Liga e para o estrangeiro.
ZZ: E onde se enquadra o Sporting da Covilhã na competição? Farense, Nacional, Estoril, Chaves e Feirense assumiram-se como candidatos à subida...
Adriano Castanheira: Depende, há equipas que têm orçamentos muito maiores do que o do Covilhã e não estão onde querem. Há equipas, como o Farense e o Estoril, que têm vindo a fazer uma boa época e estão na parte de cima. O Covilhã, apesar de não ter um orçamento tão alto, há uns anos era dos mais baixos da Liga e quase subiu de divisão... Por isso, depende dos jogadores, da maneira como treinam e querem ficar na parte de cima da tabela e atingir objetivos para que o clube chegue à Primeira Liga.
ZZ: És treinado pelo Ricardo Soares, que já esteve na Primeira Liga. Como tem sido?
Adriano Castanheira: É uma experiência positiva, é um treinador com experiência de Primeira Liga, trouxe qualidade e com isso aparecem resultados.
ZZ: Já agora, se tivesses de apontar a maior qualidade do Sporting da Covilhã, qual seria?
Adriano Castanheira: Lutador.
ZZ: Essa parece-me uma boa característica. Em Mafra, com o relvado complicado, viu-se isso. Depois também fizeram uma boa exibição contra o Benfica e foram elogiados por isso. Achas que as pessoas ainda não olham muito para a Segunda Liga e por isso destacam jogos contra equipas da Primeira Liga?
Adriano Castanheira: Eu acho que sim. Apesar de clubes da Segunda Liga jogarem contra equipas de Primeira, como com o Benfica, dá mais motivação, mas se os jogadores trabalharem sempre no máximo, nos treinos e nos jogos, no fundo são 11 contra 11 e jogadores com duas pernas, estejam ou não na Primeira Liga. Há sempre possibilidade de fazer história, contra o Benfica sabíamos que ia ser difícil. Tivemos um resultado positivo, quase ganhávamos, infelizmente não aconteceu, mas passa por aí.
ZZ: Tu já tens mais de 100 jogos na Segunda Liga. Achas que chegou a altura de dar o salto?
Adriano Castanheira: Tenho vindo sempre a trabalhar para melhorar e chegar o mais longe possível. Sinto que já podia estar na Primeira Liga pelo que fiz no ano passado, infelizmente não aconteceu, os clubes não chegaram a acordo, mas sinto que ainda é possível chegar lá e conseguir afirmar-me e destacar. Sinto que ainda vou a tempo.
ZZ: Estiveste perto de chegar à Primeira Liga?
Adriano Castanheira: Sim, no verão até veio a público, entre o Boavista e Paços de Ferreira. Não houve acordo, mas pode ser que isso aconteça, vamos ver.
ZZ: E clubes estrangeiros?
Adriano Castanheira: De estrangeiros nunca tive nenhuma proposta.
ZZ: «É claramente jogador de primeira». «Se calhar devia ter saído no ano passado, não compreendo como é que não veem um jogador como ele», «Porque é que não está na primeira liga?». Isto são coisas que o teu treinador e colegas disseram sobre ti. Como comentas isto?
Adriano Castanheira: Pela qualidade que tenho mostrado nas épocas anteriores, sinto que sou um jogador de Primeira Liga e que posso chegar lá. Basta continuar a trabalhar e esperar que em janeiro ou junho os clubes cheguem a acordo e consiga chegar à Primeira Liga e afirmar-me. É um sonho jogar na Primeira Liga e espero lá chegar sinceramente.
ZZ: E o que podes acrescentar à Liga?
Adriano Castanheira: Eu costumo dizer que sou um jogador trabalhador e humilde. Procuro ir no um para um, tenho velocidade, remate. É por aí. Vou tentar trazer um bom futebol.
ZZ: Terminas contrato no verão. A saída pode acontecer nessa altura ou já em janeiro, dando algum lucro financeiro ao Sporting da Covilhã?
Adriano Castanheira: Se houver a possibilidade de sair em janeiro é positivo, mas depende também das equipas interessadas. Depende de muitos aspetos. Se o clube conseguisse algum dinheiro seria sempre positivo, mas depois logo veremos.
ZZ: Para terminar, se te ligasse no final de 2020 o que gostarias de ter para me dizer?
Adriano Castanheira: Gostaria de dizer que está tudo a correr bem, que cheguei à Primeira Liga, que o clube onde estou está bem posicionado. Tenho feito golos, assistências e que as coisas na Primeira Liga estão a correr bem.