Alvibranco 25-04-2024, 09:39
Em outubro, a propósito de uma ida do autor do artigo ao Canadá, em férias, abordámos João Meira umas semanas antes, visto que o Toronto FC x Chicago Fire se jogava no tal período. Era um excelente pretexto para uma entrevista, que aqui pode ler. Ora, nessa altura o João dizia-nos que estava a gostar, mas que continuar não ia ser fácil. Estava no último classificado e a sua ambição era mais do que isso.
A situação não se alterou em termos classificativos (até porque era o último jogo da fase regular) e, com o contrato a acabar, sair para outro destino era o cenário lógico. Só que tudo mudou...
Chegaram reforços (e que reforços!) e, ao fim de 19 jogos na nova temporada, a turma de Chicago está na liderança do campeonato americano. As mudanças, a nova realidade, as saudades da família e vários desejos que moram no íntimo do central foram referidos nesta entrevista que convidamos a ler.
Em menos de um ano, o rendimento dos Chicago Fire mudou mesmo muito. Afinal, o que se passou?
O ano passado foi de aprendizagem para todos, quer treinadores, quer jogadores, e as coisas não correram como nós queríamos. Este ano houve um maior investimento, algumas contratações que fizeram com que a equipa tivesse outro rendimento.
Estás a falar das chegadas do Schweinsteiger e do Nikolic (o húngaro é o melhor marcador da prova)...
Sim, e do Dax [McCarty] e do Juninho, que ajudaram muito. Temos uma maneira diferente de jogar, estamos muito mais preocupados com o nosso estilo e passamos menos tempo a pensar em nos adaptarmos ao adversário. Também talvez porque a qualidade é diferente. Esses quatro jogadores ajudam muito mesmo.
Podemos estar aqui a falar de um candidato à MLS?
Ainda é um bocadinho cedo, porque nesta competição perder dois ou três jogos faz-nos descer quatro ou cinco posições, e o contrário. Os New York Red Bulls foram os campeões da fase regular na época passada, mas depois os nervos foram tantos que não chegaram à final. Por outro lado, os Portland [2015] e os Seattle [2016] tiveram dificuldades para chegarem aos playoffs e depois foram os campeões. Ninguém esperava que acontecesse.
Ainda assim, é muito pouco comum ver uma equipa passar de última num ano para primeira no outro? Na NBA é que por vezes acontece...
Os moldes da competição são muito diferentes. Na Europa, também há sítios onde existe playoff, se bem que é diferente, com os pontos a partir a meio e a fazer-se um mini-campeonato com vantagens já definidas. Aqui é por eliminatórias. Além disso, o facto de se poder investir em três DP's [Designated Players] novos de ano para ano, que dê para dar nova qualidade à equipa. Tudo isso faz com que normalmente haja um campeão novo todos os anos
Quatro Europeus, três Mundiais, muita história para contar. Como é que está a ser a ligação com Schweinsteiger?
Está a ser perfeita, ele ajuda bastante no balneário e no campo. É uma pessoa completamente normal e humilde. Tem as suas ideias de jogo, aceita opiniões e é um líder... É uma lenda viva no futebol e felizmente tenho a sorte de jogar com ele.
No ano passado entraste várias vezes na equipa do ano...
É verdade, mesmo não correndo bem à equipa, correu-me bem a mim. Obviamente, sofremos alguns golos difíceis de explicar, mas este ano as coisas melhoraram porque, acima de tudo, começamos a defender melhor logo na frente. Quando chegam à nossa defesa, já é mais fácil limpar. E sinto-me bem, sinto-me na minha plenitude mentalmente.
Vi no teu Facebook uma publicação em que já te descreviam como The Wall [o Muro].
Isso foi uma brincadeira dos colegas, nada de especial [risos]. É verdade que já está a pegar, mas é só uma questão de sofrermos golos. Quando isso acontecer, passo a The Water [a água]. É sempre bom ver reconhecido o nosso trabalho e quando é um nickname para nos valorizar, é espetáculo.
Que repercussões tens sentido em Portugal?
Tenho tido mais visibilidade a nível de imprensa, tenho sido mais falado. É sempre assim. Por mais qualidade que tenhamos, se não estivermos a um nível para sermos campeões, vamos ser sempre abafados. Quando estamos no estrangeiro, talvez as pessoas dêem mais valor. Mas o telefone ainda não tocou com propostas, portanto não sei [risos].
E se tocar?
[Pausa] Temos de ver bem... Muito sinceramente, gostava de voltar à Europa. Tenho contrato até dezembro e gostava de voltar a sentir o futebol europeu, que é diferente, quer queiramos, quer não. A família também já começa a pesar e com um filho pequeno e estar tão longe é complicado.
De Portugal, ainda nada de abordagens.
Não, nada.
E equacionarias deixar a meio esta carreira que corre tão bem a nível desportivo?
Sim. Eu cheguei a um patamar da carreira e da idade em que tenho de pensar mais na família. Apesar de ter um pouco de pena se deixar, também serei campeão, por isso não será por aí [risos]. Já tive a minha dose de influência e gosto muito de novos desafios, não gosto de estar acomodado.
Tendo tu estado no Belenenses, entras na ideia de que voltar a Portugal é só para os três grandes?
Não, não digo isso. Tenho de ter a noção da minha realidade. É claro que gostava de jogar em cada um deles e, se me perguntassem se tenho qualidade, acho que tenho. Mas não faço essa restrição. Agora, ir para Portugal terá de ser para um projeto que me valorize e que me faça mudar isso.
És central e, apesar da remodelação que Fernando Santos tem feito, falta no centro da defesa. Olhas para isso com esperança ou não é algo que te moa a cabeça?
Sinceramente, começo a acreditar cada vez mais. Mas, sendo muito sincero, estando noutra realidade, mais visível, seria muito mais fácil. As pessoas ainda têm muito na cabeça que a MLS não é um campeonato competitivo, por isto e aquilo. Mas, estando num campeonato atrativo, acredito que seria diferente. É um grande sonho que eu sempre tive.
É a melhor fase da tua carreira?
É, sem dúvida. Tenho dado uma sequência muito grande. Não é fazer três jogos bons e um mau. Tem sido toda a época. E cresci muito aqui, estando sozinho, longe da família e da zona de conforto. Não me permito desleixar-me.
Sentes que ainda deves algo ao futebol português?
Sinto. Penso que poderia ter mostrado muito mais, embora também me tenha faltado alguma oportunidade. Cheguei tarde à primeira Liga, acredito que poderia ter sido diferente. Ainda assim, se aconteceu assim, por algum motivo foi.