Shaquille O´Neal tem duas características que o tornam singular na NBA. Aliás, até tem mais, mas vamos pegar nestas duas, que exemplificam bem quem foi este jogador. Primeiro, é o jogador com mais alcunhas da história do desporto. Já foi chamado de «Super-Homem», «Disel», «O Grande Aristóteles», «Shaq Daddy» etc etc etc. Curiosamente, foi o próprio quem criou as suas alcunhas. Este era o lado divertido de Shaquille O’Neal.
O lado competidor deste jogador leva-nos ao ponto 2 das características que mais marcam Shaq. Sem grandes reservas, podemos dizer que essa característica é o facto de estarmos a falar do jogador mais dominante na história moderna da NBA. No seu pico simplesmente não havia como travar esta força da natureza.
Shaq era tão dominante que levou a duas mudanças profundas na NBA. Primeiro, levou a liga a reforçar as tabelas de basquetebol. Isto porque o poste destruiu algumas com afundanços. A outra mudança prendeu-se com a criação do «Hack-a-Shaq», estratégia que os adversários do poste adoptavam, fazendo faltas sem bola para o obrigar a ir para a linha de lance livre, onde era francamente mau. Falhou um total de 5 317 lançamentos livre em 11 252 tentados.
Vamos começar pelo início. Shaquille Rashaun O'Neal nasceu a 6 de março de 1972, em Newark, New Jersey. Como tantas outras estrelas da NBA, a infância de Shaq começou por não ser fácil. O pai foi preso, quando este era bastante novo, por posse e tráfico de droga, e desapareceu da sua vida durante várias décadas. A mãe do jogador casou depois com o Almirante do Exército norte-americano e isso levou a que o jovem tivesse de mudar de casa várias vezes para acompanhar o padrasto nas suas colocações militares.
A infância do poste dividiu-se entre o Texas e a Alemanha e foi no estado texano que começou a carreira de basquetebol daquele que viria a ser o mais dominante jogador da Liga. Esteve dois anos no liceu de Robert G. Cole, em San Antonio, no Texas. Foi tão impressionante que levou a sua escola a um recorde de 68 vitórias e apenas uma derrota em dois anos.
Seguiram-se várias ofertas de universidades, mas Shaq aceitou ir jogar para a modesta Louisiana State University, para ser treinado por Dale Brown, um dos grandes treinadores universitários dos EUA. Esteve dois anos na universidade, onde dominou de tal forma que começou a ser chamado para a NBA.
Na primeira temporada não chegou ao playoff por um jogo, mas foi eleito Rookie do Ano. Na segunda temporada melhorou ainda mais os números, aumentando a sua média pontual para 29,4 por jogo. Levou os Magic à primeira presença nos playoff e pelo meio ainda fez um dos jogos mais inacreditáveis da história da Liga. A 20 de novembro de 1993, contra os Nets, fez o seu primeiro triplo-duplo, com 24 pontos, 28 ressaltos e 15(!) blocos. A sua equipa foi eliminada na primeira ronda, mas a época fez nascer uma dupla de respeito em Orlando, juntando Shaquille O’Neal ao base Penny Hardaway.
Essa dupla levou os Magic à final na época 94/95 (perderam para os Houston Rockets de Clyde Drexler e Hakeem Olajuwon) e à final da conferência Este na seguinte (perdendo para os Chicago Bulls de Michael Jordan).
Estranhamente, a relação de Shaq com a cidade de Orlando e com os Magic não era a melhor. Apesar do domínio, dos pontos, dos ressaltos e tudo o resto, Shaq não era uma figura consensual e quando chegou à altura da renovação de contrato a opinião geral era de que ao jogador não deveria ser pago o máximo. Aliás, foi mesmo feita uma sondagem na cidade de Orlando, com mais 80% das pessoas a dizerem que Shaq não merecia o contrato máximo. Para além disso, a relação do poste com a direção dos Magic nunca foi a melhor, especialmente por esta favorecer o base Penny Hardaway como figura da equipa.
Ora, quem aproveitou estes problemas foi Jerry West (lenda da NBA e o jogador que está no logo da Liga), que na altura era o diretor dos Lakers. A equipa de Los Angeles ofereceu 121 milhões ao poste, num contrato de sete anos, e levou-o para a Califórnia. Este foi outro impacto que Shaq teve nas regras da NBA. Depois desta mudança, a Liga adoptou uma nova regra em relação ao final dos contratos dos Rookies, como era o caso do contrato de Shaq em 1996. A partir de então, os jogadores que terminam os quatro anos do chamado «contrato de rookie» são jogadores livres restritos, o que implica que podem negociar com outras equipas, mas a franquia onde estão pode igualar qualquer proposta e assim manter o jogador pelo menos durante mais dois anos. Algo que não acontecia em 1996.
Chegado a Los Angeles, Shaq abraçou a cultura da cidade dos anjos e tornou-se de imediato uma figura na cultura norte-americana. Filmes, música, publicidade, Shaquille O´Neal estava em todo o lado. Dentro dos pavilhões a equipa era forte, mas ainda não estava pronta para ser considerada uma verdadeira candidata ao título, especialmente porque aquela que viria a ser a outra figura da equipa, Kobe Bryant, era apenas um jovem que entrou na Liga também em 1996, com apenas 18 anos.
Nas três primeiras épocas nos Lakers, Shaq foi sempre aos playoff, mas acabou eliminado pelos Jazz (duas vezes) e ainda pelos San Antonio Spurs.
Porém, o novo milénio mudou tudo. Com o final do domínio dos Chicago Bulls em 1998, com o fim de alguns veteranos dos anos 90, estava pronta para nascer uma nova dinastia e essa emergiu em Los Angeles. Já com Shaq nos seus melhores anos e com Kobe Bryant a tornar-se uma superestrela, a direção dos Lakers convenceu Phill Jackson a ficar com o cargo de treinador principal. Jackson era, nada mais, nada menos que, o treinador dos Bulls durante os anos 90, tendo conquistado seis anéis de campeão. O técnico convenceu o «Disel» a abdicar de tudo o que o rodeava, focando-se apenas no basquetebol e isso elevou o seu jogo a um nível nunca antes visto.
Este trio dominou de uma forma incrível a NBA durante três anos. Foram campeões em 2000, 2001 e 2002 (batendo os Pacers, 76ers e os Nets). Shaq foi nomeado MVP nas três finais, venceu o prémio de MVP em 2000, bem como o de melhor marcador da Liga no mesmo ano. A dinastia dos Lakers foi tão impressionante que ainda hoje (2023) esta equipa detém a melhor marca de sempre nos playoff. Em 2001, venceram 15 dos 16 jogos que fizeram na segunda fase da temporada, tendo perdido apenas o jogo 1 das finais, contra os Philladelphia 76ers. Essa dinastia coincidiu com a melhor fase da carreira do poste, que era visto como uma força impossível de travar.
A época seguinte viu os Lakers formarem uma «Superteam», juntando Karl Malone e Gary Payton a Kobe e a Shaq. A equipa chegou à final da NBA, mas acabou por ser humilhada pelos Detroit Pistons. Foi a última vez que Shaquille O´Neal vestiu o uniforme dos Lakers.
O verão de 2004 foi de grandes mudanças para Shaq. O poste passou a temporada 03/04 a exigir uma extensão de contato e um aumento aos Lakers. Chegou mesmo a gritar a meio de um jogo «paguem-me» em direção a Jerry Buss, dono da equipa. O certo é que os Lakers não aceitaram as exigências e, perante os problemas entre Kobe e Shaq, decidiram colocar o poste no mercado e renovar o contrato de Bryant.
Esse título viria na sua segunda temporada. Ao lado de Dwayne Wade, dos veteranos Alonzo Mourning e Gary Payton e treinados pela lenda Pat Riley, os Heat bateram os Mavericks nas finais de 2006 e conquistaram o primeiro título da história da franquia. Mesmo não sendo a mesma força dominadora, aos 33 anos, Shaq apresentou média de duplo-duplo nas finais, com quase 14 pontos e mais de 10 ressaltos.
Depois da conquista do título de 2006 assistiu-se ao declínio de Shaquille O´Neal. Com a idade a avançar e com vários problemas físicos, Shaq passou a ser mais uma figura da Liga do que uma ameaça à conquista do título.
Esteve mais uma temporada e meia ao serviço dos Heat, tendo sido trocado depois para os Phoenix Suns, onde nunca conseguiu adaptar-se ao estilo de jogo rápido e de lançamento exterior, imposto pelo treinador Mike D’Antoni. Saiu de Phoenix no verão de 2009 para se juntar a Lebron James nos Cavaliers. Esta foi a última aposta dos Cavs para tentar dar a ajuda séria a Lebron, evitando que o jogador deixasse a equipa, algo que viria a acontecer. Esteve um ano nos Cavs, mas não conseguiu levar a equipa às finais.
A temporada 2010-2011 foi a última da carreira de Shaq e, reza a lenda, que só aconteceu devido a Kobe Bryant. Nos festejos do título de 2010 dos Lakers, Kobe disse à imprensa que uma das razões que tornavam este 5º campeonato especial era o facto de ter mais um título que Shaq. Isso levou a que os Boston Celtics convencessem o poste a jogar mais uma temporada, ajudando a equipa de Boston a tentar ganhar o anel para igualar Kobe (os dois fizeram as pazes nos últimos anos, com o poste a ser mesmo convidado a falar no memorial de Kobe Bryant).
Após terminar a carreira, Shaq dedicou-se a trabalhar nos media, tendo mesmo criado o segmento de sucesso «Shaqtin a Fool», onde brinca com os momentos mais caricatos da NBA.
Foi o jogador mais dominante da história moderna da NBA. Terminou a carreira com 28 596 pontos (atualmente ocupa a 8ª posição). Conquistou quatro títulos, tem as camisolas retiradas nos Lakers e nos Heat e até tem uma estátua à frente do Staples Center, em Los Angeles. Fosse «Super-Homem», «Disel», «Big Aristóteles» ou simplesmente Shaq, ainda hoje os seus feitos são recordados e admirados com saudade.