Quando faleceu em 2010, Malcolm Allison foi relembrado em Inglaterra, sentido com particular carinho pelos adeptos do Crystal Palace e do Manchester City. Em Portugal, os adeptos do Sporting também não o esquecem, pelas conquistas da época perfeita de 1981/82, em que os leões venceram campeonato e taça (a supertaça seria conquistada já por António Oliveira), longe de imaginarem que esperariam 18 anos por nova conquista do título...
Fedoras, charutos e banhos de espuma
Em Inglaterra, Allison é recordado pelas suas bocas, as famosas one-liners, o seu amor pelos chapéus fedora que usava constantemente, um gosto particular por chocar, pelos seus inúmeros affairs e por ser um bon vivant, um boémio com gosto requintado por charutos e bebidas, e um belo treinador de futebol. Em Inglaterra, é reconhecido como uma figura icónica, uma lenda do futebol.
O seu rol de conquistas é impressionante e não falamos de futebol. Falamos de mulheres, uma das suas grandes paixões e perdições. Entre as suas namoradas e conquistas contam-se os nomes de Christine Keeler, modelo e showgirl muito famosa no Reino Unido pela sua participação no famoso caso Profumo.
Entre as suas paixões contavam-se também a cantora Dorothy Squires, duas vezes Miss Reino Unido, fazendo a delícia dos tabloides, mas seria com Fiona Richmond, uma atriz porno muito famosa na época, que Big Mal provocaria escândalo, numa história que se conta em poucas linhas:
Malcolm e Fiona despiram-se e entraram dentro do banho, tendo a imagem sido fotografada para a posteridade. Os circunspectos dirigentes da FA não gostaram e Malcolm Allison foi castigado e afastado.
O sonho da bola
Malcolm Alexander Allison, filho de um engenheiro elétrico, nasceu a 5 de Setembro de 1927 em Dartford, Kent, no sudeste de Inglaterra. Desde pequeno que demonstrou uma paixão pela bola, colocando a oportunidade de jogar acima dos estudos.
A teimosia e paixão pela bola era tanta que falhou um exame de admissão a uma escola porque essa escola tinha râguebi e não futebol, tendo que estudar numa escola pública, reconhecidamente pior, mas podendo jogar o seu tão amado beautiful game.
Em 1945, começou a jogar nas escolas do Charlton Athletic como defesa, tendo mudado para o West Ham United, outro clube de Londres em fevereiro de 1951.
Ao serviço dos hammers faria 238 jogos a center half, marcando ao todo 10 golos. A sua carreira seria tragicamente interrompida em 1957, tinha 30 anos, quando lhe retiraram um pulmão por ter sido diagnosticado com tuberculose. Tentou ainda jogar nas reservas, mas a incapacidade física tornou impossível continuar a carreira.
Desanimado, abandonou o futebol por completo, dedicando-se a outras profissões, como vendedor de carros, jogador profissional e dono de um clube noturno.
Do Royal Crescent para o mundo
Voltou ao West Ham, onde, sob a orientação de Ted Fenton, deu alguns treinos e mais tarde tornou-se um dos responsáveis pelos schoolboys, sendo uma das figuras orientadoras da academia do clube.
Nesses anos foi tutor do jovem Bobby Moore, que anos mais tarde o recordou com imenso carinho, lembrando o papel fundamental que teve na sua carreira, reparando nele e apoiando-o quando mais ninguém se interessava pelo jovem Moore. Já no auge da carreira, o campeão mundial Bobby Moore jurava que não podia ter sido nada do que foi sem o Big Mal, razão pela qual amava aquele homem.
Depois passou pela Universidade de Cambridge onde aprofundou os seus estudos sobre treino, antes de assumir o seu primeiro papel como treinador ao serviço do Bath City.
Seria na cidade banhada pelo Avon que Allison começaria a sua carreira, acabando com velhos hábitos instalados no clube. Substituindo Bob Hewson, obrigou os jogadores a treinar duas vezes ao dia, quando antes da sua chegada, e por serem todos amadores com um trabalho durante o dia, só treinavam quatro vezes por semana.
Ficou em terceiro lugar no campeonato e chegou à terceira ronda da FA Cup, obrigando o primodivisionário Bolton a um jogo de desempate, depois de ter estado a vencer o primeiro jogo quase até ao fim.
No fim da época abandonou a cidade de Jane Austeen e olhou para trás uma última vez para o Royal Crescent, antes de aceitar o convite que lhe chegou do Canadá para treinar o Toronto City. Mas poucas semanas bastaram para ter saudades da Old Blighty e rapidamente regressou a Inglaterra.
O City podia jogar em Marte
A sua carreira em Bath dera nas vistas, não surpreendendo que despertasse a cobiça de clubes de escalões superiores, um deles, o Plymouth Argyle, contratou-o e levou-o para a costa sul de Inglaterra. Ao serviço dos verdes despertou o interesse do Middlesbrough, mas seria o Manchester City que o contrataria.
Ao longo de sete épocas, Mercer e Allison transformaram um clube de segunda divisão numa das mais excitantes e admiradas equipas de Inglaterra.
Campeões de Inglaterra e vencedores do Charity Shield em 1968, vencedores da FA Cup em 1969, da Taça da Liga e da Taça dos Vencedores das Taças em 1970, os cityzens tornaram-se num caso sério no panorama futebolístico inglês. No auge do sucesso, Allison afirmava numa entrevista que o "City seria o primeiro clube a ser convidado a jogar em Marte."
De cidade em cidade: com a casa às costas