O Campeonato de Portugal foi a primeira competição nacional do futebol português. A sua antiguidade, e o seu fim em 1938, talvez tenham votado a memória da prova a um certo abandono, com os próprios vencedores da competição a listarem as suas vitórias na competição em plano de pouco destaque, não lhe dedicando a atenção que sempre deram a outras provas.
Para a história fica a lista de vencedores: FC Porto e Sporting (4 vezes), Belenenses e Benfica (3 vezes) e Marítimo, text.php?id=74 e Carcavelinhos, todos eles Campeões de Portugal por uma vez.
A prova que surgiu para coroar o Campeão de Portugal - assim era reconhecido o vencedor da competição - disputava-se em eliminatórias, à imagem da Taça de Portugal, que começou em 1938/39, para substituir precisamente esta competição.
Tudo começou numa derrota
A história do Campeonato de Portugal começa com o primeiro jogo internacional realizado pela seleção nacional. Foi a 18 de Dezembro de 1921 que o selecionado português se estreou defrontou a seleção espanhola em Madrid.
Sem nenhuma prova nacional e com apenas três campeonatos regionais (Lisboa, Porto e Madeira), não era fácil escolher um conjunto de jogadores. Marcou-se então um jogo entre a seleção de Lisboa e a seleção do Porto - que à partida deixava de fora o resto do país - para se escolherem os eleitos. Contudo o jogo acabou por não ter lugar, provocando a ira entre os adeptos portuenses.
Apesar dos protestos e do boicote pedido pela Associação de Futebol do Porto, dois jogadores da Invicta juntaram-se à comitiva. A derrota, esperada, lançou o debate sobre a necessidade de se organizar uma competição nacional de futebol.
A primeira edição
A imprensa desportiva fez campanha para se organizar uma competição de cariz nacional. Por diversos motivos tanto de natureza social, financeira e até política, mas sobretudo por questões desportivas, a primeira edição da prova, marcada para o fim da Primavera, seria disputada apenas pelos campeões de Lisboa e Porto, respetivamente Sporting e FC Porto.
O primeiro embate jogou-se no Campo da Constituição no Porto. Era o dia 4 de Junho de 1922. A imprensa da época faz referência a uma multidão entusiasta no apoio à equipa da casa. Era a primeira vez que o FC Porto enfrentava um dos grandes de Lisboa numa partida de cariz oficial.
Os leões adiantaram-se por intermédio Emílio Ramos. Tavares Basto empatou à passagem dos 25 minutos e fechou a reviravolta a quatro minutos dos 90.
A atmosfera carregada, com os adeptos portistas a receberem os lisboetas de forma hostil e intimidatória, provocou brado na altura, e teria na eco na imprensa lisboeta:
«Durante o match a assistência exerceu sempre uma enorme pressão sobre os rapazes do Sporting insultando-os (...) e chegando até (...) a atirar tiros para o ar quando os jogadores do FC Porto conseguiam vantagem...» (1)
O FC Porto venceria o jogo após prolongamento (3x1), sagrando-se o primeiro campeão de Portugal.
Anos de afirmação
A segunda edição da prova já aceitou a participação dos campeões regionais de Braga (Sp. Braga), Faro (Lusitano VRSA), Madeira (Marítimo) e Coimbra (Académica).
A final seria disputada em Faro, entre leões e estudantes. A Académica foi a grande sensação da prova, pois teve de disputar três jogos para chegar à final, enquanto os leões só entraram na prova nas meias finais tal como o FC Porto, que eliminou por 3x0 em Lisboa.
Um ano mais tarde, o FC Porto era o grande favorito, mas a vitória acabaria por sorrir ao text.php?id=74, com os algarvios a baterem os portistas (4x2) na grande final.
Um Campeonato de dimensão nacional
Em 1924/25, portistas e leões voltaram a enfrentar-se na final, com a vitória a sorrir novamente ao FC Porto (2x1). Em 1926 seria a vez do Marítimo inscrever o seu nome na lista dos campeões de Portugal, depois de bater o Belenenses (2x0) na final disputada no Ameal no Porto.
Para a história ficara a goleada com que os verde-rubros tinham brindado o campeão FC Porto no Funchal (7x0) na meia-final.
Na época seguinte o competição sofreu uma alteração radical, permitindo a participação de mais do que duas equipas de Lisboa e Porto, assim como duas equipas de Beja, Setúbal, Braga, Aveiro e Coimbra.
Bicampeão e a estreia do Benfica
O domínio das equipas lisboetas cimentava-se, com o Carcavelinhos a bater o Sporting na final de 1928. Na época seguinte seria a vez do Belenenses a reconquistar o troféu, vencendo o União Lisboa por 2x1, tornando-se assim no segundo clube a vencer a prova por duas vezes.
1930 marca a estreia vitoriosa dos encarnados na prova, numa vitória por 3x1 sobre o Barreirense. Um ano mais tarde as águias tornaram-se o primeiro clube a festejar o bicampeonato, ao baterem o FC Porto por 3x0 na grande final, a primeira disputada entre os dois clubes.
Em 1931/32, os azuis de Belém e os portistas decidiam entre si qual seria o primeiro clube a vencer a prova por três vezes. Os nortenhos levaram a melhor após jogo de desempate, mas o Belenenses não desistiu e na época seguinte bateu o Sporting (3x0) e igualou os portistas no número de troféus.
Últimos anos
O Sporting voltaria à lista de vencedores em 1934 depois de derrotar o Barreirense num jogo épico (4x3). Em 1935 disputou-se a primeira final entre os velhos rivais lisboetas e o Benfica ganhou o jogo, igualando o FC Porto e o Belenenses em títulos.
Em 1938 disputou-se o Campeonato de Portugal pela última vez e o Sporting conquistou o seu quarto troféu, superiorizando-se ao rival Benfica (3x1).
A nova competição
Quatro anos antes criara-se a Liga Experimental, uma prova disputada em moldes bem diferentes do Campeonato de Portugal. O vencedor da Liga era atribuído no fim da época, depois de todas as equipas se terem defrontado em casa e fora. A equipa que contabilizasse mais pontos vencia a prova.
Em 1938 resolveu reestruturar-se o futebol português, criou-se o Campeonato Nacional da Primeira Divisão, que a partir de então começou a coroar o Campeão Nacional. Por sua vez o Campeonato de Portugal foi substítuido pela Taça de Portugal, que seria jogado em eliminatórias, abertas a um maior número de equipas.
Curiosamente, o troféu seria o mesmo e ainda hoje, se se observar com atenção o troféu da Taça de Portugal, é fácil encontrar as placas com os vencedores do Campeonato de Portugal entre 1922 e 1938, ao lado dos vencedores da Taça de Portugal desde 1939 até aos nossos dias.
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(1) Cf. Os Sports, 29 de Junho 1922, pp.1.