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    Sir Edward Elgar e o cântico dos wolves

    Texto por João Pedro Silveira
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    No oneNo one knows whether the tune was ever played during his lifetime but yesterday it got its first-ever known public performance at a charity concert in the city.
    Na viragem do século XIX para o XX a imagem de um homem nos seus 40 anos a pedalar pela bucólica paisagem das Midlands inglesas não seria de todo incomum.
     
    O que poucos imaginam é que um desses «ciclistas de fim de semana» que tantas vezes cruzou essas estradas rurais era nem mais nem menos que o renomado compositor inglês Sir Edward William Elgar, o autor de peças tão memoráveis como as celebradas Marchas de Pompa e Circunstância, um tema que ainda hoje em dia é regularmente entoado pela multidão em eventos desportivos no Reino Unido.
     
    O motivo que o levava a efetuar essas viagens ao fim de semana entre Malvern onde vivia e a cidade de Wolverhampton era um jogo de futebol do seu clube do coração: o Wolverhampton Wanderers. Esta faceta de adepto incondicional, capaz de fazer centenas de quilómetros para ver um jogo de futebol é algo que poucos associam a alguém como o grande compositor inglês. 

    São aproximadamente 83 quilómetros o que separa a Wells Road em Malvern, da Waterloo Road em Wolverhampton. A segunda morada corresponde ao Molineux, a casa do Wolverhampton Wanderers, enquanto a primeira era a rua onde ficava localizada a Craeg Lea, a casa de Edward William Elgar, que para aí se mudara com a esposa (Alice) e a filha (Carice Irene) em janeiro de 1899. Craeg Lea era um anagrama para os nomes de C(arice), A(lice) e E(dward) Elgar. 

    Um remate inspirador
     
    Entre a multidão que lotava o Molineux durante o encontro entre o Wanderers e o Stoke City, naquele sábado de 5 de fevereiro de 1898, encontrava-se Edward Elgar, que assistia ao seu primeiro jogo de futebol. Os wolves venceram por 4x2 e na manhã seguinte, já em Malvern, Elgar reparou nas manchetes dos jornais que mencionavam a bela exibição de Billy Malpass, onde se podia ler que o avançado, que na realidade era um defesa, chutou a bola com força para a baliza: «He Banged the Leather for goal».

    O Estádio Molineux em Wolverhampton no começo do século XX.
    Billy Malpass não marcou nenhum dos quatro golos dos «lobos» nesse jogo, mas inspirou um dos maiores nome da música inglesa a pôr na pauta aquele que pode se considerado o primeiro cântico da história do futebol e ganhou assim um lugar na história do desporto.

    O compositor de Land of Hope and Glory (1) voltou para a sua casa em Alexandra Road e começou a compor uma pequena peça para piano. Essa peça seria o primeiro cântico dedicado a um jogo de futebol e de apoio a uma equipa, e no caso particular a um jogador, Billy Malpass, com Elgar a ser o autor da letra, que revelava o encanto que sentira nessa tarde em Molineux.
     
    Da obra perdeu-se o rasto durante muitos anos e não se sabe se terá sido tocada em público alguma vez durante o seu tempo de vida. Seria preciso esperar por setembro de 2010 para um coro, engalanado com cachecóis dos wolves, apresentar publicamente a obra, que fora descoberta por Percy Young nos anos cinquenta. 

    A celebração teve lugar na St. Peter´s Church em Woverhampton, onde um grupo de adeptos do clube e admiradores da obra do grande compositor assistiram à primeira apresentação pública de «He Banged The Leather for Goal». 

    Uma paixão tardia
     
    A escolha da igreja de St. Peter´s tinha um motivo. A razão prende-se com Dora Penny, a filha do reitor de St. Peter´s, amiga de Elgar, que incutira no compositor a paixão pelo «beautiful game». Dora era uma apaixonada por futebol, uma paixão rara para uma mulher em plena Inglaterra vitoriana.

    Como o reitor não gostava de futebol, Elgar pedalava todos os sábados de Malvern a Wolverhampton para acompanhar Miss Penny aos jogos dos Wanderers no Molineux, porque nesses tempos não convinha a uma senhora aparecer em público sem uma companhia masculina.

    Elgar e Mr. Phoebus, a sua famosa bicicleta.
    Em 1900 Elgar comprou uma Royal Sunbeam, uma bicicleta que batizou de Mr. Phoebus e que o acompanhou nas visitas a Dora e ao Molineux. Elgar e a sua bicicleta eram inseparáveis e tiveram direito a uma estátua em Hereford, cidade em que também viveu.

    De quinze em quinze dias, Elgar e Dora estavam entre os milhares que lotavam as bancadas em Molineux no incansável apoio ao Wolverhampton, que era então uma das mais fortes equipas de Inglaterra.

    As suas viagens velocipédicas semanais pela countryside das Midlands seriam a fonte da inspiração de uma das suas mais famosas obras, as Variações Enigma, em particular a delicada Dorabella, que como o nome denuncia, era dedicada à filha do reitor que então contava somente 17 anos. A relação entre os dois é uma questão que entusiasma os estudiosos de Elgar. 

    Talvez a solução para esta história esteja no Código Dorabella (2), um famosa carta cifrada que Elgar enviou a Dora e que esta nunca decifrou. O documento consiste de 87 caracteres em três linhas no que aparentam ser 24 símbolos distintos, todos eles uma variação de um, dois ou três semicírculos. 

    Se a paixão que Elgar devotava ao futebol era sincera ou apenas uma desculpa para encontros com a bela Dora é uma pergunta que ficou sem resposta. Se é bem provável que a bela Dora tenha sido o ponto de partida, a verdade é que o futebol acabou por conquistar o músico, precisamente no seu período mais profícuo, que culiminaria em 1904 quando foi armado Cavaleiro do Reino. 
     
    Anos mais tarde, quando já era um fã incondicional dos wolves, Elgar confessara que durante muito tempo quando se encontrava em Wolverhampton assistia da janela à habitual romaria dos adeptos rumo ao Molineux, curioso sobre o que arrastava tanta gente até um campo de futebol para ver uns cavalheiros chutarem uma bola, mas sem nunca ter coragem de se juntar a eles.

    Certo dia parou o que estava a fazer e resolveu descer à rua, acompanhando a multidão rumo ao estádio. A partir desse dia tornou-se adepto do Wolverhampton e de futebol, cativado pela comunhão entre as bancadas e os jogadores e o sentimento de pertença entre os adeptos e o clube.

    A paixão seria duradoura. Durante anos Elgar, já um músico consagrado e reconhecido até pela coroa, continuava a acompanhar os jogos do seu Wolverhampton, inclusive em pequenas deslocações aos campos de outros clubes das Midlands  que os wolves defrontavam. Para a posteridade ficou a canção, um interessante registo de uma era em que o futebol começava a tornar-se no desporto do povo. 
     
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    (1) É o nome por que é mais conhecida a Pomp and Circumstance March No. 1 in D major, peça que seria adaptada para a coração do Rei Eduardo VII.
    (2) Dorabella Cipher no original em inglês. 

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    Lotação31700
    Medidas100x64
    Inauguração1889