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    Hamburger SV

    Texto por João Pedro Silveira
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    O Hamburger Sport-Verein (HSV) é um dos históricos e mais emblemáticos clubes da Alemanha. Juntamente com o Bayern e o Borussia Dortmund, foi um dos três clubes alemães a conquistar a competição maior de clubes no continente europeu, a Taça dos Clubes Campeões Europeus, mais tarde conhecida por Liga dos Campeões, ou Champions. Além desse feito que muito orgulha os «calções vermelhos», o HSV é o único clube alemão a ter participado em todas as edições da Bundesliga desde 1963/64.

    Desde os primeiros pontapés na bola no começo do século passado, até à conquista da Europa, o Hamburgo, como também é conhecido em português, teve nos seus planteis jogadores inesquecíveis, destacando-se acima de todos eles Uwe Seeler, o «gordinho» que nos anos 50 e 60, encheu o Volksparkstadion com o encanto do seu futebol e os inúmeros golos que apontou.

    Orgulho hanseático

    Hamburgo é uma cidade portuária do norte da Alemanha, situada nas margens do Rio Elba, nas proximidades do Helgoländer Bucht, a baía onde o Elba encontra o Mar do Norte. Desde a idade média que se dedicou ao comércio, sendo um dos portos nevrálgicos da Liga Hanseática (1).

    Nos finais do Séc.XIX, Hamburgo era um dos centros comerciais mais importantes do país, recebendo a visita de muitos estrangeiros, entre eles britânicos, que traziam consigo as suas inovações, como os desportos e foi sem surpresa, uma das portas de entrada do futebol em terras teutónicas.

    Fundado em 1887, o Hamburger Sport Verein tornou-se rapidamente numa das grandes forças do futebol alemão, disputando com sucesso as ligas regionais e marcando presença na grande competição nacional.

    Os «calções vermelhos»(Rothosen), nome porque são conhecidos, nasceram a 29 de setembro de 1887, através da fusão de dois clubes da cidade do Elba:  Der Hohenfelder Sportclub e o Wandsbek-Marienthaler Sportclub, que se uniram para dar lugar ao Sportclub Germania zu Hamburg, que em 1919, terminada a Primeira Guerra Mundial, se transformou no Hamburger Sport-Verein em 1919, depois da fusão com o Hamburger FC e FC Falke Eppendorf.

    As cores escolhidas foram o vermelho e branco da cidade de Hamburgo e da Liga Hanseática, a que se juntaram o azul e o preto, cores utilizadas pelo Germania. 

    «Loucos» anos vinte

    Após alguns anos de amadurecimento, o primeiro título regional (conquistado em 1921), era o corolário natural da ascensão do clube ao topo do panorama futebolístico alemão.

    Durante 13 anos, o HSV conquistaria por dez vezes o campeonato regional, a Norddeutscher Fußball-Verband, prova que por três vezes «fugiria» para as mãos do Holstein Kiel. Com as conquistas na Liga Norte, o Hamburgo tornava-se presença na fase final do Campeonato Nacional, que ajudou a reforçar a aura ganhadora do clube.

    O primeiro titulo de ámbito nacional chegaria somente em 1923, quando se sagrou Deutscher Meister der Männer, ou Campeão da Alemanha se preferirem, vencendo o SC Union Oberschöneweide por 3x0, na final disputada em Berlim

    A final com o Nuremberga

    Um ano antes, o Hamburgo tivera a possibilidade de ter a Viktoria - a taça de campeão da Alemanha - nas mãos, mas desportivamente recusara a honra que não fora ganha em campo. Em Berlim, a 18 de junho, o Hamburgo defrontava o Nuremberga - que tentava conquistar o terceiro título consecutivo - quando o jogo é interrompido por falta de luz natural, já se tinham disputada três horas e dez minutos de jogo e o resultado estava empatado a duas bolas.

    A repetição, jogada a 6 de agosto, em Lípsia, também chegou ao prolongamento, depois do empate a um golo nos 90 minutos impedir a atribuição do título de campeão. 

    Os bávaros tinham perdido dois jogadores por lesão, a que se somavam dois expulsos e o árbitro considerou que o Nuremberga não podia continuar a disputar o encontro, atribuindo a vitória ao HSV. Os de Nuremberga protestaram a decisão, mas a Deutscher Fußball Bund (DFB) - a Federação alemã - considerou o Hamburgo campeão, contudo, convidou o clube do norte a não aceitar o troféu, em nome do desportivismo.

    Pela primeira vez desde o fim da Grande Guerra e até 1944/45, ano da derrota final da Alemanha nazi na Segunda Guerra Mundial, esta seria a única época que a mítica Viktoria alada não seria entregue ao vencedor. 

    1928 seria o ano da segunda conquista, conquistando o Campeonato após vitória por 5x2 sobre o Hertha de Berlim. Já em 1924, o Nuremberga vingara a final de 1922, batendo o HSV por 2x0.

    O HSV durante o Terceiro Reich

    Com a ascensão do nacional-socialismo, o desporto alemão sofreu consideráveis reformulações. Uma delas, foi a transformação dos campeonatos regionais num novo sistema, que dividia o país em dezasseis divisões, as Gauligas, ficando o HSV "alojado" na Gauliga Nordmark e mais tarde na Gauliga Hamburg, provas que venceu em 1937, 1938, 1939 e 1941, e 1945 respectivamente.

    A edição de 1940/41 da Gauliga Nordmak seria a mais memorável de todas, com o o Hamburgo a vencer os 21 primeiros jogos e a ver a Liga ser interrompida e só retomada na época seguinte, com uma vitória - a 22ª - sobre o Barmbecker SG, garantindo uma inédita conquista do título só com vitórias.

    Com a dissolução da Gauliga Nordmark, o HSV ficou "alocado" na Gauliga Hamburgo - disputado apenas por clubes da cidade e arredores - , que viu "fugir" primeiro para o Viktoria Hamburg e depois para o Luftwaffe SV, clube que como no nome indica, pertencia à Força Aérea Alemã. 

    Em 1945, o HSV conquistou a última edição da Gauliga, sagrando-se o último Gaumeisterschaft (2) do Terceiro Reich, porque ao contrário de outras Gauligas, esta era disputada numa área geográfica muito reduzida, que permitia que os clubes se deslocassem sem grandes problemas para os jogos, enquanto no resto da Alemanha, com o avanço aliado e os bombardeamentos constantes, as deslocações para outras cidades tornaram-se "quase" impossíveis. 

    Durante o advento do nacional-socialismo, muitos dos dirigentes do HSV eram orgulhosos nazis, com ligações reconhecidas as SA e SS. Os sócios judeus - que tinham sido fundamentais a financiar o clube, evitando a falência em 1935 - foram "expulsos" do clube, ao abrigo das famosas e deploráveis Leis de Nuremberga (3). 
     
    Além dos judeus, adversários políticos também foram expulsos do clube, assim como Emil Martens, um dos históricos presidentes do clube, acusado formalmente de homossexualidade, internado num campo de reeducação, onde foi alvo de castração. 
     
    Renascimento 

    Com o fim da Guerra, Hamburgo e a Alemanha levaram o seu tempo a regressar à normalidade. O HSV também demorou o seu tempo até voltar a ser um clube desportivo estável. Com a purga dos dirigentes nazis, com o regresso de velhos dirigentes e sócios, entretanto afastados, assim como de jogadores que tinham sido convocados para as forças armadas, o clube voltou a erguer-se dos escombros em que se encontrava no fim do conflito.

    O Hamburgo começou por disputar uma liga da cidade que venceu sem dificuldades, antes de ser incluído em 1949 na Oberliga Nord (Liga do Norte), um campeonato que não era mais do que a continuação do Campeonato da Zona de Ocupação Britânica instituído em 1948 (4). O HSV (campeão) e o vizinho St. Pauli (vice) foram os representantes da Zona de Ocupação Britânica, numa fase final que incluía dois representantes da Zona de Ocupação Francesa, mais dois da Zona de Ocupação Americana, além de um representante da Zona de Ocupação Soviética e o campeão de Berlim

    O representante da parte soviética, o SG Planitz, acabou por desistir não defrontando o Nuremberga que seria o campeão. O HSV caiu logo na primeira ronda às mãos do TuS Neuendorf, vice da zona francesa. 

    Durante os dezasseis anos que se realizou o campeonato da Oberliga Nord, o HSV venceu a prova em quinze ocasiões, o que transforma o domínio dos «calções vermelhos» na sua região, um feito sem par em qualquer outra parte da Alemanha. Curiosamente, no único ano que o HSV perdeu a Oberliga para o Hannover 96, os rivais chegaram à final do campeonato nacional, que venceram, ao baterem surpreendentemente o Kaiserslautern de Fritz Walter por 5x1 na final. 

    «Uwe! Uwe! Uwe!»

    1954, tinha sido precisamente o ano em que Uwe Seeler, então com 18 anos se tornara no novo herói do clube, chamado para a seleção ainda nesse ano, pouco depois da Alemanha se ter sagrado campeã do Mundo, batendo a Hungria na final, no famoso «Milagre de Berna».

    Após ter estado perto do titulo em 1957 e 1958, derrotado na final, respectivamente por Borussia Dortmund e Schalke 04, regressou por fim às conquistas, proclamando-se campeão alemão em 1960, depois de bater o Colónia na final, com dois golos de Uwe Seeler.

    Estes eram os anos mágicos do Hamburgo de Seeler, uma equipa repleta de jogadores de «primeira água» como Horst Schnoor, Jürgen Werner, Klaus Stürmer e Gert Dörfel, sem esquecer o inconfundível Uwe e também o seu irmão Dieter Seeler. Nas bancadas do Volksparkstadion os adeptos entusiasmavam-se sempre que viam o seu avançado receber a bola. O grito «Uwe! Uwe! Uwe!» tornou-se a mais provável sentença de morte dos adversários, como tão bem demonstram os 404 golos apontados por Seeler ao longo das 19 épocas que vestiu a camisola branca do HSV.

    Sonhos europeus

    Na edição seguinte à conquista do campeonato, o HSV participou pela primeira vez da Taça dos Clubes Campeões Europeus, era a época de 1960/61. Depois de eliminar o Burnley, campeão inglês, com uma vitória por 4x1 no Volksparkstadion, após ter perdido a primeira mão em Inglaterra por 3x1, o Hamburgo chegou até às meias-finais, onde encontrou o FC Barcelona, que eliminara o pentacampeão Real Madrid.

    Foi preciso recorrer a terceiro jogo para desempatar a eliminatória para saber quem ia encontrar o Benfica na final de Amesterdão. No Heysel, em Bruxelas, a equipa da Cidade Condal levou a melhor e venceu por 1x0, adiando o sonho europeu dos «calções vermelhos».

    Depois do título conquistado, o HSV não voltou a marcar presença na final, mas seria um dos dezasseis históricos participantes na primeira edição da Bundesliga em 1963/64. Contudo, seria preciso disputar treze épocas, para finalmente o HSV conquistar um lugar no pódio, com o terceiro lugar em 1974/75, atrás do campeão Gladbach e do Hertha Berlim. No ano seguinte, chegou ao vice-campeonato, novamente atrás do Gladbach de Jupp Heynckes e companhia.

    Se em 1961, a final na meia-final com o Barcelona, impedira a disputa da final em Amesterdão, em 1977, com Kuno Klötzer no banco, o HSV, comandado pelo «maestro» Felix Magath, venceu o Anderlecht por 2x0, precisamente na capital holandesa, como refazendo a injustiça histórica de que sentia ser alvo.

    Mas o acerto de contas com a História ainda não estava completo. Entretanto, Gunther Netzer, velha glória do Mönchengladbach e da Mannschaft, tinha se tornado manager do clube, iniciando uma nova era de investimento na equipa para a consumação de dois grandes objectivos: a conquista da Bundesliga e depois da Taça dos Campeões Europeus.

    Uma noite em Atenas

    Para conseguir tal desiderato, o HSV foi buscar Kevin Keegan ao Liverpool, onde o jovem inglês era já uma estrela consagrada. Apesar da primeira época sem muito sucesso (1977/78), Keegan - que era o jogador mais bem pago da Alemanha - liderou o clube em 1978/79 à conquista do título alemão, 19 anos depois do último sucesso. Os adeptos eufóricos adoravam a sua estrela, a quem chamavam o Mighty Mouse, em honra do famoso desenho animado.

    Não capaz de renovar o título de campeão da Bundesliga, deixou sair Keegan no fim da época de 1979/80, sem perder a competitividade e conquistar o bicampeonato de 1981/82 e 1982/83. Para tal, contou com a experiência de Franz Beckenbauer, capitão da Alemanha campeã do Mundo em 1974 e estrela maior do Bayern, que entretanto regressara ao país, depois de uma passagem pelo New York Cosmos.

    Apesar da importância da conquista do bicampeonato, o grande sucesso chegaria na segunda época, onde além de conquistar o campeonato, o HSV chegou à final da Taça dos Campeões.

    Em Atenas, Grécia, frente à toda-poderosa Juventus de Trapattoni, o treinador austríaco Ernst Happel, que já conquistara o título europeu com o Feyenoord, montou uma «armadilha» táctica que surpreendeu o italiano, e a Juventus ficou derrotada desde o minuto nove, quando Magath finalizou com um chapéu a Zoff, uma bela jogada dos alemães.

    Até ao fim o HSV fez correr a bola e aguentou o jogo ofensivo dos transalpinos, dando uma lição aos italianos, mestres da defensivos, da «arte de bem defender»!

    Fim de século e novo milénio

    A época seguinte seria a de todas as frustrações, com a perda da Taça Intercontinental e da Bundesliga (por diferença de golos para o Vfb Stuttgart). Às más campanhas de 1985 e 1986, sucedeu-se o inevitável adeus de Magath ao futebol. O HSV foi perdendo força e capacidade para ombrear com o Bayern e os outros rivais, mas ainda conquistou a Taça de 1987, o último troféu conquistado por Happel, que abandonou o clube no final da época. 

    No começo dos anos 90, o clube vivia uma crise económica sem paralelo, muito longe da saúde financeira que vivia nos tempos das contratações de Keegan e Beckenbauer. A venda de Thomas Doll para a Lazio de Roma por 16 milhões de Marcos (5), salvou o clube da ruína. 

    Felix Magath regressou em 1995 para orientar o clube do banco, um ano mais tarde foi a vez de Uwe Seeler regressar, para ser presidente, mas o HSV nunca mais recuperou a grandeza dos anos passados, vivendo muitos anos com a corda na garganta e falhando por diversas vezes a presença nas competições europeias.

    Depois de vários anos cheios de altos e baixos, em que tanto conseguiu ficar nos lugares e cimeiros e, consequentemente, ir às competições europeias (inclusive a Liga dos Campeões), e lutou para não ficar na zona de despromoção, o Hamburger acabou por descer de divisão em 2017/18 e desde aí tem estado na Bundesliga 2, em busca de regressar aos seus palcos prediletos.

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    (1) Liga Hanseática - (em alemão, die Hanse) foi uma aliança de cidades livres (dedicadas ao comércio) que estabeleceu e manteve um monopólio comercial sobre o comércio fluvial no norte da Europa e no comércio marítimo no Mar do Norte e no Báltico. Iniciou-se na Idade Média e durou até setecentos (entre os séculos XIII e XVII) data em que a maioria das cidades livres constituintes da Liga Hanseática foram incorporadas nas potências vizinhas, fazendo colapsar a associação. 
    (2) Gaumeisterschaft  [Campeão Regional].
    (3) Leis de Nuremberga - (do alemão Nürnberger Gesetze) Foram três textos adotados na Alemanha Nazi, sob iniciativa de Adolf Hitler, na sequência de uma sessão extraordinária realizada em Nuremberga - daí o nome - por ocasião do 7.º congresso anual do Partido Nacional Socialista Alemão dos Trabalhadores (Partido Nazi). Os três textos aprovados a 15 de setembro de 1935 pelo Reichsparteitag eram: a Reichsflaggengesetz (lei da bandeira do Reich); a Reichsbürgergesetz (lei da cidadania do Reich) e a Gesetz zum Schutze des deutschen Blutes und der deutschen Ehre (Lei da proteção do sangue e honra alemães), uma lei antissemita que retirava a maioria dos direitos constitucionais aos judeus residentes no Terceiro Reich.
    (4) Depois da derrota alemã no fim da Segunda Guerra Mundial e na sequência da Conferência de Potsdam, a Alemanha ficou dividida em quatro zonas de influência, pelos quatro aliados vencedores da guerra: Estados Unidos, Reino Unido, França e União Soviética. Os três primeiros acabariam por formar a República Federal da Alemanha (RFA), enquanto a zona ocupada pelos soviéticos daria lugar à República Democrática Alemã (RDA). As duas "Alemanhas" seriam reunificadas a 3 de outubro de 1990.
    (5) Ao cambio atual, cerca de oito milhões de euros.

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    2018-11-05 08h45m por xithombo
    2017/18 o Hamburger SV abandona, pela primeira vez, a Bundesliga, descendo de divisão. E, a partir de 2018/19, já não há totalistas na Bundesliga.
    Estádio
    (sem foto)
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    Inauguração