A 10 de junho de 1993, o Benfica ganhava a Taça de Portugal no Jamor ao Boavista, por 5x2, numa exibição de gala de Paulo Futre, o nome que terá estado na origem da ação do Sporting, uns dias depois. Nessa tarde na mata do Jamor, havia sinais evidentes de que nem tudo estava bem... Pacheco, que não foi a jogo, não participou nos festejos e deixou no ar uma poeira sustentada pelo facto de vários colegas seus terem atuado nas celebrações em jeito de despedida.
Nove dias depois, Pacheco rescindia por justa causa, alegando salários em atraso, para acordar com Sousa Cintra os contornos de um contrato chorudo (70 mil contos anuais) com um Sporting endinheirado.
Já o era em janeiro. Na altura, o peculiar presidente dos leões tinha aberto a porta a Paulo Futre a um regresso a Alvalade, o craque português respondia com agrado e a lembrar a «costela sportinguista» que tinha desde os tempos em que se tinha formado no clube, e tudo levava a crer que haveria um regresso.
Não aconteceu porque Sousa Cintra deixou o jogador pendurado no aeroporto, alegando que este lhe tinha pedido mais dinheiro à última da hora. Futre ficou tocado, não gostou e passou a responder afirmativamente a FC Porto e Benfica, que também o tentavam e a quem tinha dito inicialmente que não.
Acabou por rumar à Luz, depois de as águias terem acordado um adiantamento de 600 mil contos por parte da RTP, referentes aos jogos da época seguinte e à publicidade estática no Estádio da Luz.
Rebentou o escândalo
Ora, o final de junho de 1993 passava a escaldar. Nesse ano, passou na RTP1, a partir de outubro, a novela Verão Quente, que, não tendo qualquer relação com o futebol, serviu na perfeição para caracterizar o que tinha acontecido naquele período em Lisboa.
O FC Porto, apesar de se ter sagrado campeão nacional, dessa vez não fez qualquer movimento, até porque as contas do clube não eram brilhantes. Por outro lado, o Sporting estava bem financeiramente e não perdeu a oportunidade de tentar espremer ao máximo o grande rival.
«Os jogadores são tratados como cães. Eu também sou gente. Como é possível darem uma procuração a um empresário para tratar do meu futuro? Eu é que tinha de ser consultado em primeiro lugar para dizer aquilo que queria», disse o médio, no dia 27 de junho, ao jornal A Bola, numa altura em que fora descoberto tranquilamente no Algarve, já depois de muito se ter especulado - chegou-se a falar em «rapto».
Rumou ao Sporting, onde foi ganhar bem menos do que teria à espera em Itália, e foi apresentado ao lado de Pacheco. Dois nomes que deixaram em êxtase os sportinguistas, que nem eram dos mais bem pagos do Sporting (Balakov e Cadete estavam acima) e que nunca mais foram perdoados pelos benfiquistas.
João Pinto voltou atrás
O momento de ebulição na Luz ameaçou ser de debandada geral. Paulo Futre fez questão de que sairia «a bem ou a mal», mas foi a bem porque o Marselha, então campeão europeu, apresentou um valor generoso e levou-o. Rui Costa foi abordado pelo Sporting, mas fez logo questão de recusar e, na véspera do casamento, esteve na Luz a regularizar a sua situação.
Além disso, já tinha dado entrada na Luz no dia 25, por fax, o pedido de rescisão de João Vieira Pinto, que também já estava comprometido com o Sporting e que tinha recebido um cheque de 30 mil contos para assinar - esperava-o um contrato de 350 mil contos anuais.
Com o Benfica desesperado para tentar demover uma das suas jóias, o avançado seguiu para Espanha (Torremolinos, Málaga) pela mão do empresário José Veiga. Chegou mesmo a ser usada a expressão «fuga», de forma a que os encarnados não pudessem falar com o jogador.
Através de Valentim Loureiro, que conversou com a avó de João Vieira Pinto e a fez contactar o neto, o Benfica conseguiu contornar a estratégia e Jorge de Brito foi buscá-lo para o demover, o que foi conseguido com um contrato até 1997 e um salário a tocar nos 400 mil contos anuais.
Na Luz, foi aclamado como o «Menino de Ouro». Ao Sporting, teve de pagar 100 mil contos por rasgar o contrato. Sousa Cintra, claro, não gostou e comentou: «É um jogador imaturo para o Sporting».
Ferida deu em título
Do outro lado da Segunda Circular, o Sporting mostrava-se o maior candidato ao título nacional, com uma equipa fortíssima e com Bobby Robson como treinador. Só que Sousa Cintra entendeu despedir o inglês depois da eliminação europeia contra o Casino Salzburgo, mesmo estando em liderança partilhada no campeonato com Benfica e FC Porto (com quem já tinha perdido em casa).
Carlos Queiroz assumiu a equipa e não houve melhoria significativa, embora os leões tenham continuado na discussão do campeonato. Na jornada 30, o jogo do título: o Benfica tinha mais um ponto e ia a Alvalade, que encheu para ver a sua equipa chegar à liderança. Acabou 3x6, no épico jogo de João Vieira Pinto, e o Benfica acabaria campeão nessa temporada.