Esta semana foi notícia num dos jornais desportivos nacionais a história de Jefferson Café, hoje com 29 anos e que depois de ter “explodido” no Santos e ter jogado com a vedeta brasileira Neymar, abandonou a “carreira” para ser... padeiro. Em rigor, isto é uma não notícia. Já imaginaram quantos jovens jogaram com Neymar , Ronaldo e Messi e que abandonaram as carreiras para abraçarem outras carreiras que nada têm que ver com o futebol e/ou que nunca chegaram a profissionais?
Em 2013, nas II Jornadas de Comunicação e Desporto na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e após apresentar uma comunicação subordinada ao cruzamento das temáticas publicidade, desporto e o herói desportivo, fui questionado sobre o que fazia do futebol um desporto de massas, de fidelização e com grande implantação em Portugal. Respondi, resumidamente, que se tratava de um meio onde a emoção estava recorrentemente à frente da razão.
Felizmente ou infelizmente, a emoção é o combustível do desporto, que nos fideliza, que nos cega, que nos faz ir a um estádio em dias frios e de chuva para ver, muitas vezes, espetáculos de parca qualidade pagos a peso de ouro, que nos arranca do sofá e faz calçar as sapatilhas para irmos correr à noite ou de madrugada, que nos faz suar e sentir dores no nosso corpo, que nos faz testar os nossos limites para além de limites inimagináveis, que nos faz apostar no nosso clube quando a probabilidade de vitória é altamente reduzida.
É também a emoção, e a pouca razoabilidade, que nos faz acreditar que um dia podemos, ou um jovem pode, ser uma estrela do futebol mundial.
Como professor de educação física, a lecionar em turmas de cursos profissionais de desporto e atento ao fenómeno desportivo vejo, regularmente, jovens cheios de sonhos, irreais, para concretizar, iludidos na ideia de que são craques, sem o serem, e imbuídos do desígnio de serem estrelas do futebol nacional e mundial, que nunca serão. E esta é a realidade, bem longe da emoção e expectativas de uma vida de luxo e fama que os próprios, os pais, os treinadores, os dirigentes e os pares alimentam e/ou reforçam.
Já vi miúdos que foram treinar ou jogaram no Sporting, Benfica, Porto, Braga, Guimarães, Académica, Marítimo, Nacional, Setúbal e até nas seleções jovens nacionais, miúdos que eram craques no universo do clube ou da casa deles, mas que nunca saíram do anonimato que as paredes das expectativas impuseram.
Há uns tempos recebi uma imagem elucidativa do que se passa no futebol. Não sei se os dados são de todo exatos, mas parecem-me ilustrar a realidade dos nossos dias. A imagem, com texto em espanhol, indica:
“- Em cada mil crianças praticantes de futebol, apenas uma chegará a profissional;
- Em cada 10 mil crianças praticantes de futebol, apenas uma chegará a uma das 50 melhores ligas do futebol do mundial;
- Em cada 100 mil crianças praticantes de futebol, apenas uma chegará a um dos 50 melhores clubes do mundo.”
Por isso, refere a mesma imagem:
“- Primeiro pessoas, depois futebolistas;
- Primeiro formadores, depois treinadores;
- Primeiro pais, depois representantes.
- CADA COISA A SEU TEMPO.”
O desporto em geral, e o futebol em particular, é um campo com pouco espaço para fazer vingar sonhos, apesar de possíveis. Mas com um espaço enorme para se formarem pessoas e construir-se cidadãos saudáveis, ativos e responsáveis.