30 anos sem Dener: «Era melhor do que o Neymar e o Garrincha»

«30 anos? Já? O tempo passa mesmo rápido...»

Não deixa de ser irónico que a chamada que fizemos com Mário Jardel tenha começado desta forma. Afinal de contas, o tema da mesma viria a ser alguém que, por um lado, viveu rápido demais e que, por outro, fazia da velocidade de execução a sua maior arma dentro de campo.

Dener Augusto de Sousa.

Por outras palavras, a definição de 'fantasia' e de 'efemeridade' no mundo do futebol.

Apontado por muitos como um futuro melhor do mundo que nunca teve oportunidade de o ser, Dener despediu-se dos relvados e da vida há exatos 30 anos, no dia 19 de abril de 1994- então com 23 anos. Na sequência de um acidente de carro em que até seguia como passageiro, o médio-ofensivo foi asfixiado pelo cinto de segurança e acabou mesmo por falecer na Lagoa, bairro da zona sul do Rio de Janeiro no qual se deu a tragédia (a retirada do corpo do local só se deu mais de cinco horas depois do acidente).

A capacidade técnica de Dener vive ainda no memória de todos aqueles que acompanhavam o futebol brasileiro na década de 90, pelo que se tornou quase imperativo recordarmos o criativo no dia em que se assinalam três décadas desde o seu adeus.

«Quem o viu jogar não o esquece»

Apesar de a sua carreira estar fortemente ligada à Portuguesa, clube no qual fez a formação e se estreou como sénior, Dener representava o Vasco da Gama na altura em que se deu o acidente. Mário Jardel, figura icónica do futebol português, era então colega de equipa do 'Reizinho do Canindé' e não poupa em elogios.

«Juntava drible, força e habilidade de uma forma inacreditável. Era um jogador absolutamente excecional, fora da curva. Qualquer pessoa que acompanhasse o futebol e que tenha capacidade de ler o jogo como nós temos reconheceria isso, não há qualquer tipo de exagero no que se diz sobre ele. Quem o viu jogar não o esquece», começou por referir o antigo avançado. 

O carro de Dener após o acidente

Dener perdeu o pai com apenas 8 anos e, na adolescência, o sonho de se tornar profissional chegou a estar tremido, já que tinha de trabalhar para ajudar a mãe. Ainda assim, voltaria mais do que a tempo de se tornar ídolo na Portuguesa. Aliás, numa das renovações de contrato que fez com o clube, o médio-ofensivo recebeu um carro- Mitsubishi branco- com a matrícula DNR-0010, em alusão ao seu nome e ao número que envergava nas costas. Numa finta do destino ao nível das que fazia em campo, acabaria por ser nesse mesmo carro que Dener viria a falecer. Um momento que Jardel não esquece:

«As notícias más chegam muito mais depressa do que as boas. Lembro-me que a minha vizinha me acordou às 4h30 da manhã para me contar. O plantel ia treinar na Barra da Tijuca e eu só consegui dizer 'Não acredito, não acredito'.»

E a partir daqui, como lida um plantel com a morte de um dos seus? No caso do Vasco de 1994, os jogadores tentaram fazer desta fraqueza a sua maior força. «Na altura em que ele faleceu estávamos a entrar na fase final do campeonato carioca e os jogadores fizeram um pacto: ganhar o título para o dedicarmos ao Dener. De resto, no jogo decisivo, contra o Fluminense, eu entrei para o lugar que seria dele: fiz dois golos e dediquei-lhe, foi a minha forma de homenagem», vincou Super Mário.

«Hoje seria vendido por 200 ou 300 milhões de euros»

O facto de Dener ter falecido tão cedo, isto numa altura em que até já havia um acordo para rumar à Europa e representar o Stuttgart, deixa muitas dúvidas no ar. Ainda assim, Jardel tem a certeza do nível a que o seu colega iria chegar caso não tivesse tido esta fatalidade.

«Teria sido o melhor do mundo, sem dúvida. Se fosse hoje em dia, não durava três meses num clube, seria logo vendido por 200 ou 300 milhões de euros. O Neymar não chega nem perto do Dener, ele era do nível do Garrincha para cima. Era melhor do que o Neymar e o Garrincha, que são reconhecidos como dois dos mais valores de sempre do futebol brasileiro. Dá para ter noção do valor dele...», continuou Jardel. 

Dener é ídolo na Portuguesa @UOL

E mesmo que ainda não dê para ter essa noção, as palavras de Pepe, antigo treinador de Dener na Portuguesa, em entrevista à Folha de São Paulo (10994), ajudam a dissipar as dúvidas que existam: «Ele merecia ter tido mais oportunidades na seleção brasileira [Dener foi internacional em apenas duas ocasiões]. A nível de talento, é o jogador que mais se aproximou do Pelé», considerou o também ex-técnico do Boavista.

Ainda que já tenham passado mais anos desde a morte de Dener do que aqueles que o criativo viveu, a verdade é que o legado do ídolo da Portuguesa mantém-se vivo no imaginário de todos aqueles que gostam de futebol. Sendo que há muitos 'e se' que não tiveram resposta, é impossível não considerarmos que há beleza na efemeridade. E no caso de Dener, até não nos importamos de ter como verdadeira uma frase da sua autoria:

«Um drible é mais bonito do que um golo»